Capítulo 4

2.4K 183 2
                                    

Santiago Castillo

Eu deveria beber. Encher a cara até que meu corpo desabasse, talvez até escorregasse para um coma alcoólico, só para anestesiar a raiva que pulsa em minhas veias. Raiva de uma ex-esposa que transformou o casamento em uma encenação barata. Mentiras, segredos e omissões... 

Mas mesmo que eu bebesse até apagar, não mudaria nada. No amanhecer seguinte, a culpa ainda estaria lá, pesando como chumbo nos ombros, me assombrando com lembranças do que fiz.

Magoei a mãe do meu filho. Meu Deus, como eu a magoei. E, por segundos de pura estupidez e covardia, acreditei que um casamento de fachada, com outra mulher, seria o remendo para a bagunça que criei. Se ao menos eu soubesse que ela estava esperando um filho... Nunca teria tomado decisões tão mesquinhas. 

Agora, segurando a certidão de divórcio, encaro a noite fria e úmida que parece tão vazia quanto eu. O relógio quase marca nove, e eu sequer sei onde vou dormir. Poderia voltar à casa, ainda tenho a chave, mas não quero encarar aquela mulher de novo. Não quero ver o cinismo nos olhos dela ou ouvir um pedido de desculpas que soa tão falso quanto foi nosso casamento.

Dentro do carro, com as mãos apertando o volante até os nós dos dedos ficarem brancos, observo o vento agitar os papéis no chão e as árvores que se curvam sob sua força. A tempestade está próxima. Perdido entre pensamentos e sem um plano definido, decido ir até a casa de Giovanna. Sei que não há mais nada a ser dito entre nós, mas algo em mim quer que ela saiba: finalmente tomei uma decisão importante. Talvez seja porque, mesmo no meio de tanto caos, é com ela e Christian que encontro a paz que tanto preciso.

Christian. Meu maior orgulho. Ele tem apenas quatro anos, mas já carrega o peso do meu mundo. Ele é minha luz em meio ao caos. Um menino de olhos verdes claros que hipnotizam, pele parda e cabelos escuros que escorrem como os meus. Ele é minha cópia, mas nas atitudes, já demonstra ser muito mais. Um dia será um homem melhor do que eu jamais fui, disso não tenho dúvidas.

Rapidamente chego ao condomínio aonde eles moram. Os jardins, meticulosamente cuidados, parecem me receber com um silêncio quase solene. Estaciono entre as faixas de pedras que dividem o gramado ao meio. A casa está parcialmente às escuras. A garagem fechada, o andar superior apagado. Apenas uma luz fraca na sala e cozinha dá sinais de vida.

Desço do carro. A chuva, agora pesada, molha meus cabelos e roupas, mas não me importo. Em passos lentos, deixo a água escorrer pelo rosto. Caminho até a grande porta. O peso do que fiz, do que deixei de fazer, é quase insuportável, mas o desejo de vê-los é maior.

Toco a campainha, sentindo meu coração acelerar. A espera é curta, mas parece infinita. Quando a porta se abre, não é Giovanna que vejo.

Christian corre para mim, com seu sorriso puro e inocente iluminando toda a escuridão que carrego. Ele pula em meu colo, e tudo para. O mundo, minha culpa, meu ódio... Nada mais importa. Apenas ele, meu filho, minha razão para continuar.

— Onde está a mamãe? — Pergunto e ele aponta para dentro da casa.

E então, sem aviso, a imagem de Giovanna se forma diante de mim. Sempre impecável, mesmo nas situações mais simples. Seus cabelos castanho-escuros, longos e lisos, estão presos em um coque despretensioso. O casaco largo com o desenho do Mickey Mouse contrasta com o short curto que revela sua silhueta bem definida. Ela tem aquele sorriso pequeno nos lábios, mas quando me vê, como de costume, seu semblante endurece.

Giovanna tenta ser educada, manter a naturalidade, mas eu consigo captar os momentos em que o olhar dela vacila. Há tristeza ali, escondida entre os gestos e palavras ensaiadas.

Depois que tudo deu erradoOnde histórias criam vida. Descubra agora