77. O vinho do Porto (continuação)

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Grimaud esperou que a tranca da porta rangesse e, certo de estar sozinho, ergueu-se devagar junto à parede.

"Ah!", ele pensou, enxugando com a manga da camisa as gotas de suor que escorriam pela testa, "que bom que Mousqueton teve sede!"

Voltou rápido à passagem aberta, achando ainda ter sonhado, mas o pote de cerveja provava que o sonho era, na verdade, um mortal pesadelo.

D'Artagnan, como é de se imaginar, ouviu isso tudo com crescente interesse e, sem esperar que Grimaud terminasse, levantou-se com todo cuidado e se aproximou de Aramis, que dormia à sua esquerda. Tocando no ombro dele para evitar qualquer movimento brusco, ao mesmo tempo ele cochichou a seu ouvido:

— Amigo, acorde e não faça o menor barulho.

Repetiu essa frase apertando a sua mão, e Aramis entendeu.

— Athos está à sua esquerda, acorde-o da mesma maneira que o acordei.

Não foi difícil, pois o conde tinha o sono leve como em geral têm pessoas finas e sensíveis. Já com Porthos, a tarefa seria mais árdua. Ele imediatamente perguntaria as causas e motivos de interromperem o seu sono, ato de extrema deselegância, a seu ver. Por isso d'Artagnan apenas tapou a sua boca.

Depois disso, nosso gascão estendeu os braços chamando os companheiros para que se aproximassem, fechando num círculo as suas cabeças, de maneira que elas quase se tocavam.

— Amigos, temos que deixar imediatamente o barco ou morreremos todos.

— Como? De onde tirou isso?

— Sabe quem é o capitão do navio?

— Não.

— Groslow.

O ligeiro tremor que percorreu a roda mostrou a d'Artagnan que sua fala começava a causar efeito nos amigos.

— Groslow? Caramba! — reagiu Aramis.

— O que é Groslow? — perguntou Porthos. — Não me lembro mais.

— Aquele que quebrou a cabeça de Parry e agora quer fazer o mesmo com as nossas.

— Ah!

— E o imediato, sabem quem é?

— Imediato? Não há imediato numa faluca com tripulação de quatro homens — ponderou Athos.

— Pode ser, mas Groslow não é um capitão como outro qualquer e tem um imediato. Que é o sr. Mordaunt.

Dessa vez não foi um arrepio que percorreu os ouvintes, foi quase um grito. Aqueles homens invencíveis se viam sob uma influência misteriosa e fatal que esse simples nome conseguia causar, ficando aterrorizados só de ouvi-lo.

Vinte Anos Depois  (Alexandre Dumas) - Edição Comentada e IlustradaOnde histórias criam vida. Descubra agora