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22 de julho de 1986

Steve estava me levando pra escola e estava um silêncio absurdo no carro. Eu precisava contar para Steve as coisas que eu estava vendo mas não sabia se era o momento certo.

- Tudo bem, Aly?

- Tô ué.

- Eddie disse pra eu ficar de olho em você. Devo me preocupar?

Que merda, Munson. Revirei meus olhos e murmurei alguns xingamentos.

- O que mais ele disse?

- Só isso. Eu deveria saber mais alguma coisa? - Perguntou olhando para a estrada.

- É que eu acho que vi o papai.

Steve deu uma freada brusca, quase me matando de susto. Ele me olhou assustado e passou a dirigir devagar.

- Como assim? Tipo, você viu ele andando ou ele chegou perto de ti?

- Ele estava me observando de longe.

- Quando? - Perguntou com desespero.

- No sábado e ontem.

- Por quanto tempo ele ficou te olhando?

- Eu não sei. Depois que eu notei, ele ficou uns cinco minutos lá e depois ele desaparecia do nada quando eu me distraia com algo.

- Merda, Alysson. Por que não me contou nada?

- Eu não tinha certeza se era ele mesmo. - Respondi na defensiva.

- E agora tem?

- Não. Achei que você pudesse ter visto o mesmo, por isso te contei.

- Olha só Aly, ao contrário de você, eu não fico olhando à minha volta. Eu só olho pra frente. E o papai não iria aparecer na minha frente.

Revirei os olhos mais uma vez. Jesus Cristo, que moleque convencido.

- Tá, só... Me fala se ver alguma coisa. Eu acho que estou ficando louca e a sensação não é das melhores.

- Pode ser a assombração dele. Tem certeza que quer ir na escola hoje?

- Acelera Steve, eu tô atrasada.

Assim ele fez e eu cheguei na escola rapidinho. Quando fui descer do carro, ele me segurou pelo pulso.

- Se você ver o velho, dá um soco nele.

- Eu prometo.

O garoto me soltou e eu fui para minha sala. O sinal já tinha batido, eu estava atrasada. E o primeiro horário era de... Matemática avançada.

Entrei na sala com receio e vi o professor Smith. Minha respiração começou a ficar irregular. Ele me olhou confuso e me mandou sentar.

Eu sei que tudo o que tinha acontecido, tinha sido um sonho. Mas eu não duvido muito que possa acontecer na vida real também, já que ele já tinha dado em cima de mim antes de tudo.

Eu queria distância daquele homem. Era mais uma coisa pra eu me preocupar. Comecei a desenhar pra me distrair daquele momento. É claro que eu não podia ficar assim em todas as aulas, mas pelo menos nessa, eu ficaria.

A aula passou muito devagar. Provavelmente pelo fato de eu estar ansiosa. Quando estava saindo, o professor me chamou. Lembrança vieram à tona.

- Eu disse pra você me soltar.

Ele segurou meu outro braço e me puxou mais pra perto.

As lágrimas começaram a escorrer pelo meu rosto e eu saí andando rápido dali, o ignorando. Ele não iria fazer isso outra vez.

Eu olhava pra baixo, pra ninguém ver meu rosto desolado. Entrei no banheiro e passei uma água no rosto. Ele não pode me machucar. Eu dizia isso pra mim mesma várias e várias vezes.

Tomei o remédio pra dor que eu carrego na mochila. Ele me ajudaria a me acalmar também. Me recompus e saí do banheiro.

As outras aulas foram normais, apesar de eu sentir minha pernas dormentes pelo efeito do remédio. Mas eu estava calma, isso era o que importava.

Na hora do intervalo, fui para atrás da quadra. Já tinha virado rotina. Era impossível almoçar no refeitório com aquele tanto de pequenos jornalistas na minha cola.

Eles eram loucos, não é? Por que o jornal da escola precisaria de um depoimento de uma aluna depois da casa dela ser incendiada? O jornal da escola deveria ser só sobre coisas relacionada à escola. Não sobre os alunos.

Me sentei no chão e ouvi passos se aproximando. Provavelmente era Eddie, então nem me importei. Ele vinha almoçar aqui comigo sempre, pra eu não ficar sozinha.

- Oi, Eddie.

Olhei para cima e aquele cara definitivamente não era ele. Rapidamente, me levantei.

- Eddie? É o nome do seu namorado?

- Pai?

- Feliz em me ver? Eu senti tanta a sua falta, filha.

As lágrimas já escorriam pelo meu rosto. Eu não podia acreditar que era ele. Que estávamos mais uma vez de frente à frente.

- Não. Não me chama de filha.

- Você deveria ter mais respeito pelo seu pai. Se lembra que eu disse que iria descobrir sozinho? Pois é, Alysson. E eu descobri. Descobri por que você só tem esse menino como amigo. Eddie... Munson?

- Deixa ele em paz! Ele não teve nada a ver com nada.

- Eu sei. Mas se ele machucado te afeta, então...

- Não, não. Se você encostar um dedo seu nele, eu juro que acabo com você.

- Alysson, não seja boba. Você não pode fazer nada contra mim. Eu te criei assim pra não ter coragem de me enfrentar.

- Mas eu tenho, e você sabe que sim. É de família.

Ele me segurou fortemente pelo braço. Me lembrei do que Steve tinha falado antes de eu entrar na escola. Segui o que ele disse, e dei um soco nele, seguido de um chute em sua genitália.

Peguei minhas coisas enquanto ele se contorcia de dor e saí correndo. Minhas pernas estavam fracas por causa do remédio que eu tomei mais cedo, mas eu precisava sair dali.

Entrei na escola novamente e esbarrei em Eddie, me fazendo cair em seus braços.

- Ei, que milagre te ver dentro da escola na hora do intervalo. Eu estava indo te encontrar. Tudo bem?

O olhei assustada e com os olhos molhados. Ele sussurrou um xingamento para si e me levou até uma sala vazia. Então, eu contei o que tinha acontecido.

- Eu não tenho nenhum minuto de paz, Eddie. Mais cedo, eu achei que o professor me perseguiria, mas quem me perseguiu foi meu pai. Parece até que eu joguei pedra na cruz. - Dizia rapidamente e com raiva.

- Ele te machucou?

- Não, eu tô bem.

- Então, ele disse que vai me sequestrar. É isso?

- Não. Ele só ameaçou te machucar, mas eu não vou deixar isso acontecer, ok?

- Não se preocupa comigo. Eu sei me virar. Você contou para o Steve que tinha visto ele?

- Contei no caminho pra cá.

- E ele viu seu pai também?

- Não, mas o Steve é lezado. Não veria mesmo.

- Então precisamos ligar pra ele. Se seu pai não conseguiu nada contigo, ele vai atrás do seu irmão.

Confirmei com a cabeça e assim fizemos. Eddie me levou pra casa e Steve foi em uma delegacia contar tudo.

O que aconteceria daqui pra frente? A cada dia que passa, eu quero mais e mais respostas. E sempre me arrependo de ter elas depois.

Eu estava com raiva. O sentimento que era medo, se tornou fúria. Por que aquele homem não podia só ter morrido no incêndio? Por que fazer a minha vida um inferno de novo?

me and your mamaOnde histórias criam vida. Descubra agora