Santiago Castillo
Após o café da manhã, Giovanna me pede para arrumar o quarto do nosso filho, assim ela ganharia tempo já que estava um pouco atrasada. Eu me concentro na tarefa, os gestos automáticos de arrumar a cama fazendo a mente vagar, até que ouço a porta se abrir. Meu ex-sogro entra, sem cerimônia, com um sorriso travesso no rosto, e pergunta, casual, como foi com Bruno. Sem hesitar, conto tudo o que aconteceu, os detalhes do que passamos juntos. Ele escuta atentamente, mas a única coisa que faz depois é rir, como se tudo fosse uma piada.
— Tá rindo? A culpa não foi minha, você é quem disse que eu deveria ficar de olho no cara. Você é tão culpado e cúmplice quanto eu.
A gargalhada rouca continua, preenchendo o silêncio do quarto. O som parece ressoar nas paredes.
— Isso não significa que deve investigar a vida do rapaz, Santiago! — ele solta outra risada, agora mais abafada, e se escora casualmente na porta do quarto. — Convenhamos, você só paga mico!
— Esse é o preço por tentar reconquistar a sua filha. — As palavras saem de forma impulsiva, e só então percebo o que acabei de dizer. Arrego os olhos, tentando esconder a surpresa de ter me entregado tanto.
— Então é isso? Você está tentando reconquistá-la? — A pergunta dele é direta, incisiva.
— Não. Não foi isso que quis dizer, eu só estou tentando cuidar deles. — Tento corrigir a frase, mas a confissão já paira no ar, incontrolável.
— Eu admiro essa sua insistência, sabia? — Ele se aproxima um pouco mais, e sua mão, calejada pela vida, repousa sobre meu ombro, com uma suavidade inesperada. — Se eu tivesse sido mais assim no passado, talvez não tivesse deixado a Manoela ir embora da minha vida.
Sinto o peso das palavras dele, e fico um momento em silêncio, ponderando o que ele acabou de compartilhar.
— Giovanna já foi? — Pergunto, esticando o pescoço para o corredor, tentando desviar o olhar de seus olhos cansados. Sei que ele evita mencionar o nome de Manoela na presença dela.
— Ainda não, está terminando de aprontar o menino para ir para a escola.
— Me conta sobre isso? — Termino de ajeitar a cama, agora com um olhar atento, fixado nos olhos de meu ex-sogro. Eles estão cansados, mas também cheios de algo que nunca vi antes: uma dor sutil, talvez até uma nostalgia que ele não sabe como esconder.
— Manoela é a mãe da Giovanna. Sempre foi linda, meu primeiro amor. Mas é uma pena que eu tenha sido tão covarde... — Ele desiste de continuar, e um longo silêncio toma o ambiente. — O que passou, passou, não é mesmo?
Há uma tensão no ar, algo no olhar dele me faz sentir o peso de anos não resolvidos, de sentimentos que ele não sabe como lidar. Mesmo depois de rir sobre o episódio com Bruno, ele não consegue esconder a preocupação que agora domina seu semblante.
— Fala a verdade. Está rolando algo? — A pergunta sai mais pesada do que eu esperava.
Ele suspira, como se o fardo das palavras fosse maior do que qualquer explicação.
— Vinte e quatro anos. Esse foi o tempo que ela levou para entrar em contato depois de ter partido.
— Então? Ela entrou em contato? — Pergunto, sentindo uma angústia crescente tomar conta de mim, uma sensação que me aperta o peito. Medo talvez, medo que essa revelação possa abalar a vida de Giovanna, a estabilidade que ela tem buscado nas últimas semanas.
— Sim. Ela me mandou uma correspondência. Disse que está morando na Bahia, em Salvador. Não sei como foi parar lá, mas na carta ela diz que não está nada bem.
A notícia cai como uma pedra, pesada e inesperada. Eu seguro o ar por um momento, processando.
— E o que vai fazer? — Pergunto, tentando entender o próximo passo dele.
— Vou viajar. Quero reencontrá-la. Não diga nada para a Giovanna. Quero que cuide de tudo por aqui. Sem brigas com o Bruno, me entendeu?
— E quando vai? — Pergunto, o coração acelerado, sabendo que o tempo é curto.
— Amanhã. — Ele olha para mim com uma expressão que mistura decisão e fragilidade. — Vanessa já sabe? — Pergunto, tentando manter a calma.
— Não. Ela... não tive coragem. É um assunto muito delicado. Preciso resolver as coisas que estão mal resolvidas há vinte e quatro anos. Preciso do seu apoio.
— Fica tranquilo, eu vou cuidar de tudo por aqui, em sua ausência. — Respondo, e nossos olhares se cruzam, cúmplices. Ele confia em mim, mais do que eu imaginava.
Demorou, mas finalmente consegui. Meu ex-sogro confia em mim.
— Santiago, eu já estou indo. — Giovanna entra no quarto, a bolsa pendurada no ombro, as mãos enfiadas nos bolsos traseiros da calça. Sua postura está relaxada, mas há uma leve tensão nos olhos. — Será que você pode ficar com o Christian, até mais tarde hoje?
— Claro. — Respondo, sem hesitar.
Ela olha para o pai, e mesmo sem que ele peça qualquer explicação, ela sente a necessidade de dizer onde vai.
— Eu vou jantar fora. — Sua voz é firme, mas há uma sutil hesitação enquanto ela fala. Ela desvia o olhar para os brinquedos nas prateleiras, como se procurasse algo para se distrair. — Com o Bruno.
— Hum. Ele vai fazer fofoquinhas para você? — Provoco, um sorriso brincando nos meus lábios.
Ela me encara, o olhar acusador mas divertido, como se não tivesse paciência para as minhas piadas.
— Não sei, mas ele me disse que é uma coisa muito séria. — A forma como ela fala me faz pensar que, para ela, isso realmente importa. Ela dá um beijo no pai, se despede e, com um gesto rápido, nos dá as costas, saindo do quarto com uma leveza que é difícil de decifrar.
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Depois que tudo deu errado
Roman d'amourNo passado Giovanna Martins viveu um romance intenso com Santiago Castillo, o pai de seu filho Christian de apenas quatro anos. Juntos eles enfrentaram muitas circunstâncias que nem sempre foram a favor desse amor deixando muitas marcas e mágoas ent...