aos jardins mortos na mente minha

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entrei num jardim há muito tempo morto
estava dentro de mim
as flores murcharam e desapareceram
não restava sequer um pobre carmim

estava eu falando com as flores
que morreram por falta de chuva
não era de se admirar que faltasse água
toda ela escorrera através dos olhos
antes mesmo que florescessem novos botões

margaridas caídas me contaram
que suas pétalas eram sua autoestima
e que eu havia as destruído
como fazia com tudo que tocava
a cada grito omitido

às rosas
só lhes restaram os espinhos
elas lamentavam, entretanto
que o poeta estivesse sozinho
as rosas, doces,
lhe indicaram o seu caminho

copos-de-leite tristonhos
achavam aquilo injusto
que vivessem na minha mente
e eu o fizesse enfadonho
viver (morto) sem custo

os girassóis, porém,
nunca haviam murchado
eles me contaram
que se manteram de pé
das outras flores afastados

pensaram "um dia virá o sol e a chuva,
os dias bons virão"
eu, com os olhos embaçados,
revelei aos meus amores
que talvez demore demais
para que a chuva volte para dentro de mim

eles me disseram
"aqui há muito tempo só se ouvem trovões de tempestade
mas nem mesmo uma gota de chuva,
sentimos que o sol se esqueceu de nós"

eu, sorrindo tristemente,
respondi que o sol perdera o brilho
e os trovões ganharam volume
e a chuva foi para outro lugar

que eles morreriam
as custas
do
meu
pesar

os girassóis, mesmo tristes,
disseram que entendiam o sol
que até mesmo eles abandonariam aquele jardim
jardim sem cercas,
qualquer bicho entrava e saía
quando bem queria

mas que eles não abandonariam o jardim
em compaixão a mim
por que sabiam que eram parte de mim
então eu disse sim
sim, eles poderiam ficar,
e eu prometi fazer chover
me prometi parar de chorar

mas se eu quebrar a promessa aos girassóis
como tudo ficará?
terei traído minha própria mente?
todo
e
qualquer
girassol
morrerá?

cartaOnde histórias criam vida. Descubra agora