SOB O MESMO OLHAR

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- Heloísa, você pode passar na área central e avise que estes são veganos, principalmente para as mulheres.

Não gostei da ordem, mas confirmo com um aceno de cabeça.

Pego a bandeja arrumada com canapés e sigo para executar a tarefa, concentrada em não deixar vácuo no caminho. Já perdi a conta de quantas bandejas carreguei e ainda está na metade da comemoração do noivado da filha dos donos da mansão.

A festa está sendo realizada na área externa, portanto como em muitas outras em que trabalhei, não passo da cozinha, coisa que realmente não me incomoda.

Esta até que está agradável, música ao vivo, uma noite de outono e a maioria dos convidados são empresários do tipo que eu mais gosto: suas conversas é o que me interessa.

Não me esforço para prestar atenção nos diálogos delas: o sapato não combina ou fulano não vale o investimento ou a fulana é isso ou aquilo. Quando não estão falando de algum amante ou a bolsa da grife.

"Melhor não pensar em bolsa de grife."

Eu, preocupada em como ganhar dinheiro para pagar a faculdade, é esta bolsa que me interessa, mas apenas cinquenta por cento, tenho que fazer muito bico para não desistir do meu objetivo.

Prefiro servir as bebidas, é mais interessante ouvir as conversas dos homens, o nível dos assuntos é elevado.

E mais uma madame rejeita quando me aproximo com a bendita bandeja, olho discretamente para o que estou oferecendo, quando ouço uma voz máscula, impossível de ignorar.

- Por favor, você poderia me oferecer?

- Agora mesmo, senhor!

Respondo olhando para o dono da voz e de imediato estendo a bandeja em sua direção, o rosto quadrado, fico hipnotizada por sua boca grande, mastigando devagar o objeto estranho, não devem ser ruim, pois os seus olhos claros nem piscam, espero que mais alguém pegue e ele novamente se serve e agradece.

"Este homem é perfeito."

Continuo fazendo meu trabalho, circulando sem dificuldades entre os convidados.

No anúncio do noivado, fico parada aguardando novas ordens, em pé assisto a cena romântica e calorosa dos pais e noivos, olho para o lado e vejo o homem que pediu mais cedo os canapés, com as mãos nos bolsos da calça, sem expressar nenhuma emoção diferente dos outros convidados que sorriem.

Passa a mão nos cabelos, bagunçado pelo o vento, bate neles tentando fixá-lo , mas perde para o vento. O blazer feito sob medida para alguém rico como os outros homens da festa, porém ele na posição ereta, peitos estufados, emana uma áurea de poder,
só falta a capa para se assemelhar ao super-homem do cinema.

Algo o incomoda, arregaça as mangas, cruzando os braços em seguida e busca por alguém, olha para onde estou e em frações de segundos nossos olhos se encontram.

Sinto uma espécie de choque, uma corrente elétrica atravessa da cabeça aos meus pés. Sou flagrada fazendo algo errado e pecaminoso. O coração acelera.

- Isa, no final da festa preciso conversar com você - Nelson puxa meu braço de leve, forçando desviar minha atenção para ele. - Eu te levo em casa.

E sai sem esperar resposta, busco o homem perfeito que já está conversando com uma mulher igual aquelas de capa de revista, deve ser divertido, pois estão conversando tão próximo e ele vira a cabeça para trás se divertindo com o que ouviu.

Idiota! Xingo internamente. Olho para meus pés, os sapatos surrados e lembro quem sou, repito o insulto. Alguém põe uma nova bandeja em minha mãos e me manda circular.

Amor ValiosoOnde histórias criam vida. Descubra agora