7. Proposta

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O DAVID NELSON TRABALHAVA AJUDANDO com serviços comunitários na universidade.

     É de se causar uma certa estranheza, visto que David nunca foi uma pessoa de causas muito nobres, tampouco de importar-se com os outros, mas talvez os seus motivos não fossem mesmo os esperados de alguém que se propõe a essa tarefa; talvez fosse para conquistar alguma garota, e destruir o seu coração nas semanas seguintes, como sempre fazia.

     Seu irmão mais novo, Nick, desprezava-o.

     A sua relação com a sua mãe Sarah também não era a das melhores; a sua relação com o pai era quase inexistente, um dos motivos pelos quais Nick culpava o pai por David ser um inconsequente.

     Na universidade, David não precisava fingir, nem tentava, ser uma boa pessoa.

     Certa noite, ele vinha caminhando de um dos dormitórios do campus até o seu, provavelmente escondido, quando avistou uma pessoa cambalear por ali, gemendo. O rapaz não poderia se importar menos. Passou reto e, mais tarde, já na cama, enfiou o rosto no travesseiro e dormiu; a manhã seguinte seria um novo dia de conquistas. Naquela altura já havia perdido a conta de quantas festas havia participado, de quantas aulas, quantos encontros e quantas fugas do seu dormitório havia realizado. Estava na mira da direção, portanto precisava daqueles malditos trabalhos que lhe ofereciam créditos morais.

     O dia seguinte fora exaustivo. Não houve fuga. Mas a mesma pessoa da noite anterior rondava o campus. David fez menção de averiguar a situação, ou chamar a segurança do campus, mas não o fez. Ignorou a situação por completo novamente.

     Mais tarde, no dormitório, ligou para Nick. Este não o atendeu.

     Decidiu então ligar para a mãe, que estava de prontidão: — Então você vem para casa, filho?

     Discutiram sobre a semana de folga da universidade, mas David não fez questão de voltar para casa. Poderia transar bastante se ficasse por ali, o que não seria negativo, caso não estivesse procurando por sossego.

     — Ainda não decidi.

     — Ah. Tudo bem, filho.

     — E o meu irmão?

     — Está aqui, quer que eu...

     — Não! — David levanta da cama — Quer dizer, não quero incomodar.

     — Oh, não seja tolo. Ele está brinc... Nick, é o seu irmão...!

     — Mãe, depois falamos. Está bem? Beijos.

     E encerrou a ligação.

     Não queria saber do irmão, nem do pai, nem de pessoa alguma. Estava exausto.

     David Nelson despedia-se de mais uma semana fazendo o que mais detestava: apenas sendo ele mesmo.

     Seus dias eram vazios. E, internamente, sentia falta do pai.

     Numa ligação, deixou um recado:

     — Oi, pai... Então, ér... Então, semana que vem é o meu aniversário... Queria saber se eu posso — David corrigiu o tom de voz — Gostaria de ir à Paris. Quem sabe eu não o encontro, para conversar. É isso. Tchau!

     Em seu ponto de vista, a garota com quem andava se encontrando às escondidas na madrugada era aceitável. No seu mundinho, nada poderia preencher o vazio em seu peito, exceto ele mesmo. Portanto, fazia coisas que julgava serem úteis.

     Mais próximo do seu aniversário, aproveitou o máximo de convites que recebera e saiu com os amigos. Bebia a noite toda, terminava beijando quantas garotas quisesse, e sempre encontrava com a mesma pessoa no caminho para o dormitório.

     Um velhote.

     Odiava aquele velhote. Odiava a sensação de assisti-lo sempre por ali. E odiava os pensamentos que invadiam a sua mente:

     — Eu nunca permitirei que isso aconteça comigo — Resmungava, bêbado.

     Certo dia, quando retornava do serviço, lembrou-se do velhote que vivia pelo campus; como a segurança não o expulsava era um mistério, estava sempre sob as sombras.

     Lá estava ele, de cabeça baixa, os olhos fechados, e a boca fazendo um movimento estranho; estava cantarolando sob a luz da lua cheia. David se aproximou, bem devagar.

     — O que você tá fazendo aqui? — Perguntou.

     — Demoraste — Respondeu.

     — Não costumo conversar com moradores de rua.

     — Não costumo conversar com pessoas.

     David ri: — O senhor é engraçado.

     O velhote deu de ombros.

     — Não sou como as outras pessoas. Elas estão sempre preocupadas com outros assuntos que... acabam esquecendo algumas peculiaridades da nossa realidade, não acha? As pessoas que cercam você, principalmente.

     O rapaz não ligava muito para aquela conversinha de hipster, portanto limitou-se a concordar.

     — As outras pessoas não entendem, pois não?

     — Diga-me, rapaz, do fundo do seu coração... O que é que você deseja?

     — E o senhor tem algo a oferecer? É um sem-teto.

     — Tenho uma proposta — Sorriu o velhote. E quando David notou o seu sorriso já era tarde demais. O rosto do velhote escureceu imediatamente.

     A sua pele enrijeceu e os seus olhos tornaram-se vermelho vivo.

     — Posso torná-lo poderoso.

     O velhote transformou-se num lobisomem. E o resto... Então, alerta de spoiler: David fora mordido.

     — Você será sangue do meu sangue. Caminhará nas trevas comigo. Você tem nada a perder. Será o meu descendente — Ouviu uma voz sombria dizer, antes de apagar ali mesmo.

Unstoppable: A "Heartstopper" TaleOnde histórias criam vida. Descubra agora