Visão No. 66

14 0 0
                                    

Olho e sorvo mais um gole...
O mesmo gosto amargo e fresco…
O mesmo gosto da vida…

Queria ser um Khayyam que tece versos na embriaguês nobre do vinho, 
Mas teço versos amargos 
Sem a doçura da uva,
Sem o êxtase luxuriante de Dioniso, 
Um Adão indigente sem folha de parreira
Nessa melancolia de ter sido expulso de Eden
E desconhecer qualquer hedonismo… 

Sorvo o amargo
Dessa hora triste, 
Desse destino enjeitado,  
Sorvo essa mediana alegria 
Que compartimos com parcimônia pecadora…

Mas sorvo-o com a nitidez 
De quem olha e vê um céu de ouro e sangue e luto… 
Roxo como o vinho que não bebi,
Dourado como cerveja que bebo…

Fresca 
Como a vida que é convencional…
Fresca 
Como o que se repete e vem de novo
E de novo
Das linhas de produção do hodierno…
Das prateleiras e do comércio dos homens,
Do escambo da moeda e da mercadoria…
E ela me vem 
Fresca e fria… 

Aragem tomada do ártico,
Engarrafada
E que me regela nesta tarde mediana da vida mediana que se nos dá a nós…
Possível,
Provável,
Aceitável…

Está nela minha ascese,
Meu canto e
Minha iluminação… 

VISÕES AO CREPÚSCULOOnde histórias criam vida. Descubra agora