Descendo a ladeira da praça central ao virar à esquerda do sino das famosas badaladas, um pouco afastada da cidade, tendo ao lado a floresta como vizinha e amiga, estava a casa de Juliet Romenik. A jovem foi a primeira das Romenik a sair de casa. Mas não, ela não se casou, e também não foi expulsa da residência. Ela saiu. Por escolha e vontade própria. Ao se encontrar e perceber que não era uma Romenik incompleta por ter o sangue apenas do Celiton Romenik, tão pouco se limitava em ser uma bastarda. Era a Juliet. Apenas Juliet. E isso bastava.
Ela implorou aos pais pela reserva da sua poupança matrimonial - dinheiro juntado pela mãe e pelo pai (no caso de Juliet, apenas pela mãe), designado aos gastos para o tão sonhado casamento. Bem, não foi necessário muito esforço, os Romenik não esperavam que ela fosse casar um dia, entregaram sua reserva de mãos cheias, sem questionar. Magda, pela primeira vez, usou argumentos para ajudar Juliet, no fundo, esperançosa de finalmente ver longe de sua casa a filha bastarda que a lembrava da infidelidade do marido.
Foi com as reservas que ela comprou a casa, mas não era uma simples casa, era uma pensão. A jovem, decidida de quem era, sem mais os moldes que antes lhe cercavam de uma sociedade pragmática, resolveu...viver. Agora, ela queria ajudar outras mulheres a se encontrarem. Foi assim que ela criou a sua pensão, onde qualquer mulher, sem distinção, sem preconceitos, poderiam se hospedar. Seja qual for o motivo: noite ruim no casamento, fugiu de casa, foi expulsa de casa. Qualquer motivo. Qualquer mulher que precisasse de ajuda. Ela não ficou triste por não ter ninguém nas primeiras semanas, isso era algo bom, afinal, significava que ninguém precisava de ajuda. Ela torceu que fosse... Mas ainda fazia cafés e bolachas todos os dias para receber quem quer que fosse.
Com a chegada da noite, ela colocou um casaco, também branco, e foi regar seus girassóis. Colocou água no regador acinzentado, já tomado de pontas enferrujadas, mas que guardava em um canto alto de sua estante por ser um dos poucos objetos que sua mãe havia deixado na casa dos Romenik. Ela saiu, sentindo o frio bater em suas bochechas rosadas. Gostava de regar durante as noites, iluminada pela luz da lua, gostava de pensar que deixava o sol exclusivo para que beijasse suas flores, esquentando-as depois de uma noite fria. Fechou ainda mais o seu casaco e derramou a água nas flores, com as gotas respingando em seus dedos, mostrava a idade e o desgaste do regador, que não derramava água da forma certa.
— Juliet! — Caroline desceu da carruagem correndo, enrolando seu vestido azul nos cercados que envolviam o pequeno jardim de Juliet, desequilibrando-se e rapidamente recompondo-se para chegar até sua irmã.
Juliet soltou o regador ao ver as lágrimas escorrendo nos olhos da irmã e correu para abraçá-la.
— Está tudo bem? — A moça de cabelos castanhos passou a palma da mão esquerda nas costas de Caroline. — Vamos entrar.
Ela ofereceu seu chá e os biscoitos que sempre fazia na esperança de ter hóspedes. Sentaram-se à mesa no centro da sala, que ficava ao lado dos dois sofás, onde deveriam ser realizadas as refeições na pensão. Quando tiver seus hóspedes, claro. A jovem Cardoli encostou a cabeça nos panos bege que cobriam a mesa de madeira, enxugando as lágrimas com um lenço rosa claro que a irmã prontamente a entregou.
— Obrigada — ela assoou o nariz, com as mãos trêmulas segurou o tecido, com a cabeça baixa, procurava palavras para explicar tudo.
— O que houve? — Juliet massageava o braço esquerdo da jovem, tentando passar algum conforto para a irmã.
— O Romero e eu discutimos. — disse ela. — Ele saiu de casa, anunciando aos quatro ventos que iria para aquele bordel imundo. — passou o lenço mais uma vez no nariz que não parava de escorrer entre as vozes entrecortadas que soltava em desespero — Eu não sei o que fazer, Juliet. Ele irá arrumar novas dívidas. Já perdemos a casa. O que mais ele irá perder? Não temos mais nada. — A filha dos Romenik colocou a mão na boca ao sentir o peso das lágrimas.
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Por Todas as Palavras Não Ditas - Série Amores Em Ouro Verde: Livro 2
RomansaA cidade de Ouro Verde sofreu algumas mudanças com a saída do casal recém-formado entre uma Mentis e um Pimon. Sem tempo para sentir saudade, os ventos trouxeram novos planos para os moradores da cidade, com as mudanças das estações de mais um ano e...