Encarei o embrulho posicionado bem no centro do sofá, intocado desde que recebi sua inesperada chegada. Eu estava dividida, havia uma parte de mim que ansiava para descobrir o que era. Entretanto, a outra parte tinha certo ressentimento do bilionário, repudiando todos os aspectos de sua existência. Respirei fundo e finalmente anunciei rendição.
Cruzei a curta distância que separava os interessados e deslizei a mão pelo plástico de proteção, empurrei o zíper e observei o lindo e refinado tecido aparecer. O vestido preto tinha o design romântico e delicado, contrastava de maneira impressionante com a cerimônia que ele escolheu o tema. Puxei a peça elegante de maneira cuidadosa, havia uma máscara muito ornamentada para completar.
- É loucura - Murmurei incrédula, Bruce é completamente insano e maluco.
Eu não pude reclamar ou pensar demais em sua atitude generosa. O relógio marcava a hora e não retrocederia por nada no mundo. O frio no estômago era perturbador, mas ignorei e continuei a arrumação. O banho reassendeu a sensação de frescor e limpeza, restava uma dúzia de outros problemas. Sequei o cabelo, o cheiro de algodão doce era forte para aqueles que se aproximassem demais.
Optei pelo básico e alisei as madeixas, a escolha era simples e segura. Lentamente, fui separando os fios e deslizando a prancha, seu brilho reluzente trouxe o aspecto saudável. Eu sorri após terminar a atividade trabalhosa que consumiu longos minutos. O banheiro parecia um cenário apocalíptico, mas ainda sim, tinha a maquiagem para iniciar. Abri as gavetas que rangeram devido a força aplicada.
- Algo natural e discreto - Murmurei com o coração batendo acelerado.
Organizei os produtos em cima da única bancada e busquei inspiração. O hidratante se dissolveu na pele e deixou um aspecto jovial e natural. A base cobriu imperfeições e tornou o rosto uniforme, sem tonalidades variadas. Era hora de disfarçar as olheiras e o corretivo teve êxito em seu propósito. Usei cores neutras, as cores terrosas eram perfeitas para manter um visual discreto e mais elegante.
O contorno harmonizou com pontos que foram iluminados com maquiagem. A cor das bochechas era atrativa, mas sem exageros ou excessos. Olhei no espelho e busquei erros de execução ou defeitos comuns, mas não achei nada que pudesse gerar falatório e risadas no restante dos convidados. Retornei para a sala e coloquei o vestido ali mesmo, sem receio ou vergonha, afinal estava sozinha e fechei todas as cortinas da casa por garantia.
A peça deslumbrante destacou curvas e pontos chave em meu corpo, porém sem toda vulgaridade que imaginei. O vestido tinha uma infinidade de detalhes prateados, o detalhe de maior grandiosidade era a fenda lateral, isso e as mangas bufantes na área dos braços. Ouvi batidas na porta e caminhei até ela, tímida em relação a ser vista assim pela primeira vez. Eu sorri ao ver Alfred parado ali, parecendo muito elegante e bem vestido em seu terno.
- Olá, Sr. Alfred - Comprimentei vendo os olhos experientes me olharem por inteiro.
- Boa noite, senhorita - Respondeu e não conteve o sorriso acolhedor - Se permite, está belíssima, querida - Elogiou e senti alívio.
- Jura? Não está exagerado? - Indaguei e indiquei para que o homem entrasse.
- De maneira alguma, senhorita - Sorriu e retribuí de maneira desajeitada.
- Então... o que veio fazer aqui? Eu quero que saiba que é bem-vindo, apenas estranhei - Comentei enquanto calçava os sapatos, o seu modelo combinaria com o look.
- Mestre Wayne ordenou que a senhorita fosse levada em segurança - Respondeu e me levantei para terminar a arrumação.
- Ele ordenou, é? - Murmurei baixinho, os últimos dias foram tão complicados.
Entrei no quarto e puxei o quadro que se encontrava próximo do banheiro. Eu guardava as jóias, dinheiro e livros que escrevi, mas que ainda não foram lançados. O cofre secreto foi sendo preenchido aos poucos, conforme meu trabalho começava a receber destaque. Havia brincos, pulseiras e outras jóias que recebi de admiradores excêntricos. Escolhi um par feito de ouro branco, o conjunto de colar tinha uma nuance feminina com os brincos.
- Estou pronta - Comemorei borrifando o perfume no pescoço e nos pulsos.
- Magnífica, madame - Elogiou Alfred em nítida apreciação, eu agradeci baixinho.
Saímos do apartamento em silêncio, era uma noite agradável. O clima de Gotham tinha se transformador ao longo da semana. Sorri e lembrei que a Sra. Bennett estava ensaiando a abertura do espetáculo, a música parecia uma declaração de amor profunda. Alfred parou de andar e ficou inerte, perdido em pensamentos e sensações. Eu sabia que não deveria bancar o cúpido, mas ambos mereciam a chance que a vida estava dando para eles.
- Tem espaço para mais uma? - Indaguei atraindo sua atenção para mim.
- Claro, madame - Respondeu e bati com empolgação na porta da doce senhora.
A cantoria cessou e o som lento de seus passos foi ouvido. A porta rangeu e a imagem da mulher surgiu em nosso campo de visão, a sua beleza acentuada por brilho e maquiagem perfeitamente delineada. O vestido prata tinha uma aparência clássica, semelhante ao usado na década de 50. Helena Bennett estava linda e demonstrava satisfação. Percebi que Alfred sequer piscava, encantado demais para sentir o olhar de nós duas sobre ele.
- Eloise, você está maravilhosa - Afirmou e sorri acanhada - Eu sabia que seria a mulher mais bonita do baile - Provocou.
- Obrigada, mas a senhora também está muito bonita. Não concorda, Alfred? - Sorri e o mordomo pigarreou, constrangido.
- Sim, belíssima - Comentou e contive os gritos estridentes no fundo da garganta.
- O que acha de ir com a gente? - Vi suas mãos tremerem devido ao nervosismo.
- Eu adoraria, Isie - Murmurou e retornou para o interior do seu apartamento.
Permanecemos no corredor aguardando a sua volta, alguns moradores me olharam e o julgamento ficou visível em seus rostos. Bufei e tentei ignorar, mas era complicado manter a postura de indiferença. A Sra. Bennett saiu e a máscara espalhafatosa se destacou pelo tom vermelho e branco. Me adiantei e caminhei na frente do casal, permitindo que ao menos eles tivessem espaço para conversar.
A escadaria era longa e os saltos eram a adversidade agravante. Cheguei ao térreo e as estrelas brilhavam intensamente no céu, cada minúsculo detalhe contribuiu para tornar essa noite mágica e espetacular. A limosine parada próxima da calçada desencadeou risadas que ecoaram pela rua. O motorista desceu e pediu que entrasse no automóvel, inclusive ofereceu a mão como um cavalheiro antigo.
- Obrigada - Aceitei e entrei na luxuosa e perturbadora limosine de cor preta.
Alfred e Helena finalmente chegaram, as mãos dadas era indício de que poderia ter um pouquinho de esperança. Ergui a sobrancelha e a Sra. Bennett bufou, mas não negou nada e nem tentou se justificar. O automóvel ganhou as ruas e senti o enjôo aumentar, borboletas e mariposas voavam em meu estômago. Eu era refém das emoções intensas que senti. Havia centenas de jornalistas em frente a mansão, a quantidade de flashes era absurda.
- Preparada? - Questionou Helena e senti a preocupação contida em sua voz.
- Sim, claro - Respondi torcendo para ser convincente, mas estava mentindo.
A porta foi aberta e as luzes brilhantes e cegantes nos atingiu. Os olhos queimaram de irritação, mas segui em frente. Venci a grande multidão e finalmente cheguei ao saguão. Vi o olhar dos bilionários da cidade em mim, todos pareciam questionar minha identidade. Talvez a máscara tenha sido uma boa ideia, Bruce se destacou e instintivamente andei até ele. Sorri satisfeito ao vê-lo perder a postura durante os minutos seguintes. Ele nem parecia o herói da cidade consumida pelo caos.
- Olá, Sr. Wayne - Comprimentei e notei a curiosidade dos homens próximos.
- Eu... nossa... o que... - Gaguejou e pude comemorar a reação do mascarado.
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Caos e Ordem - Bruce Wayne
Teen FictionEvangeline Eloíse Santos, brasileira de apenas 21 anos, se mudou para Gotham em busca de uma vida melhor, tentando esquecer seus traumas, tristezas e a solidão. Apesar da atmosfera sombria e os elevados índices de violência, ela foi acolhida pela ci...