3. Oculto

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— CHARLIE — ecoava uma voz dentro da cabeça de Charlie, bem distante — Charlie, onde estás?

     Ao abrir os olhos, Charlie flutuava no infinito. Estava escuro. Seus braços flutuavam e o corpo parecia preso por fios invisíveis, quase a mesma sensação de estar boiando no mar. Começou a se desesperar imediatamente, e os gemidos ecoavam solitários na escuridão. Sentiu um arrepio, uma sensação ruim no estômago, como se sentisse vontade de vomitar.

     — Charlie! Charlie! — alguém chamava. O garoto desejou que fosse Nick, quem o salvaria daquele pesadelo.

     Onde ele estava? O que aconteceu? Estava morto...?

     De repente, Charlie decidiu fechar os olhos. Continuou flutuando num infinito absurdo, mas conseguiu enxergar algo: encontrava-se numa espécie de cinema.

     Decidiu então permanecer "de olhos fechados". As imagens que visualizava eram em primeira pessoa, como se presenciasse o ocorrido. Uma variedade de flashes invadiram a mente do garoto.

     Primeiro, viu-se ao lado de Aled Last, caindo no chão ao lado das raízes de uma árvore. Depois disso, viu duas mãos plantarem uma semente ao lado do lugar onde caíra; presenciou o nascimento daquela árvore enorme, a que trouxe a misticidade à sua cidade.

     Em seguida, testemunhou guerras. Pessoas lutando. Homens. Viu sangue, ouviu o clangor das espadas, dor e sofrimento. Tudo o que conseguia pensar era em dor e sofrimento. Passados alguns minutos, queria abrir os olhos... Mas algo o deteve. Uma voz:

     — Charlie! Respira! Você vai ficar bem! Por favor, respira! — era Aled, tentando acordá-lo.

     "Aled!" pensou, "Tire-me daqui!".

     Sua boca não conseguiu reproduzir um único som. Sentiu-se enfurecido.

     Antes de começar a xingar tudo e todos, Charlie viu luz. Uma luz angelical cobriu a árvore com graça e esperança; sentiu-se protegido agora que via o último lugar que estivera acordado... Estava quase lá, só precisava desejar sair dali com mais força.

     "Eu não quero morrer" pensou novamente, "Eu quero continuar!".

     A imagem da árvore foi ficando cada vez mais perto, e mais perto, tão perto que Charlie teve a sensação de ter os membros gravados na madeira. Começou a se desesperar.

     "Eu quero lutar! Eu vou lutar! Não! NÃO! PROMETO QUE NÃO LHE FAREI MAL!" gritou, mentalmente. O rosto ficou quente.

     A árvore interrompeu o processo de digestão. Charlie sentia o pé preso no tronco daquela árvore, ainda muito assustado. Então, como um sussurro, alguém profere algumas palavras numa língua desconhecida no ouvido de Charlie. meb avariehc oãn asioc amuglA.

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     "Para de mexer com a minha cabeça!" continuou gritando.

     Por último, a árvore mostrou-lhe: Ben sendo mordido, sendo obrigado à caçar, matando animais inocentes, enganando Nick no vestiário...

     "Para! PARA! PARA COM ISSO!"

     A árvore mostrou Nick se transformando, fugindo de casa escondido da mãe, fugindo escondido de Charlie... Ele andou fugindo sem que todos soubessem... E esteve com o alfa... E espiou os caçadores... E espiou os pais de Elle... E Ben...

     Na verdade, Charlie teve a ligeira impressão de que estavam espiando Elle e Ben agora mesmo. Ben, que está todo machucado, que traíra o alfa na noite de Saint George's Day, conversava com Elle sobre Charlie...

     Antes de acordar, Charlie ouviu em inglês: — Proteja. Vida. Oculto.

     — Charlie! Oh, céus! Você acordou! — gritou Aled, abraçando-o. De repente, os dois garotos se separaram.

     Aled fitou Charlie, apavorado.

     — Você não é o Charlie — disse, desconfiado.

     — Sim, sou! — falou o garoto, desajustado — Estou sem forças para comemorar... Poderia... Poderia, por favor... Aled, acho que vou desmaiar... Elle... Perigo...

     Charlie desmaiou novamente. Desta vez, sentiu a cabeça atingir o solo. Seus membros permaneceram caídos. Não houveram visões, apenas exaustão. A árvore queria que Charlie se unisse à ela, mas o garoto decidiu que queria lutar... Lutar pelos amigos, por Nick, e por todos.

     "Proteja. Vida. Oculto".

     — Você vai ficar bem, você vai ficar bem — ouviu Aled dizer, tentando de todas as formas levantá-lo, sem sucesso — Vamos todos ficar bem.

     — Eles vão atacar... Eles vão atacar hoje... É uma armadilha... O alfa vai matá-los — foi a última coisa que Charlie disse, ainda inconsciente.

Unstoppable: A "Heartstopper" TaleOnde histórias criam vida. Descubra agora