● Trinta e Um

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Estou me tornando expert em sair de fininho da mansão. Quer dizer, dessa vez a Sarita me viu e tentou me fazer voltar e tomar café da manhã, mas eu consegui me desvencilhar e fugir, inventando que o táxi já estava me esperando.

O fato é que desde o momento estranho que tive com o meu marido no escritório dele ontem, não sei como reagir. Não estou acostumada com um Ruggero frágil que chora e busca em mim um conforto. Isso não combina com ele. Na verdade, não combina com nós dois.

E depois de passar a noite inteira pensando sobre o assunto, cheguei à conclusão de que preciso me afastar desse homem. Preciso ir para qualquer lugar, contanto que seja longe o suficiente para que eu não queira voltar tão fácil e nem ser encontrada por ele.

Por isso, assim que posso, entro no primeiro carro de aplicativo que aceita a minha viagem e vou até a casa dos meus pais, pois preciso buscar o meu veículo e, claro, alguns documentos que acabei deixando para trás quando sai da mansão dias atrás.

Assim que tudo estiver certo, eu me mando. Ao menos por um tempo. Não tem cláusula alguma que me obrigue a permanecer vinte e quatro horas por dia ao lado do Ruggero – eu li o contrato de novo.

─ Senhorita, como vai? ─ Um dos jardineiros me saúda assim que vê descendo do táxi. ─ Nunca mais tinha visto a senhorita.

Fico momentaneamente sem reação, porque nunca tive tanta amizade com os funcionários da casa, mas é estranhamente bom perceber que alguém sentiu a minha falta com tanta sinceridade.

─ Olá, Tiago. Estou bem, e você? O jardim está lindíssimo!

Percebo que o meu elogio o deixa ligeiramente encabulado.

Ele é um senhor de feição gentil e muito corada, provavelmente por trabalhar sob esse sol tão forte.
E apesar do grande chapéu de palha que usa, noto os sinais da exposição bem nítidos no canto de seus olhos, enfatizando algumas rugas de expressão.

─ Muito obrigado, senhorita. Eu amo as flores desde que era menino. E esse jardim daqui é a minha segunda casa.

Dou uma olhada em volta e reparo que nem eu mesma dei o devido valor a esse lugar.
Para ser sincera, nunca dei valor a muitas coisas pequenas, e só agora percebo como fui fútil.

─ Tiago, o senhor acha que assim como as flores, as pessoas também são capazes de desabrochar e se tornar melhores?

Ele retira o chapéu e coça a lateral da cabeça, esboçando um sorriso amável.

─ Se a gente cuidar das pessoas, assim como se cuida de uma rosa, eu acho que tudo pode acontecer.

─ Mesmo?

─ Claro, senhorita! ─ Sorri, apontando adiante. ─ Aquelas rosas ali do canto estavam bem tristonhas ultimamente, mas dediquei um tempo a mais a todas elas e, veja só, agora são as mais prefumadas belas da casa inteira!

Olho na direção em que ele aponta e constato que tem total razão sobre a beleza das flores.

─ É o tempo que dedicastes à tua rosa que a fez tão importante. ─ Sibilo, recordando uma passagem do livro do Pequeno Príncipe.

─ É isso mesmo! ─ Tiago exclama, alegre. ─ Quando você acolhe aquela rosa que não parece tão viva e cuida dela ao invés de jogá-la fora, você percebe que há muita coisa por baixo das pétalas maltratadas. Entende? A gente não pode amar só a beleza da flor, mas também o lado feio dela, porque quando desabrochar... é a coisa mais linda do mundo!

Um sorriso escapole dos meus lábios quando volto a encará-lo. Pisco os olhos para afastar algumas lágrimas que nublam a minha visão e o agradeço por ter conversado comigo.

El Amor Cambia de Piel - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora