capítulo 19

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  Não comemorei meu aniversário no dia seguinte. Já que nem enterrar minha mãe Asnum deixou possível, lançamos seus O.Ss no rio Amazonas, qual os elfos do bosque Imizon adoravam.

  Era uma tarde ensolarada e silenciosa. As águas do rio estavam calmas e o vento batia fraco. A maioria das 9 espécies estavam presentes e todas prestavam respeito e total agradecimento aos anos que ela permaneceu na liderança. Seus O.Ss me foram entregues. Eu os lancei nas águas, que foram levando-os para longe devagar. Márlety foi quem desmaterializou os O.Ss ali. Cheguei a me assustar quando automaticamente os elfos cantaram, como um coral encerra um show. A emoção tomou não só a mim, mas a maioria dos que cantavam. Por fim, cada um despejou flores nas mesmas águas. 

  Posso afirmar que eu tive uma mãe que me amava, nas mais singelas palavras e atitudes por amor. Ela mataria a si por mim, porque eu herdaria o lugar dela se a visse cometer suicídio. No meio daquele caos, sua morte teria que ser sozinha para que tudo desse certo; assim, a busca por vingança e a perseguição acabaria, e Asnum sofreria por todas as pessoas que matou. Ah, se eu tivesse confiado nela... Por fim, conclui que ela não queria poder, e sim que queria paz, queria família, queria… amor.

  No fim das contas, deixei de culpar os elfos, pois a real culpa era minha. Minhas decisões, meus pensamentos errados, meus poderes, meu medo… tudo eu. Eu agi conforme o que Asnum queria; foi tudo um grande plano, e não passou disso... Ali encerraria toda essa aventura.

  Os pertences restantes dela me foram entregues também. Mas quem disse que eu tinha coragem de ver as coisas que ela guardava? Deixei tudo em minha tenda no bosque Imizon, inclusive Skriptil recém resgatado, e selei com feitiços e encantos não muito difíceis de quebrar.

  — Tem certeza que lhe fará bem ficar longe?

  — Não sei, Lipe. Não sei.

  — É bom dar um tempo, mas não se isolar. — Else dizia, enquanto eu saía do bosque — Logo as férias chegarão, o casarão se encherá de pequeninos correndo e gritando por todos os lados do acampamento. Acho que dou conta de te cuidar também.

  O tempo longe do castigo e cada vez mais perto das crianças tornou Else mais responsável, mais doce e cuidadosa que antes; assim como Máties também ficou mais compreensivo e cuidadoso. Filipe, Paulo e Pedro ajudaram nas reformas do novo acampamento de Else e Máties, mas ainda tentando se entender.

  No momento, o que realmente importava e preocupava os elfos era a possibilidade de Asnum ser aceito pela Mãe Natureza e ser presenteado por ela quando tomasse posse do "cargo". Essa decisão sairia depois de um ou dois meses. Dependendo de qual fosse o presente que a divindade daria, tudo poderia mudar.

  Com todos esses pensamentos eu ficava até confusa. Passei a sentir um vazio no peito, uma falta de ar estranha e uma tremedeira repentina, o que me tirava a fome e o sono. O barulho dos passos pela casa e até as conversas me deixavam pior. Cheguei a um ponto que queria fazer exatamente o que Else disse: me isolar.

  Meus irmãos prepararam meu quarto, colocaram móveis pretos sabendo ser minha cor preferida. A primeira coisa que fiz foi me jogar na cama.

  — Vai dormir? O jantar já está pronto.

  — Oi, Pedro. Vou descansar um pouquinho só — resmunguei, com a cara no travesseiro.

  — Ei, eu sei que é difícil. Tô perdendo ela pela segunda vez… — e se sentou nos pés da cama — Mesmo não sendo mais próximos como você é com Felipe, pode me contar tudo, tá?

  — Uhun. Claro, claro. Feche a porta quando sair.

  Tranquei a porta após ele sair, e depois disso só me lembro de estar deitada da mesma forma na cama olhando a lua e o sol trocarem de lugar cada vez mais rápido. Escutava Filipe batendo à porta e falar alguma coisa que eu não prestava atenção; e isso logo virou rotina. Cartas se amontoaram embaixo da porta, mas não havia mais nem curiosidade em mim. Cada vez mais crianças gritavam pelos corredores, e os animais para a nova fazenda chegavam. A cada dia que passava eu me sentia mais fraca; dormir já não me fazia mais bem. Eu não sentia falta das conversas, pois as conversas comigo mesma me satisfazia, apesar de sentir falta da companhia e dos risos; ao mesmo tempo que ficava triste por não conseguir forças para ter isso de volta. O que me aliviava era saber que sem voltar a confiar, ninguém mentiria para mim. Confesso que foi definitivamente o pior momento da minha vida.

A Sétima Poção (Pausado)Onde histórias criam vida. Descubra agora