7. Companhia

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CHARLIE NÃO CONSEGUIU MANTER O SORRISO no treino por muito tempo.

     Ele sentia falta do seu novo amigo na escola; depois de tantos momentos que passaram juntos, como quando jogaram Mario Kart pela primeira vez no sofá de Charlie, ou quando brincaram na neve juntos, o garoto não conseguia fingir que tudo estava bem — porque não estava. Independentemente do que estivesse acontecendo com o Nick, ele faria de tudo para ajudá-lo. E ficar triste pela situação não ajudaria de jeito algum.

     No momento, Charlie precisava dar cobertura ao Nick.

     Tao e Isaac repararam no sorriso meio amargo de Charlie, um sorriso que deixa um gosto amargo insuportável na boca por ser tão falso, quase sentindo o gosto estranho em suas próprias bocas, que era como o garoto se sentia; odiava ter que fingir que não se incomodava com os comentários inúteis dos garotos do time (Harry Greene teve a audácia de comentar sobre o seu aniversário que seria comemorado no feriado, logo depois de notarem o sumiço de Nick e Ben, e depois de comentarem sobre alguns moradores da vizinhança terem avistado um lobo rondando por ali). Ninguém se importava.

     Os meninos até erguiam a mão da arquibancada para animá-lo, aplaudiam ou gritavam seu nome durante o treino (eram os únicos assistindo ao treino), mas a única coisa que o salvava ali é que o seu recorde na corrida permanecia invicto e nenhum daqueles palermas o alcançaria. Sai, Otis e Christian perguntaram aos garotos do time se haviam visto Nick, ou Ben, que sumiu o dia todo, antes que alguém ligasse para os seus pais. Foi quando Charlie parou de fingir e decidiu fugir daquela aula de educação física inútil para encontrá-lo.

     Tao e Isaac o acompanharam; Tao havia enviado uma mensagem para Elle: "Explico tudo mais tarde."

     Chegando em sua casa, com receio de encontrar algo que não era o seu amigo, avistou Tori sentada nos degraus da varanda, com uma xícara de chá quente nas mãos, assoprando a fumaça ainda densa. Ela disse "ele está bem", depois calou-se; cumprimentou gentilmente os amigos de Charlie, mas não os acompanhou.

     Nick estava no quarto, jogando Mario Kart, assim como na primeira vez que viera no quarto de Charlie.

     — O que é isso no seu rosto? — perguntou Isaac por primeiro. Ele apontava para um extenso arranhão próximo ao olho esquerdo de Nick.

     — Podem — começou o garoto — Podem nos dar licença? Por favor — Charlie insistiu — Desculpa...

     Tao assentiu, hesitante.

     — Isso — ele apontou para Nick — Isso é loucura num nível "Stephen King". Ou "Wes Craven".

     Nicholas assentiu, tristonho. Tao aproximou-se dele e o confortou, dando uns tapinhas no seu ombro: — Mas vamos ajudá-lo. Só não devore o nosso amigo, por favor.

     — É. Se fizer isso, o funeral será seu — advertiu Isaac. Eles riram, mesmo que por dois segundos. A porta do quarto não demorou a bater, deixando os dois garotos sozinhos. Eles se abraçaram, imediatamente.

     Charlie sentiu um peso enorme sair dos seus ombros.

     — O que houve? — perguntou, depois de um bom tempo abraçado com Nick, tocando o seu rosto. Charlie não se importava mais com o seu antigo receio de tocar Nick.

     — Garras — ele ergueu as mãos, onde a ponta dos seus dedos estavam ensanguentadas; o sangue havia secado.

     — Oh, Nick... Sinto muito... Nós não descobrimos nada sobre o Ben. Ele fugiu o dia inteiro.

     — Sem problemas. A sua irmã me ajudou bastante hoje. Na verdade, estou preocupado com outras coisas no momento. Você sabia que, daqui alguns dias, é lua cheia? E Saint George's Day. Vai ser a...

     — Comemoração do aniversário do Harry Greene. Estás convidado, de certeza. Terá uma festividade e...

     Nick assente, desanimado.

     — Está ficando mais difícil de controlar. E se... e se eu fugir? Ferir alguém? Você não pode estar perto de mim, ou os seus amigos — ele afasta as mãos de Charlie suavemente do seu rosto — Não posso correr esse risco. Preciso me isolar.

     — Não! — exclamou Charlie — Nem pensar. Nós vamos ajudar você com a sua primeira lua cheia. Isso é um fato!

     Não restou muito o que dizer. Charlie sabia que não seria uma tarefa fácil, mas tentaria assim mesmo. Ficou ali, aproveitando a companhia do amigo, por mais tensa que fosse a situação.

     — Podemos jogar um pouco. Não é como se eu fosse ganhar de você, mas passei o dia treinando! — disse Nick. Ele estava tão confiante.

     — Primeiro temos que ligar para a sua mãe, está certo? Ela merece saber que você não foi para a aula hoje, e não é pela escola. Tem de ser você, Nick.

     — Sempre certo, Charles Spring — concordou o Nick.

Unstoppable: A "Heartstopper" TaleOnde histórias criam vida. Descubra agora