Capítulo 2- Mágoa

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Olá. Aqui está o segundo capítulo . Por favor comentem para eu saber o que estão achando.

ANNE

— Ratinha Branca. Ruiva azeda. Cenourinha.

Anne ainda podia se lembrar de cada apelido maldoso que ganhara em sua infância, e embora fingisse ignorá-los, lá, no fundo, doía ser tratada como se não valesse nada para ninguém, como se fosse um objeto que devia ser desprezado e mantido longe da vista de todos.

Antes da morte de seus pais em um trágico acidente de carro, sua vida tinha sido relativamente boa. Ela vivia em uma casa grande com empregados, uma babá somente sua e um quarto cheio de brinquedos no qual se divertia horas a fio sem se cansar. A mãe era professora,e exercia a profissão por amor, enquanto o pai, um advogado de sucesso, vivia para a família e para o trabalho, ou assim todos que o conheciam pensavam.

Por isso, foi uma surpresa que, após o acidente em uma noite chuvosa de inverno, todos os bens da família fossem confiscados para pagar dívidas de jogo que o pai contraíra ao longo dos anos em suas noitadas pelos cassinos da velha Escócia.

Como Anne não tinha parentes próximos, acabou sendo levada a um orfanato, onde amargou um ano inteiro de sua infância, até que seus tios Matthew e Marilla Cuthbert viessem salvá-la de sua sina de órfã sem eira nem beira, que acabaria como tantas outras crianças, se não fosse pela bondade deles em levá-la para viver no Canadá.

Mas, até que esse milagre acontecesse, ela tivera que se adaptar a um ambiente hostil, onde a compaixão humana era o último item da lista. Durante seu tempo no orfanato, Anne descobriu o que era violência física. Seus colegas de abandono e os responsáveis por aquele ambiente, não se importavam nem um pouco em descarregarem sua ira em cima da garotinha frágil, que até então, só havia conhecido bondade e gentileza.

Ela aprendeu o que era sentir frio quando . nas noites rigorosas de inverno, somente havia uma manta fina sobre sua cama, e compreendeu o que era fome quando, sentia seu estômago doer por uma noite inteira enquanto sua única refeição fora um pedaço de pão seco do dia anterior.

E assim, aliado a todos os maus tratos aos quais tinha sido submetida, Anne também compreendeu o que era ser órfã em um mundo onde ninguém se importava com sua dor. Desta forma, construiu dentro de si mesma um mundo do qual ninguém mais tinha acesso, a não ser ela mesma. Um lugar onde sua imaginação, estimulada pelo seu sofrimento, a levava para um ambiente fantástico, onde ela fingia ser uma borboleta e, assim, podia escapar de seu enclausuramento e voar para onde quisesse.

Tal criatividade a salvou de sua tristeza, mas contribuiu imensamente para que ela se tornasse uma garotinha arredia e fechada. Ela quase não falava, por medo de ser repreendida e, consequentemente, agressões físicas se seguiriam como castigo por seu atrevimento em se manifestar quando não era solicitada. Também aprendeu a chorar calada longe de qualquer testemunha.

Quando os irmãos Cuthberts finalmente a tiraram de lá, ela os seguiu sem pesar algum pois não deixara nada de valor para trás, a não ser raiva e solidão. O primeiro ano em Green Gables foi uma verdadeira prova de fogo, tanto para ela quanto para seus tios , que a adotaram legalmente como membro de sua família.

Marilla a assustava imensamente, por sua austeridade, e Anne tremia cada vez que ela lhe dirigia a palavra, Por isso, assim como agira no orfanato, a menina preferia manter-se calada, por medo que fosse cruelmente espancada se dissesse algo inconveniente.

Com Matthew, a história era outra, pois sua fala mansa tinha o poder de acalmá-la, assim como sua natureza naturalmente calada, que era completamente compatível com a de Anne. Por este pequeno detalhe, eles se entendiam apenas pelo olhar, sem necessidade nenhuma de palavra, o que para a menina era um alívio, já que detestava usar sua voz para o que quer que fosse.

Broken Hearts-  Anne with an eOnde histórias criam vida. Descubra agora