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QUANDO TINHA DOZE ANOS, pouco antes de uma família britânica se mudar para a casa ao lado, Alisson descobriu sua paixão pelo skate

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QUANDO TINHA DOZE ANOS, pouco antes de uma família britânica se mudar para a casa ao lado, Alisson descobriu sua paixão pelo skate.

Fora um presente de Natal da mulher simpática que morava na mesma rua, Ângela Maurici. Ela a fez prometer que se esforçaria nos estudos e usaria aquela prancha com rodinha apenas quando precisasse de um tempo só. Quando precisasse sumir.

Alisson, ainda nova, precisou bastante.

A ferida da partida abrupta de sua mãe ainda estava aberta, não nela, mas em Elroy. Ele continuava amargurado mesmo depois de meses, impaciente e irritadiço e sempre chegava tarde em casa com odor de álcool e outras mulheres. Era quando Alisson precisava sair do caminho, ou a locomotiva de emoções desgovernadas do homem a acertaria em cheio.

A pista de skate de Felicity era mais frequentada no período da tarde, ou seja, quando o céu se tornava um manto de estrelas o local estava deserto e perfeito. Alisson deslizava pelo concreto liso, tentava algumas manobras que o YouTube ensinara, reunia alguns machucados e hematomas mas, no final da noite, não gostaria de ir embora do santuário imperturbável de paz.

Não tão imperturbável, talvez.

Em uma noite qualquer, ela se viu acompanhada na pista. Uma garotinha com cabelos castanhos curtos estava deitada em um dos bancos, os olhos tão profundos quanto piche presos no céu, nublados e avermelhados. Pelas fungadas e espamos de seus ombros, Alisson notou que ela estava chorando.

Deveria se revelar? Provavelmente não. Pessoas tinham problemas, alguns fáceis e outros difíceis. Lidar sozinho com eles era um passo importante para a maturidade, seu pai dissera.

— Ei, tá tudo bem?

Então por que ela se aproximou?

A garotinha não se assustou com a presença repentina, apenas respirou fundo mais uma vez e se sentou, abraçando os joelhos em busca de conforto. Estava arrasada, não que fosse da conta de Alisson. Mas simplesmente não conseguia desligar aquele altruísmo bobo.

— Meus pais... — a menina murmurou com a voz chorosa e dobrada em um sotaque forte. Felicity era famosa por acolher famílias de fora, uma mistura incessante de dialetos — Eles vão se separar.

Outra leva de choro de partir o coração abalou a garotinha, e Alisson, hesitante, lhe deu alguns tapinhas no ombro. Teria tido sorte de não passar por aquilo? Moyra Graham ter ido embora sem se despedir foi como arrancar a casca de um machucado em cicatrização: doeu, mas logo passou e tudo ficou bem.

— Sinto muito. — ofereceu ao invés de um "eu entendo" — Mas olha pelo lado bom.

A menina fungou, rindo seca.

— Qual?

— Você vai ter duas casas pra visitar, não dá pra ficar entediada!

Um instante de espanto se passou, até que ela voltou a rir. De verdade. Alisson franziu a testa sem entender como havia melhorado o astral dela, mas satisfeita por não vê-la chorando mais. Ela era bonita. Não como o sobrinho melequento de Ângela, ou o menino que ajudava o pai na feira da esquina e sempre a cumprimentava, o que era estranho. Deveria achar os garotos bonitos, não?

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