2. Desacordado

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CHARLIE SPRING NUNCA MAIS FOI O MESMO DE ANTES depois daquela visita no meio do mato com Aled. Agora, pedalando na direção da casa de Tao, Charlie podia sentir uma energia ao seu redor; era algo puramente mágico. Sentia-se guiado pelo magnetismo, e determinado a encontrar os seus amigos.

     — Como se sente? — Perguntou Aled.

     Chegando na casa de Tao, os meninos tiveram que tomar medidas drásticas para não acordar a sua mãe, ou assustar Tao. O que, convenhamos, não era uma tarefa fácil, pois o garoto se assustava facilmente.

     Batendo na janela do seu quarto, Charlie acena com a mínima movimentação do lado de dentro da casa: — Tao, sou eu! Tao!

     Antes de abrir a janela, os meninos ouviram Tao tropeçar em alguma coisa. Cambaleando, ele esticou os braços magros e liberou a passagem.

     — O que diabos vocês estão fazendo aqui?! E muito obrigado por sumir a tarde inteira, Charlie! — Ralhou o amigo, furioso. Mas Charlie não dera ouvidos. Correu para um abraço apertado. Tao o abraçou, fortemente. Havia muito o que conversar.

     Nenhum dos amigos se sentia o mesmo de uns tempos pra cá. E tudo começou com a mordida de Nick. Tao irritou-se com as mudanças repentinas, mas ouviu o que Aled e Charlie tinham para lhe contar sobre a árvore que protegiam; não foi muito difícil convencê-lo.

     — Eu andei pesquisando sobre essas coisas — Comentou, sentando no chão de seu quarto — Lobisomens, tramazeira (aqui Aled fez menção das especiarias que utiliza para proteger a sua casa de criaturas), tudo o que precisamos fazer...

     — Só me diga que o Nick não precisa matar alguém... — Implorou Charlie.

     — Na verdade, não. A menos que ele tivesse um elo muito forte com o alfa, o que não é o caso, eu acho. Podemos acabar com ele.

     — O Nick está sob influência dele, o Ben também. E não sabemos quem mais foi mordido.

     — Mas temos de matá-lo! E logo! — Tao teve de controlar o seu tom de voz para não acordar a casa inteira. Parecia estressado, notou Charlie. Não devia ter notícias de Elle, de certeza.

     — Ele... ele quer uma matilha, Tao — Disse Charlie — E está usando o Nick, o Ben... Ele quer a nós. Está mais pra uma vingança. Algo pessoal, por termos nos metido no caminho dele.

     — Espera, espera... Você deduziu isso com o seu novo... poder...?

     Charlie assentiu, acreditando fielmente que sua capacidade de ver e sentir coisas viera da árvore antiga. Não podia ser outra coisa. Mas viajar entre realidades já era algo que nem Aled consegue fazer; o garoto decidiu não falar sobre aquilo, pelo menos não no momento. O seu foco era outro agora.

     Os meninos reuniram-se no chão do quarto de Tao, onde Aled prendera uma faixa sobre os olhos de Charlie. A conexão de Charlie com o outro mundo estava mais forte e aguçada do que nunca. Agora, precisavam sintonizar com o alvo.

     Tao não se sentiu muito confortável com a força que Aled exerceu na última volta do laço, a faixa parecia apertada:

     — Não precisa fazer isso se não quiser, Charlie — Disse, segurando o seu ombro. O amigo virou o rosto levemente em sua direção, sorrindo.

     Tao amava Charlie, e o protegeria de tudo e todos se pudesse.

     E isso tornava a amizade deles um elo muito forte.

     — Não dói. É um pouco incômodo, mas vou ficar bem — Assegurou Charlie, segurando na sua mão — Se precisar me trazer de volta, é só segurar a minha mão. É como... sonhar acordado.

     Os dois sorriram.

     — Em pensar que nós reclamávamos das nossas vidinhas — Brincou Tao. Charlie fechou os olhos, respirando fundo.

     Gostaria de encontrar todos os seus amigos ao mesmo tempo, mas teria que trilhar um caminho que o ajudaria a protegê-los. Primeiro, pensou em Isaac.

     Quando fechava os olhos, ficava mais fácil de entender as sensações ao seu redor. Charlie chegou a pensar que havia se transformado numa bateria humana, cheio de energia sobrenatural.

     — Estou vendo... estou vendo o Isaac — Disse, distante — E... ele está bem, eu acho. Nick! Estou vendo o Nick. Encontrei ele!

     — Que fantástico — Disse Aled, entusiasmado.

     As vozes de Tao e Aled foram ficando cada vez mais distantes, como se entrassem num corredor paralelo ao de Charlie. Agora, soavam como vozes na parede. Charlie sentiu-se solitário e com frio, muito frio.

     Conseguia enxergar Isaac e Nick, sentados no sofá da casa dos Henderson agora mesmo, mas havia mais alguém ali. Uma presença aterrorizante. Pensamentos invasivos.

     Morte.

     Morte.

     Morte.

     — Pessoal, pessoal... Me tirem daqui! Me tirem daqui! — Exclamou Charlie.

     Do outro lado, Tao e Aled tentavam reanimar Charlie, balançando-o rapidamente. Tao começava a chorar, pois Charlie não respirava e estava basicamente hipotérmico.

     — Vamos, vamos! VAMOS, CHARLIE, OS MEUS PAIS NÃO PODEM ACORDAR! — Implorou o amigo.

     Aled arregalou os olhos quando viu algo acender no quarto de Tao: — Tao, olha! OLHA!

     Ele apontava para o rádio de Tao, debruçado sobre a sua mesa de canto. Alguém falava, e esse alguém era Tara.

     — Tara Jones?

     "Esse é o show de Tara & Darcy!" ouviram o rádio dizer, com um chiado enorme.

     — Tao, faça Charlie acordar, o nariz dele... — Aled tocou o rosto do amigo, virando o seu rosto. O nariz sangrava.

     Tao não podia deixar algo acontecer com o amigo. Virou-se para ele e o estapeou, fechando os olhos. O rádio parou de falar. Charlie havia acordado, buscando ar para os seus pulmões desesperados.

     — Puta merda — Disseram os três em uníssono.

     Os três se entreolharam.

     — Achei, Tao, eu os achei — Disse Charlie, respirando ofegante. Aled o abraçou.

     — Quem?

     — Todos. Todos eles — Disse Charlie, sorrindo.

Unstoppable: A "Heartstopper" TaleOnde histórias criam vida. Descubra agora