98. Onde se prova que aos reis é às vezes mais difícil entrar na capital do seu

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reino do que sair dela (continuação)


Como sempre acontece em situações assim, o choque daquela massa de gente foi terrível. Os mosqueteiros, em número insuficiente, não conseguiam formar linha nem fazer com que seus cavalos se movimentassem no meio daquele mundaréu e começaram a ficar acuados.

D'Artagnan quis baixar a cortina da janela do coche, mas o jovem rei estendeu o braço e disse:

— Não, sr. d'Artagnan, eu quero ver.

— Se Vossa Majestade quer ver — disse ele —, que veja!

E com aquela fúria que o tornava tão terrível, ele partiu contra o chefe dos arruaceiros, que, de pistola numa mão e uma espada larga na outra, tentava abrir caminho até a portinhola, lutando contra dois mosqueteiros.

— Abram espaço, em nome de Deus! Abram espaço!

Ouvindo esse grito, o homem da pistola e da espada larga ergueu a cabeça, mas tarde demais: o capitão dos mosqueteiros havia desferido seu golpe e o espadagão atravessou-lhe o peito.

— Ai, com mil diabos! — gritou d'Artagnan, tentando inutilmente conter o golpe. — O que está fazendo aqui, conde?

— Cumprindo meu destino — disse Rochefort, caindo de joelhos. — Já me ergui de três dos seus golpes de espada, mas não me erguerei deste.

— Conde — disse d'Artagnan com certa emoção —, eu o feri sem o reconhecer. Não quero que morra com sentimento de ódio por mim.

Rochefort estendeu a mão e d'Artagnan tomou-a. O moribundo quis falar, mas uma golfada de sangue abafou qualquer palavra. Seu corpo crispou-se numa última convulsão e ele morreu.

— Para trás, cretinos! — gritou d'Artagnan. — O chefe está morto, não têm mais o que fazer aqui.

De fato, como se o conde de Rochefort fosse a alma do ataque contra aquele lado da carruagem do rei, a multidão que o havia seguido e a ele obedecia, vendo-o cair, fugiu. D'Artagnan encabeçou uma carga com uns vinte mosqueteiros pela rua do Coq e essa parte do tumulto se desfez como fumaça, espalhando-se pela praça Saint-Germain-l'Auxerrois e confluindo na direção do Sena.

D'Artagnan voltou para ver se Porthos precisava de ajuda. Ele, no entanto, havia feito sua parte com igual competência. A esquerda da carruagem estava tão livre quanto a direita e foi levantada a cortininha que Mazarino, menos belicoso que o rei, tinha tido a precaução de abaixar.

O barão parecia decepcionado.

— Que cara é essa, Porthos? Nem parece a de alguém que acaba de conseguir uma grande vitória!

— Mas você mesmo parece bem estranho!

— Mas tenho por quê, diabos! Acabo de matar um velho amigo.

Vinte Anos Depois  (Alexandre Dumas) - Edição Comentada e IlustradaOnde histórias criam vida. Descubra agora