VII. 2 Crônicas 15:7 †

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"Mas, sejam fortes e não desanimem, pois o trabalho de vocês será recompensado"

O garoto corria em desespero, usando toda força que tinha nas pernas para fugir de um inimigo inexistente. Como se pudesse fugir de si mesmo e de seu fardo. Precisava chegar no vilarejo onde sua irmã costumava morar até desaparecer, para que pudesse descobrir o que houve com ela antes que seguisse viagem para o norte, em busca de um antro para esconder-se.

Seria somente mais uma entre tantas paradas.

Quando uma pontada aguda tomou-lhe o peito, permaneceu a correr sem descanso, apesar da aflição asfixiante. Avistava uma grande floresta logo à frente e não podia parar agora.

Contudo, fora como se um golpe violento lhe acertasse, causando sua queda precipitada no momento em que estava prestes a adentrar a floresta.

Um grito agonizante e doloroso rasgou sua garganta, sentindo a queimação interior incendiar toda sua estrutura e a dor excruciante de seus ossos quebrando-se em um deslocar proposital. A respiração ofegante procurava pelo ar rarefeito que esvaía-se de suas vias aéreas, à medida que a imagem do ambiente ao redor tornava-se embaçada e as vistas turvas, comprometendo sua visão.

Apoiou-se sobre as mãos no chão, suando abundantemente ao passo que sentia as gengivas coçarem e o corpo retorcer-se em meio ao ardor latente, num misto de gemidos, grunhidos e brados sofridos.

Com o pouco de força que ainda restava, olhou para o céu atro, observando algumas nuvens encobrirem as estrelas brilhantes e a forma esférica da lua majestosa que tanto odiava.

— Deus, por favor! — postulou em vão; as lágrimas preenchendo o canto dos olhos por saber que não seria ouvido. — Eu não aguento mais!

E aquela foi a última súplica antes de ser entregue à sua chaga, embrenhando-se na floresta e desaparecendo pelo breu intimidante das árvores.

Um céu azul repleto de nuvens branquinhas e sol brilhante era a combinação preferida de muitos. Bom clima, boas colheitas, pessoas dispersas e consideravelmente alegres, comerciantes lucrando às custas dos menos afortunados... Tudo nos conformes, agradável e normal às vistas alheias.

Exceto para ele, um fugitivo.

Sua vida mudou, literalmente, do dia para a noite, desde o momento em que acordou durante a madrugada, quase definhando pela dor lancinante no peito. Sentir a morte diante de seus olhos nunca foi tão pavoroso. E após o ocorrido, não tinha coragem para contemplar seu próprio reflexo, que agora não parecia mais ser o que era.

Tentou agir naturalmente caminhando entre as pessoas, embora seu corpo inteiro tremesse pelo medo de ser descoberto. A capa que vestia cobria-lhe a cabeça, escondendo os fios de coloração excêntrica, bem como escondia a marca no peito que passou a fazer parte de seu cotidiano.

A fila para embarcar no navio estava maior do que gostaria, e a ansiedade invadiu-lhe fortemente a cada passo adiante. Seus lábios tremeram junto ao corpo e o ar faltou quando alguém esbarrou em si, tão forte que sentiu o ombro doer e cambaleou para o lado.

— Perdoe-me, senhor! — pediu um homem, que de cara identificou ser um mercador. — Você...

Olhou para ele, vendo-o mirar-lhe surpreso, para logo após assimilar a feição colérica em sua direção. Só então percebeu que a capa caiu sobre seus ombros e estava exposto aos olhos de todos.

— Matem esse bastardo! — gritou enfurecido.

Não pensou duas vezes antes de sair correndo, desesperado, sem saber para onde ir. Só o que importava era sobreviver, embora já não houvesse garantia de nada, pois várias pessoas que estavam por perto abandonaram tudo apenas para lhe perseguir, e por consequência, matar-lhe.

— Peguem esse maldito!

Ouvia os brados raivosos em suas costas, enquanto movia-se com toda velocidade possível entre as pequenas barracas dos comerciantes, procurando não esbarrar em nada ou ninguém, o que não foi evitável, já que acabou por, basicamente, atropelar um homem de meia-idade e derrubar alguns objetos pertencentes a ele.

— Desculpe, senhor! — Não havia tempo para ajudá-lo, e sentiu-se mal por isso. Porém, era ele ou sua vida.

Cruzando boa distância do porto, enfiou-se entre todas as vielas das ruas que encontrou pelo caminho, conseguindo assim despistar os cidadãos furiosos. Quando achou uma viela segura e estreita, livre de qualquer sinal de vida, desabou exausto sobre o chão, encostando-se na parede para recuperar o ar escasso que fazia seu peito arder. Fechou os olhos, passando a mão pelo rosto suado, pensando no que faria.

— Olá.

Pulou de susto com a voz bem-sonante que soou ao seu lado. Preparou-se para levantar e correr novamente, mas foi impedido antes que tentasse.

— Não precisa fugir de mim. Eu não vou matar você.

Analisou desconfiado a figura mais baixa e loira. Ele possuía uma beleza jamais vista por si, como se não fosse real, e sim uma miragem. Cogitou estar delirando.

— Você não está imaginando nada, eu sou real. — Sorriu esbanjando simpatia, mas seu semblante pareceu abrigar insegurança por um milésimo de segundo. — Embora eu não devesse estar aqui... — sussurrou.

— Quem é você?

— Isso não é relevante agora. O que importa é que posso ajudá-lo.

— Se pode me ajudar, então sabe o que se passa comigo. Diga-me, por favor, o que está acontecendo? — Seus olhos imploravam por uma resposta, e a voz saiu entrecortada e embargada pelo temor do pesadelo que estava vivendo. — Eu não sei o que há de errado comigo, todos que me veem tentam me matar e não faço ideia do motivo. Por favor, eu... Eu estou com medo.

— Acalme-se, eu conheço um lugar onde há pessoas que podem lhe resgatar e acolher-lhe.

— E que lugar é esse? Eu farei de tudo para chegar até lá!

Ele revelou o nome do lugar e apontou para um homem próximo a um barco ao longe: — Vá até aquele homem e peça que ele o leve para o seu novo destino.

— Mesmo que eu me esconda, ele pode perceber a cor do meu cabelo e...

— Adiantei-me e resolvi isso para você. Não tenha medo, ele não irá machucá-lo. Porém, tome cuidado quando chegar, não está livre desta maldição. Ainda não.

— O que? Que maldição? Você pode explicar isso melhor?

— Não há mais tempo a perder, e já desperdiçamos muito aqui. Vá logo!

Aquilo poderia ser uma armadilha, contudo, não havia mais nada a perder, e se estava ameaçado de morte por cada pessoa que encontrava em qualquer lugar que fosse, então deveria arriscar. Apenas cobriu-se novamente e seguiu para o lugar em que estava o senhor próximo ao barco.

— Para onde, garoto? — perguntou o velho, sem dar importância para quem era.

— Leve-me até Éosis Bay.

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Esse capítulo ficou bem pequeno porque, na verdade, é nesse que se passa a cena do prólogo, mas eu retirei pra não ficar muito repetitivo.

Temos novos personagens que serão muito importantes futuramente, façam suas apostas e teorias.

𝐇𝐀𝐃𝐈𝐒 - MinsungOnde histórias criam vida. Descubra agora