NICK SENTIU-SE SEGURO na casa dos Spring, mesmo que Charlie não estivesse por lá — o que lamentou bastante.
Parecia viciado pelo prazer que preenchia o seu corpo todas as vezes em que o amigo estava por perto. Agora, explorando cada detalhe do quarto de Charlie, batucando de leve a bateria do garoto e notando os diversos pares de Converse colorido que mantinha guardado no armário, estava na companhia apenas da irmã mais velha de Charlie, Victoria.
Seu nome é Victoria Spring, mas todos a conhecem como apenas Tori. Ela tem dezesseis anos de idade, está sempre ouvindo música com seus fones de ouvido e, se você der sorte, consegue vê-la pela casa carregando um copo cheio de chá; durante a manhã, Nick teve a oportunidade de experimentar o seu famoso milkshake de Oreo e baunilha.
A música que tocava agora em seus fones de ouvido era Apocalypse, Nick conseguiu ouvir, de Cigarettes After Sex. A cozinha silenciosa. Apenas o som da música abafada e o líquido cremoso sendo despejado em um longo copo de vidro; não durou muito até o garoto quebrar o silêncio com um sorriso, ele apreciava o que Tori estava fazendo por ele, sem mesmo questionar.
— Qual o lance entre você e o meu irmão? — ela perguntou, despejando um último gole de milkshake no copo favorito de Charlie, um com dois dinossauros laranjas com a frase "Queer Was Always Here" — São amigos?
— É, sim. Somos amigos.
— Uhum — concordou Tori — E os seus amigos, ainda estão pegando no pé do meu irmão?
Nick enrijeceu, nervoso: — Eles... Eles não vão chegar perto do Charlie, eu prometo. E não sei se quero ser amigo de pessoas que zoam as outras.
Os dois tomaram um gole do milkshake em sinal de concordância. Tori estudava Nick de maneira ávida, tomando até a última gota de milkshake do seu copo, quase como se lesse Oscar Wilde.
— O que faz aqui? — perguntou, enfim — Tudo bem se não quiser me contar — ela passa os dedos entre os seus cabelos, balançando levemente a cabeleira escura para o lado, até uma mexa cair por cima do olho esquerdo.
— Eu... Ér... — Nick largou o copo no balcão, sentindo-se pressionado. Havia desviado o olhar de Tori umas dez vezes e agora apertava levemente o copo, com receio de quebrá-lo. Tori observou seus movimentos — Eu...
O garoto quase pediu para que a garota não fizesse aquilo, de estudar tudo o que ele dizia ou fazia, em um grito enraivecido. Mas Nick manteve o controle: — Eu queria matar aula. Charlie disse que eu poderia ficar aqui. E você?
— Ah — Tori deu de ombros — Quase incendiei a minha escola. Acontece... Bem, divirta-se. Se precisar, estarei no meu quarto.
Tori despejou a louça suja — Nick agora entregava o seu copo e agradecia pela bebida — na máquina e subiu as escadas, despreocupada. Nick era péssimo em mentir, porque odiava mentir, porém Tori não fez questão de saber toda a verdade.
Parte dele havia gostado de mentir. Uma nova parte dele...
Toda aquela ansiedade estressou Nick; suas mãos estavam suando, a nuca dolorida e a testa quase explodindo. Tudo ao redor começa a girar e o garoto perde o controle, derrubando o celular no chão. A tela racha, bem no canto.
O chão transforma-se em gelatina. Suas pernas são como concreto.
Nick corre para o quarto de Charlie, cambaleando. Como queria que o amigo estivesse aqui... mas agradeceu por não estar. Assim, não veria Nick daquele jeito.
— Ai, que droga — praguejou. Precisava recuperar o fôlego. Tentou inspirar e expirar diversas vezes, mas não obteve sucesso. Lembrar de Charlie o deixava assim.
Sem pensar duas vezes, correu para o banheiro mais próximo e trancou-se lá dentro, no escuro.
Trancou-se e, por um bom tempo, suspendeu a cabeça e respirou, as mãos ainda na maçaneta, procurando por oxigênio — todo o oxigênio disponível, pois os pulmões pediam, gritavam por isso. O coração acelerava cada vez mais. Nick começou a suar mais e mais, o rosto pegava fogo. Completamente preenchido... por raiva.
— Ninguém vai tocar nele — repetia para si mesmo — A irmã dele não te odeia! Não te odeia!
Quando Nick teve a ideia de lavar o rosto, quando a água tocou a palma da sua mão e levou o líquido fresco até os seus olhos, foi quando enxergou algo brilhar: os seus olhos brilhavam no escuro, e o que o espelho refletia não era o seu rosto.
Era o rosto de uma criatura obscura e feroz. Algo pinicava na sua pele: pelos. Sentia também uma dor terrível na arcada dentária.
— Tori...
Era um lobo.
— Tori... — cerrou os olhos o mais forte que conseguiu. Não podia se transformar ali.
— Tori... TORI! TORI!
Imagens na sua cabeça tornaram a assombrá-lo: o lobo o atacando no campo; o dia seguinte, onde sentiu febre e imensas dores no corpo, no local da ferida; depois disso, as visões embaçadas, os sentidos aguçados, os garotos do time de Rúgbi comemorando os seus mais novos movimentos ágeis.
Uma dor na cintura, bem onde está a ferida.
— Nick? — uma voz feminina do lado de fora do banheiro, inocente — Tudo bem aí? Está tudo bem aí?
A porta permaneceu trancada.
Debaixo das roupas, Nick percebera, não havia ferimento algum. Estava tudo bem. A mordida desaparecera.
O seu rosto, por outro lado, demorou um pouco até voltar ao normal. O garoto destranca a porta.
— Tori, me desculpa... — disse ele, cabisbaixo — Mas... mas você sabe me dizer... Sabe me dizer se a próxima lua cheia está próxima? — perguntou, sem esconder a sua preocupação. E assim, Tori Spring semicerrou os olhos e guiou Nick até o seu quarto.
E elanão fez mais perguntas ao garoto. Ficaria ao seu lado até ele decidir estarpronto para lhe contar que era um lobisomem.
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Unstoppable: A "Heartstopper" Tale
FanfictionCharles Spring e Nicholas Nelson estão na mesma escola, mas nunca se conheceram... até ao dia em que são obrigados a sentar-se lado a lado. Eles rapidamente se tornam amigos, e Charlie começa a apaixonar-se por Nick, embora ache que não tenha qualqu...