Paixão

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Mitchell passou boa parte da manhã em um jornal local, falando sobre a doença vermelha, sobre seu pai, sobre o hospital e a princesa Lynae. Tentou falar da melhor forma que pôde, para que ninguém pudesse distorcer suas palavras.

À tarde, ficou passeando pela cidade, tirou fotos com algumas pessoas, acenou para outras, sempre cercado por seus guardas, porque não podia dar um passo fora do castelo sem ele. Às vezes, sentia inveja daqueles que não eram da realeza, que podiam simplesmente caminhar sem atrair olhares e a curiosidade alheia. Deveria ser muito libertador, sobretudo viver sem precisar seguir um protocolo, amar quem quisesse amar...

Quando voltou para o castelo já era noite. Ele perguntou para o primeiro funcionário que encontrou onde a princesa Lynae estava, disseram que ela havia saído. Isso foi um alívio. Mitchell sabia que era covardia da sua parte, mas ainda não estava pronto para vê-la, para falar com ela.

Mitch foi direto para a única coisa que sabia que lhe traria conforto. Ele sabia que tinha um piano naquele castelo, em uma sala dourada, com uma pintura renascentista de anjos no teto, móveis de veludo vermelho, janelas altas e, bem no centro estava um piano de cauda preta brilhante.

Ele se sentou no banquinho, posicionou seu pé no pedal e colocou os dedos sobre as teclas.

Subitamente, Mitchell se lembrou da primeira vez em que tocara com Lynae, da primeira vez que tocava em muito tempo, desde que seu pai morrera. Ele achou que nunca mais encostaria em um piano, era tão absurdamente doloroso lembrar dele e, a mínima nota tocada em um piano já fazia seu coração doer. Mas quando a ouviu tocando e cantando, alguma coisa dentro dele dizia que deveria parar para ouvir. E, além disso, tocar com ela, porque ele queria ouvir de novo a melodia de um piano, queria sentir isso, queria e precisava desesperadamente. E foi Lynae quem o despertou novamente pra música.

Então, Mitchell começou a tocar, uma música infantil até, chamada "Cantos da Primavera". Foi a primeira que seu pai o ensinara a tocar no piano. Era uma melodia lenta e tão fácil que ele podia tocar com uma mão só. Ele apoiou um dos braços no tampo do piano e começou a deslizar seus dedos pelas teclas com a mão livre.

Não soube por quanto tempo tocou, mas quando terminou, Mitchell teve a ligeira impressão de ter repetido a música umas sete vezes.

– Isso é muito bonito.

Mitch olhou por cima do ombro e viu Mavis de braços cruzados em baixo do portal. Ela trazia no rosto um sorriso amigável.

Ele podia sentir o problema se aproximando. Sabia como Mavis olhava pra ele, tinha plena ciência disso, também estava ciente do ciúme que Lynae sentia dela. Sabia também o que poderia ajudar a tirar a esposa de seu irmão de sua cabeça, pelo menos por uma noite e, ela estava bem ali, sorrindo pra ele.

– Gosta de piano? – Mitch se pegou perguntando.

Mavis deu de ombros.

– Eu não sei tocar, mas acho o som muito bonito.

Mitchell deslizou mais para o lado do banco, para dar espaço a ela.

– Quer que eu ensine você?

Ela arqueou suas sobrancelhas desenhadas e, sorrindo com o canto da boca, seus olhos verdes escuros miravam Mitchell, como se estivesse desafiando-o a retirar o convite. Então, Mavis deu de ombros e foi até ele, sentando-se ao seu lado, em seguida.

– Por que não?

– Carto. Vamos tentar o básico. Me acompanhe – Mitch tocou três notas seguidas, depois fez uma pausa e, em seguida, tocou mais duas. Era uma melodia simples, que seu pai o ensinara no começo.

A Ascensão do ReiOnde histórias criam vida. Descubra agora