● Dezessete

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Quando somos crianças e confabulamos sobre casamento há uma áurea inocente pairando sobre nós. Uma áurea de sonhos e pouca capacidade de ver como de fato pode ser a realidade que nos cerca.

Eu cogitei que após o casamento viria o mar de rosas. Jamais me pus a pensar que meu castelo era feito de cartas e que com um assopro tudo desabaria sobre a minha cabeça.

E quanto mais eu penso nos dias que antecederam esse que estou vivendo, menos entendo como chegamos a isso.
Ruggero jamais foi tão indiferente assim.

Um lado meu luta para justificar, afinal ele não está nada bem, mas o outro lado, aquele lado que foi mimado e acarinhado esse tempo inteiro, não quer digerir essa história, mas sim explodir, gritar bem alto para exalar a raiva que corre pelo meu sangue.

Eu só queria ajudar, caramba!

─ E então, conseguiu falar com ele?! ─ Sarita indaga, toda afobada, com um balde numa mão e um rodo na outra. Ela ia subindo as escadas, mas parou assim que me viu passando pela porta. ─ A senhora está bem? Está tão pálida! Eu disse pra comer antes de sair! Esses jovens de hoje em dia ficam por aí sem comer, daí depois tem uma queda de pressão e nem Deus salva!

Cruzo os braços bem rentes ao corpo sem me importar com seu sermão.

─ O projeto dele foi recusado de última hora. O dono da rede de hotéis voltou atrás e reincidiu o contrato.

Sarita pousa o balde no primeiro degrau da escada e deixa o rodo apoiado no corrimão.

─ Mas como assim? O meu menino é o melhor engenheiro que existe. Ele sempre trabalha duro e até já ganhou um monte de prêmio. Você precisa ver o quarto dele lá na Itália. Tem um bocado de troféu e umas medalhas de honra. É de dar orgulho!

Abro um sorriso fraco ao ver como ela é fã dele. Eu também sou. Mas agora estou magoada.

─ Eu não sei o motivo, Sarita. Eu só sei que o Ruggero está péssimo. Ele queria muito isso.

─ Pelo o que ele me disse um dia desses, seria o maior projeto já feito por ele e a equipe. O coitado nem dormia direito preparando tudo, além do casamento também. Ele estava muito focado nas duas coisas.

Suspiro pesadamente e aperto os lábios, abanando a cabeça.

Não entendo onde foi parar esse Ruggero tão entusiasmado pelo casamento.

─ Você já o viu triste assim muitas vezes? ─ Indago genuinamente. ─ Sei que parece uma coisa boba de perguntar, mas é que eu não sei o que fazer e nem o que pensar. Ele simplesmente me botou pra fora do escritório, quis ficar sozinho, estava todo fechado. Parecia um robô sem sentimentos.

Sarita passa as palmas das mãos pelo avental cor de rosa que está usando e depois vem até mim, pegando minha mão na sua para que eu a acompanhe até a sala.

Assim que chegamos perto do sofá, nos sentamos.

Permaneço quieta, esperando sua resposta, contudo, ela ainda pensa um pouco, lançando-me olhares de compreensão e empatia.

─ O Ruggero não é um homem fácil. E não é porque ele queira ser assim. De modo algum. Sei que se ele tivesse escolha, seria diferente. Mas quando alguém é ferido tão profundamente como ele foi, é complicado de se reconstruir novamente. Ele está muito quebrado.

─ Mas como assim? O que aconteceu? E-eu não...

─ Se ele não contou, eu não tenho esse direito de contar. ─ Ela se adianta. ─ O que eu posso dizer é que a pior coisa que pode acontecer a alguém como ele é ver quem ama se machucar de alguma maneira. Isso o destrói. A culpa corroeu o coração dele de uma maneira que eu nem sei explicar. E por mais que eu saiba que ele te ama, eu acho que ele também te enxerga como uma salvação. Só não sei até que ponto isso é saudável.

El Amor Cambia de Piel - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora