80. A volta

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Athos e Aramis seguiram o itinerário indicado por d'Artagnan, tão ligeiros quanto podiam. Achavam que, se fossem presos, seria melhor estar o mais perto possível de Paris.

Todas as noites, temendo que isso acontecesse antes do amanhecer, escreviam numa parede ou num vidro o sinal combinado, mas no dia seguinte, surpresos, descobriam ainda estar livres.

À medida que se aproximavam de Paris, os grandes eventos a que haviam assistido se esvaíam como se esvaem os sonhos. Em contrapartida, aqueles que sacudiram a capital e outras regiões da França naquele período vinham ao encontro deles.

Nas seis semanas em que estiveram ausentes, tantas pequenas coisas haviam ocorrido no país que, juntas, quase compunham um grande acontecimento. Os parisienses, naquele dia em que acordaram sem rainha e sem rei, sentiram- se muito abalados e a ausência de Mazarino, tão ardentemente desejada, não compensava a dos dois augustos fugitivos.

A primeira sensação que sacudiu Paris, ao saber da fuga para Saint-Germain, aquela que ensejamos ao leitor acompanhar, foi como o terror que invade as crianças quando acordam durante a noite ou na solidão. O Parlamento agiu e foi decidido que uma comissão iria até a rainha, pedindo que não privasse Paris de sua real presença.

Ana da Áustria, porém, estava ainda sob a dupla impressão de triunfo, o de Lens e o da fuga. Os deputados não só não tiveram a honra de uma audiência, como foram obrigados a esperar na estrada, onde o chanceler, aquele mesmo chanceler Séguier, que no primeiro volume dessa obra 465 vimos tão obstinadamente buscar uma carta, a ponto de revistar o espartilho da rainha, foi entregar a eles um ultimato, dizendo que se o Parlamento não se humilhasse perante a majestade real, condenando todas as questões que haviam causado a querela que os afastava, Paris seria sitiada já no dia seguinte. Preparando esse cerco, o duque de Orléans inclusive já ocupava a ponte de Saint-Cloud e o sr. Príncipe, no resplendor ainda da vitória de Lens, controlava Charenton e Saint-Denis.

Infelizmente para a Corte, a quem uma resposta moderada teria devolvido um bom número de aliados, a resposta ameaçadora produziu efeito contrário ao esperado. Feriu o orgulho do Parlamento, que, sentindo-se amplamente apoiado pela burguesia, que tinha se dado conta de sua força graças ao caso Broussel, respondeu a esse manifesto acusando o cardeal Mazarino de ser o notório causador de toda aquela desordem. O italiano foi declarado inimigo do rei e do Estado, com ordem para que se retirasse da Corte naquele dia mesmo e da França uma semana depois. Expirado esse prazo, em caso de desobediência, todos os súditos do rei estavam convocados a ir contra ele.

A resposta enérgica, totalmente inesperada pela Corte, punha Paris e Mazarino, ao mesmo tempo, fora da lei. Restava apenas ver quem ganharia, se o Parlamento ou a Corte.

Esta última se preparou então para o ataque e Paris para a defesa. Os burgueses fizeram o que estavam acostumados a fazer em tempos de tumultos, ou seja, esticar correntes para impedir o trânsito e arrancar o pavimento das ruas, quando viram chegar em apoio, trazidos pelo coadjutor, o sr. príncipe de Conti, irmão do sr. príncipe de Condé, e o sr. duque de Longueville, seu cunhado. Isso os tranquilizou muito, o fato de ter com eles dois príncipes de sangue, além da vantagem numérica. Foi em 10 de janeiro que esse apoio inesperado socorreu os parisienses.

Depois de uma discussão tempestuosa, o sr. príncipe de Conti foi nomeado generalíssimo das tropas do rei 467 fora de Paris, e os srs. duques de Elbeuf e de Bouillon, assim como o marechal de La Mothe, seus generais adjuntos. 468 O duque de Longueville, sem comando nem título, contentou-se em dar assistência ao cunhado.

Vinte Anos Depois  (Alexandre Dumas) - Edição Comentada e IlustradaOnde histórias criam vida. Descubra agora