Lembro-me bem deste dia, um ensolarado domingo, dia 8 de maio de 1994. Era o Dia das Mães. Fazia uma semana que Ayrton Senna havia nos deixado e duas semanas que forjei forte amizade com Maria Clara.
Pela primeira vez desde que parti para meu "exílio" na Borda do Campo, liguei para minha mãe. Foi bem cedo que usei um orelhão na Cata Preta. Ao atender e ouvir minha voz, Eliza começou a chorar alto, o que cortou meu coração.
Percebi o quanto fazia falta para minha mãe e também o quanto ela deixava um vazio em meu peito. Foi difícil falar, mas precisei.
— Feliz Dia das Mães!
— Guilherme...
Eliza não conseguia falar, somente chorar. Eu, todavia, precisava ser rápido naquele orelhão azul da CTBC.
— Mãe, não chore, estou bem! Te amo muito, viu?! Estou trabalhando muito!
Com a voz entrecortada, Eliza questionou-me.
— Meu amor, quando você volta? Não suporto mais viver aqui sem você. Todos nós...
O "todos nós" incluía aqueles que em meu coração faziam falta? Pensei imediatamente em Manoel, para começar, e a indaguei.
— Mãe, como está o pai?
— Ele está bem e com saudades de você...
Emocionei-me, todavia, para não preocupá-la, engoli o choro silenciosamente. Lembrei do que havia com meu pai e precisava ter certeza que não era apenas um modo de me atrair de volta para casa.
— Mãe, não sei quando volto. Preciso juntar mais dinheiro.
— Onde você está?
— No interior de São Paulo...
Menti, porque não queria ver minha mãe subir a serra atrás de mim e assim trazer com ela o que deixei para trás. De certa forma, isso incluía meu pai, porque no tempo em que fiquei em Ribeirão Pires, ainda nutria um sentimento ruim por ele.
Ele poderia ter me aceitado de volta e me apoiado, mesmo que eu não merecesse, porém, foi o primeiro a virar as costas. Não acreditei totalmente em minha mãe, mas não a questionei sobre isso, levando a desconfiança. Era o dia dela e apenas isso importava.
— Em que cidade meu filho?
— Mãe, não posso explicar agora, porque as fichas estão acabando. Quero que saiba que penso todo dia na senhora.
— Penso em você Guilherme, todo o tempo...
Não havia como argumentar com Eliza. Para cada elogio sincero, minha mãe me derrubava com seu amor maior. Quando a última ficha caiu, me apressei.
— Mãe, logo ligarei novamente, viu?
— Pode ligar a qualquer hora, meu filho. Te amo.
— Também mãe, muito! Beijos!
— Beijos! Fica com Deus! Te a...
Caiu a ligação. O toque contínuo no fone foi a última coisa que ouvi naquela difícil ligação em Ribeirão Pires. Mal sabia que meu coração ainda haveria de suportar uma carga igualmente alta naquele dia.
Andei pela calçada em lágrimas, ignorando alguns que me olhavam curiosos. Contudo, aquele era um dia que todos sabiam ser também de dor, provocada pela distância, pela ausência, pela saudade...
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Ao chegar à churrascaria, sentei-me no tronco de madeira junto da mata e busquei um pouco daquele ar puro de montanha. Precisava recarregar a bateria para um dia intenso de trabalho. Dia das Mães é garantia de restaurante cheio, tanto em 1994 quanto agora.
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Desert Rose
Ficção AdolescenteGuilherme tem uma relação complicada com o pai e seu pensamento mais profundo é largar tudo e partir... Contudo, sua vida dará uma guinada enorme ao se deparar com os belos olhos azuis de Diana, alguém que ele acredita ser "inalcançável". Ela, uma g...