GILBERT
Cinco meses. Gilbert marcou na folha do calendário o tempo de gravidez de Anne. A barriga dela tinha crescido pelo menos dois centímetros nas últimas duas semanas, e já dava para notar o seu formato cada vez mais arredondados.
Era uma pena que ela não pudesse perceber, sua filhinha crescendo dentro dela, e desafiando qualquer improbabilidade, sua pequena borboleta se desenvolvia cada vez mais saudável no ventre de sua mãe.
Ele mesmo lhe dera esse apelido, levado pelo desejo de que Anne se sentisse familiarizada com algo que sempre amara. Ela lhe dizia que as borboletas lhe davam uma sensação de liberdade que nunca conhecera, vivendo amarrada às lembranças triste de sua vida, ao pesadelo que fora Roy Gardner, ao medo de que sua sanidade mental nunca mais fosse a mesma, de que perdesse completamente sua identidade, e se tornasse um daqueles fantasmas humanos com os quais frequentemente trombava nos corredores da clínica.
Por isso, Gilbert gostava de imaginar, que sua garotinha seria livre, que carregaria na alma o dom artístico da mãe, a bondade no trato com as pessoas, a alegria que Anne muito pouco pudera sentir, porque ela se deparara com a crueldade da vida muito cedo. Assim, não pudera pensar em um apelido mais original que aquele, já que o nome da sua filha, ele ainda não escolhera, pois não queria fazer aquilo sem Anne, e esperava que ela conseguisse melhorar antes do bebê nascer.
Charlie não lhe dera muitas esperanças quanto a isso, e em sua última sessão com Anne, o rapaz chamara Gilbert para conversar:
-Eu sinto muito, Gil. Mas creio que não tenho boas notícias. - Gilbert sentira o frio no estômago que o acompanhava todo o tempo agora, e perguntou com as mãos cruzadas por medo que tremessem, e evidenciassem cono ele estava se sentindo por dentro.
-O que está dizendo exatamente, Charlie?
-Eu não preciso te explicar algo que sabe melhor do que eu. Anne viveu inúmeros traumas por toda vida, e por causa de um deles quase aconteceu o pior. O que a atingiu no último mês foi pesado, ou então ela não estaria nesse estado quase vegetativo. Eu sei o que espera que eu te diga, mas não acho que ela conseguirá sair de novo dessa capa de proteção a qual vestiu para que ninguém mais se aproxime. - Gilbert olhou para Anne que estava sentada a poucos metros dele, olhando para o nada e respondeu:
-Eu não acredito nisso. Ela vai melhorar, Charlie, eu sinto.- Gilbert não sabia explicar porque aquela certeza não o abandonava, mas em seu coração ele sentia que a alma dela ainda estava ali, e precisava apenas de tempo para se libertar da prisão de sua mente.
-Eu acho incrível que você consiga acreditar nisso, mas como um homem da ciência assim como você é, os milagres que esperamos nem sempre acontecem. Eu torno a te dizer que você precisa estar preparado, Gilbert. Não quero acabar com sua fé, mas meu amigo, quantas pessoas você tratou nessa vida, que passaram por um processo assim? No caso de Anne, ela passou pela mesma coisa duas vezes. Acho quase impossível que nossa realidade a atinja de novo. Se eu fosse você, me preocuparia com o nascimento de sua filha.
Gilbert se calara e não quisera discutir com Charlie aquele assunto. Eles tinham opiniões diferentes, e contestar o que o amigo lhe dissera baseado nos seus sentimentos era perda de tempo. Assim, guardou apenas para si suas esperanças pessoais, pois elas eram as únicas coisas que o mantinham firme em suas convicções.
De certa forma, Gilbert estava satisfeito consigo mesmo, pois ninguém acreditava que ele conseguiria cuidar de Anne, e ainda assim manter-se ativo em sua profissão. A própria clínica lhe dera condições para isso, e estava imensamente agradecido. Ele não precisava ir até lá diariamente, apenas uma vez na semana era suficiente para que ele atendesse aos pacientes mais complicados. O resto do trabalho administrativo poderia ser feito de casa, assim, ele se afastava minimamente de Anne e poderia estar por perto todos os momentos, dando-lhe toda a assistência física e emocional necessária.
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Broken Hearts- Anne with an e
FanficUm coração partido o outro magoado seriam capazes de se curar? Gilbert Blythe, um prodígio na área de Psiquiatria volta ao Canadá depois de anos vivendo na Inglaterra onde se formou e trabalhou em sua área em um grande hospital em Londres. Após perd...