Após muitos minutos ali, Diana, curiosa e com ar de felicidade estampada em seu rosto rosado, quis conhecer a casa. Martha, acompanhando a irmã em sentimento, também insistiu no pedido e, após apresentações devido a minha tia, mostrei minha velha casa.
Tia Débora, uma bela negra com seus 30 e poucos anos — ela nunca dizia a idade exata, nesse caso — prendia sempre seu cabelo em um coque no alto da cabeça. Tendo um corpo curvilíneo, muita inteligência e língua afiada, encantou um japonês, quer dizer, um nissei. Casada com Paulo Ikari, que na época tinha cerca de 40 anos, morava em Extrema, no sul de Minas Gerais.
Apesar da preocupação com o irmão, Débora deu total atenção àquela jovem.
— Nossa! Ainda não consigo tirar os olhos de você! Gente! Esse olho é natural mesmo? Não é lente não? — questionou Débora à Diana.
— É natural sim, nunca usei lente — respondeu Diana, que sorriu a seguir.
Observando a irmã animada, Martha vez ou outra mirava-me.
— Caramba! São tão lindos!
Enquanto observava a cena, meu pensamento me levou até a moça dos cabelos dourados. Lembrei de sua postura anterior e decidi me aproximar dela, brincando.
— Oh! Tia! Já viu os olhos de Martha? Eles também não são lindos?
Frisando o olhar diante do que falei, Martha me reprovou visualmente, mas Diana, entendendo de outra forma, reforçou a questão.
— Olhe tia! Os dela são totalmente diferentes dos meus. Adoro a cor deles.
— Tem razão! Moça, me desculpe, mas assim você mata uns por aí, hein?
— Tia! — falei.
— Ué?! Meu filho, só não vê quem é cego. Ah! Você me conhece, não escondo o que penso.
Sim, Débora era bem direta. Aliás, ainda é e me dá uns bons puxões de orelha, mesmo em minha idade...
Não encabulada, como imaginei, Martha mudou sua atenção da mulher para mim.
— Não sabia disso Gui...
Para minha tia, agradeceu.
— Obrigada. A cor de meus olhos veio de meu pai e o azul de Diana, de minha mãe.
— Bela mistura! — falou Débora.
Pensei naquele momento que as origens deles queriam me ver bem distantes de suas descendentes... De fato, estava certo sobre isso. Feliz, Diana ainda brincou com a irmã, fazendo-a rir. Todavia, notei haver algo mais.
Minha tia fez o almoço e comemos ali. Nenhuma das duas falou em ter que partir e isso, embora me trouxesse alegria, também insinuava algo.
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No início daquela tarde de maio de 1994, uma parte de minha havia encontrado o conforto que há tanto esperava. A chegada súbita de Diana com a irmã, trazendo-me uma posição dura e cruel, foi como um tiro, porém, este fora no ombro. Não me levou para as profundezas da morte.
Falando nelas, lembrei ao mirar Martha, que estive na linha tênue que separa o mundo exterior do mar profundo. Fora ela, a loira, que me ajudara a sair da água e aquecera meu corpo nu, na mesma cama em que deflorei a irmã...
Dois momentos surreais de minha vida que recordei ao reparar nas irmãs diante de mim. Como pode a vida ser assim um contraste enorme de momentos tão díspares? Em um momento, gozei. Noutro, agonizei.
Martha, apesar do perdão, ainda era um mistério. O que aqueles olhos verdes, bem escuros, guardavam exatamente? Havia muitos questionamentos sobre suas atitudes, afinal, ela sempre estivera ao meu lado, ou melhor, conosco.
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Desert Rose
Ficção AdolescenteGuilherme tem uma relação complicada com o pai e seu pensamento mais profundo é largar tudo e partir... Contudo, sua vida dará uma guinada enorme ao se deparar com os belos olhos azuis de Diana, alguém que ele acredita ser "inalcançável". Ela, uma g...