Capítulo 29

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Estava chegando o fim da tarde, e as noticiais do noivado ressoam pelos ventos como sussurros de fantasmas avisando o mau presságio. A tarde fria atingiu os trabalhadores, que receberam a notícia do noivado com outros olhos. A fábrica esperava beirando um colapso, eles trabalhariam por migalhas. Migalhas essas propostas pelos donos da fábrica que davam agora uma festa em um local público. Estariam zombando de sua situação? A promessa de serem tratados como prioridade foi jogada à lama pelo Collins? O frio não esfriou as cabeças daqueles que se reuniram com Rodrigo, exigindo explicação, até mesmo os mais bonançosos dos trabalhadores rangeram os dentes com tamanha afronta.

— Ele está festejando! — Um barbudo alto bateu na mesa do pequeno depósito vazio que era usado para guardar cargas pelos trabalhadores da fábrica. — Gastando dinheiro, enquanto nós estamos prestes a aceitar essa situação miserável.

— Calma! — pediu Rodrigo. — Conversamos com o Marco Pilmon, ele garantiu que...

— Trataria com prioridade? — Ele soltou um riso debochado. — Estou vendo a prioridade. Aposto este disparate de salário que encontraremos o Pilmon bebendo na festa.

— Vamos esperar a reunião com os sócios. — comentou outro, batendo a palmas da mão esquerda no ombro de Rodrigo.

— É o mais certo a se fazer! — acrescentou Rodrigo.

— Não acho, estamos amolecendo para eles. Um dia de trabalho não é nada para eles. Tanto é que estão festejando. Nós sofremos com a redução de salário no fim da tarde, e eles...eles festejam.

Sua voz autoritária foi seguida por um grito eufórico dos homens ao lado. Os burburinhos começaram; os homens amassavam os punhos nas palmas das mãos. Exigindo explicações dos Collins. Exigindo que o contador explicasse para eles. Um homem que nem mesmo era da cidade, que não conhecia a fábrica, e estava decidindo a vida dos trabalhadores e suas famílias. Não, não podiam aceitar isso. Não podiam aceitar serem enganados mais uma vez pelos Collins.

— O problema são os Collins! — retrucou um baixinho — Soube... — O pobre menino franzino tentou ocupar espaço entre os homens altos e robustos, usando os finos ombros para abrir caminho — Soube de uma fábrica na cidade vizinha, que sofreu com a mesma redução. Os funcionários fizeram uma greve. — insinuou ele.

— E o que aconteceu?

— Fecharam a fábrica, as filiais... tudo — Ele jogou as palmas da mão para longe do corpo. — Até que o dono foi obrigado a retirar a redução de salário.

— É o que devíamos fazer! — apontou um, levantando-se da caixa que se sustentava. — Se pararmos a fábrica, paramos o bolso deles...quero ver ter festinhas — Ele espetou o queixo para o lado.

— Minha mulher trabalha em uma filial, posso falar com ela, e avisar às moças que trabalham lá.

— Esperem, esperem! — pediu Rodrigo. — Vamos esperar a resposta do Pilmon.

— Rodrigo, por favor! Por que está tão empenhado em defender essa família? Não foi seu irmão mesmo que perdeu uma lojinha para os Collins? Quer perder mais um sustento, amigo?

Rodrigo queria resolver as coisas pacificamente. Viu verdade nos olhos de Marco Pilmon, mas, também viu verdade nos olhos de seus amigos, estavam decididos, e ele não podia impedi-los de fazer algo que, no fundo, ele também queria. Seu estômago contorcia-se de raiva ao imaginar que após propor a redução dos salários, os Collins estavam festejando, como se estivesse brindando as conquistas à custa dos funcionários. Nem mesmo precisou responder, o galpão foi aberto pelos homens, que seguiram em marcha pela cidade, passando pela praça da cidade até as filiais e seguindo até a fábrica. Alguns dividiram-se para avisar os demais funcionários e as moças que trabalhavam nas cafeterias e docerias. Estavam avisando. Enquanto os Collins faziam mais um brinde pela tarde que se encerrava de forma agradável. Os funcionários avisaram pelas ruas: estavam em greve.

Por Todas as Palavras Não Ditas - Série Amores Em Ouro Verde: Livro 2Onde histórias criam vida. Descubra agora