● Quarenta e Três

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O dia se passa em brancas nuvens pra mim. Ligo para o Ruggero umas dezenas de vezes, mas ele não entende. O celular dele cai direto na caixa postal.

Eu nunca o vi tão afetado quanto agora. A forma como ele me olhou antes de ir ainda reverbera dentro da minha cabeça.
Ninguém nunca me olhou com tanta dor no olhar. Dor e paixão. É uma mistura estranha, mas é isso que compõe o homem que eu amo.

Que eu amo e que me deixou livre.

Ele... quer terminar o nosso casamento.

Ruggero vai deixar o contrato de lado. Ele vai me deixar de lado.

Mas não era exatamente isso que eu queria desde que descobri da cláusula dos cem milhões? Não pedi a ele que me desse o divórcio?
E agora que ele quer fazer o que eu pedi, porque dói tanto? Porque eu quero me agarrar a ele e implorar que não me deixe ir?

É claro que eu sei a resposta de tudo. Sei perfeitamente.

Eu o amo. Eu o amo tanto que não quero imaginar como é viver sem ele com ou sem contrato; com ou sem brigas; com ou sem ele dizendo que me ama. Eu simplesmente... preciso estar com ele.

Pego a minha bolsa muito antes da hora de acabar o expediente e saio da construtora, pegando um táxi para ir para casa.

Ele tem que estar lá.

A nossa conversa não pode acabar desse modo. Nosso casamento não pode acabar assim.

E mesmo que ainda reverbere na minha mente o motivo da nossa discussão, há uma parte minha que não quer ouvir isso.
Essa parte só quer abraçá-lo e senti-lo.

Ele é a minha vida.

Ele é a porra da minha vida.

─ A senhorita está bem? Quer que eu abra mais as janelas?

Respiro fundo, ajeitando os cabelos atrás das orelhas.

─ Não, senhor. Eu estou bem. Só estou um pouco enjoada, mas é porque não comi nada hoje.

O motorista de cabelos completamente grisalhos tamborila os dedos no volante, assentindo para as minhas palavras.

Consigo ver seu rosto gentil e alegre pelo retrovisor.

─ Precisa se alimentar bem.

─ É o que a Sarita vive dizendo. Ela só fala em comida, comida, comida...

O senhorzinho ri.

─ Acho que a Sarita está certa. ─ Diz. ─ Às vezes a gente não percebe o quanto a nossa vida é importante e começa a se descuidar. Mas é um pouco equivocado isso, não é? Porque o corpo é a morada do nosso espírito, então nos resta cuidar daquilo que nos foi dado com tanto esmero pelo nosso... Pai. ─ Ele aponta discretamente para cima, ainda rindo. ─ Principalmente quando o nosso corpo guarda outra vida.

Pisco os olhos assimilando cuidadosamente o que ele diz, depois acabo rindo também da confusão que ele está fazendo.

─ Ah não. Eu não estou guardando outra vida, não. Não estou grávida.

O senhorzinho me olha pelo retrovisor.

─ Então perdão. Acho que me equivoquei. Sabe como é, a gente vai ficando velho e começa a perder a noção.

Balanço a cabeça, abrindo um sorriso para seu tom amável.

─ Tudo bem, não tem problema. Na verdade, seria um sonho para mim engravidar. Sempre pensei como seria ter um bebê nos meus braços. Uma criancinha que carregasse dentro dela o amor que uniu os pais.

El Amor Cambia de Piel - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora