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19 de agosto de 1986

- Aly, tem visitas para você. Vai querer ver eles hoje de novo? - Perguntou uma das enfermeiras.

- Acho que sim. Como estou?

- E desde quando você se importa em como você está?

- Não me importo. Onde eles estão?

- Vem comigo.

Ela me levou até o salão de visitas, onde pude ver Steve e Eddie à minha espera. Quando meu irmão me viu, veio correndo me dar um abraço.

- Eu senti sua falta, maninha. Como você está?

- Eu pareço bem?

- Está pálida.

- Eu já disse pra ela que ela vai virar um vampiro. - Disse Eddie se metendo no meio. - Você está ótima.

- Obrigada, Munson.

Ele fez uma reverência e nós nos sentamos em uma mesa que tinha ali. As enfermeiras estavam sempre por perto pra garantir segurança à todos, mas elas não entravam no meio da conversa, nem nada do tipo.

- Por que decidiu ver a gente depois de tanto tempo? Eu duvido muito que Eddie simplesmente pediu e você aceitou.

- Não questiona, Steve. Não está feliz por me ter aqui?

- Claro que estou. Só é de se estranhar um pouco.

- Não tem nada para se estranhar. Você é que é o estranho. - Rimos.

- Eu trouxe as fitas que você pediu. - Disse Eddie.

- Sério? Nossa, obrigada! Não acredito.

O garoto me entregou uma sacola com 6 fitas e um fone de ouvidos. Olhei bem e eram todas músicas do AC/DC. Milagre ele ter aberto a mão disso.

- Eu sei que sou demais. De nada.

- Convencido. E como estão as coisas do lado de fora?

- Ah, normais. Não é, Eddie?

- É. Estão sim. Claro. Por que não estariam?

- O que estão escondendo?

- A gente? Nada. Por que acha que a gente está escondendo algo?

- É, não temos nada a esconder. Temos?

- Não. Nada.

- Vocês mentem tão mal, que parece ser proposital. Desembuchem.

- Não temos nada a esconder não, Aly. Você é que está doida.

Steve deu uma cotovelada em Eddie, em repreensão. "Doida" não era o termo mais apropriado para aquela situação, mas eu sei que não foi proposital.

- Eddie!

- Ah, desculpa. Verdade.

Ficamos em silêncio por alguns segundos. Eu encarando os dois, confusa, esperando respostas e os dois de cabeça baixa, evitando o contato visual.

- Falem alguma coisa! - Disse de repente, fazendo eles levarem um susto. - O que está rolando?

- Tá legal, não consigo esconder nada de você.

- Steve! - Disse Eddie em repreensão.

- O que foi? Olha para a cara dela. Ela está fazendo aquele olhar mortal. Você pode não ter medo dela, mas eu tenho.

- É, eu também tenho.

- Devem ter mesmo. Falem logo o que é.

- Algumas pessoas da escola estão planejando vir aqui para te ver no domingo.

- Domingo? Nesse domingo?

- É...

- Não acredito que vocês não impediram isso! Eu juro que vou matar os dois.

- Eu disse que ela ia surtar se a gente contasse! - Disse Eddie.

- Pois é. E se não contassem, estariam mais ferrados ainda. Pelo menos, agora eu sei que não é pra eu sair do quarto no domingo.

- O que? Não vai sair do quarto?

- Claro que não! Só pra render fofoca no jornal da escola? Não.

- Mas isso seria muita injustiça. Com nós dois e com você.

- Pois é! É seu aniversário, Aly!

- É meu aniversário?

- É, no domingo. Não estava lembrada?

- Não sei se você sabe Steve, mas aqui não temos calendários. Os dias são todos iguais.

- É seu aniversário de 18 anos. Lembra que a gente tinha planos?

- Isso foi antes de eu ser internada em uma clínica psiquiátrica e antes da escola resolver vir me ver, quando eu não quero ver eles, Eddie.

- Não importa. É uma data especial e você não vai se livrar da a gente nela. Muito menos de mim.

- Nem de mim. Ver minha irmã se tornando maior de idade, era meu sonho de infância. Eu ficava imaginando você toda fodona bebendo todas.

- Primeiro que eu não bebo. Segundo que eu não sou tão fodona quanto você sonhava.

- Está brincando? - Disseram juntos.

- Aly, tu é a garota mais foda que eu já conheci. E olha que eu nem te conheço a tanto tempo.

- Exatamente. E eu te conheço à muito tempo. Que não é o que, guria? Vai viver.

- Agradeço pela tentativa de terapia, mas eu tenho uma profissional pra isso por um motivo.

- Repete comigo: Eu sou foda. - Mandou Steve.

- Não, eu passo. Valeu.

- Vai, fala.

- Não. Isso é estranho, para.

- Tá bom.

- Enfim né. Tratem de impedir que esse povo venha pra cá, ou eu vou passar meu aniversário trancada no quarto.

- Como a gente faz isso?

- Deem uma desculpa, sei lá. De que eu tô proibida de ver mais de duas pessoas ou não sei. Te virem.

- E se a gente não conseguir? - Perguntou Eddie, preocupado.

- Aí vocês dois vão estar me devendo duas casquinhas de sorvete.

- Ah, não.

- Ah sim, Munson. Sem reclamar, ou vão ser três casquinhas.

Os dois reviraram os olhos e riram. Senti falta dessas risadas. Dos dentes brilhantes, das linhas de expressão do rosto, do som e do sentimento de não segurar um pequeno sorriso vendo eles assim.

Eu amava tanto esses dois garotos, que não sei como seria minha vida sem eles. Eles são chatos demais, mas eu os amo. Amo tanto, que chega a doer.

Nossas conversas rendiam muito. Eu perdia a noção do tempo, quando estava com eles. Só reparei que já estava de noite, quando uma das enfermeiras disse que o horário de visitas tinha acabado.

- Tchau, maninha. Se cuida. Te vejo amanhã, ok?

- Aham. Tchau, popeye.

- Bom, também te vejo amanhã?

- Se você não morrer, nem nada do tipo até lá... Sim, Munson.

- Então boa noite, princesa.

- Boa noite.

Roubei um selinho rápido dele e dei um sorriso, voltando para meu quarto. Pude notar seus olhos ainda caindo sobre mim. Errado o que eu acabei de fazer? É, ia contra as regras dos visitantes, mas eu pouco me importava.

me and your mamaOnde histórias criam vida. Descubra agora