— REALMENTE NÃO TEM PROBLEMA?
Era a terceira vez em uma só conversa que eu perguntava, e a senhora Maurici repetia o mesmo suspiro irritado de sempre.
— Se você não entrar naquele ônibus, pequena Finley, se considere sem orelhas!
Quando saí do reformatório e percebi que o mundo simplesmente continuou seu curso sem mim, me vi no meio do caos quase absoluto. Descobri que precisaria fazer matérias complementares para passar de ano, meu skate partido ao meio e preso com fita adesiva foi doado para um orfanato e, claro, Elroy estava doente. Tudo isso no auge dos meus catorze/quinze anos, portanto, não poderia trabalhar legalmente ainda.
Foi quando Ângela Maurici desceu dos céus como um verdadeiro anjo. Ela manteve o velho respirando, me ajudou com os remédios de preços exorbitantes e nunca, nem mesmo uma maldita vez, me olhou com outros olhos. Era uma mulher de boa idade, com rugas discretas apesar das seis décadas e um sorriso de mãe de comercial de manteiga. Sua casa, há uns dez metros da minha, sempre foi humilde comparada as outras do bairro em sua época nobre. Ela não tinha condições econômicas boas, ainda que melhores que as minhas, mas sempre estava lá para dar uma mão.
— Tenho os horários dos remédios, passo-a-passo para manusear o cilindro de ar e uma pistola de choque. — enumerou — Sabe, caso ele decida dar uma de "macho independente" que não precisa de ajuda.
— É, ele tem seus momentos. — concordei, rindo sem humor.
Claro, ainda teria que avisá-lo sobre a senhora que ficaria responsável por cuidar dele, e lidar com sua reação quando eu mencionasse que iria viajar. Não que eu me preocupasse com autorização ou algo do tipo, mas meu pai tendia a se tornar um pouco nervoso quando eu demonstrava o mínimo de contato social antigamente, e isso não mudou — apesar dos motivos que ele usava como desculpa não existirem mais.
— Acho melhor estar arrumando as malas, Finley. — Maurici bradou naquele jeito gentil de quem realmente se preocupa, e isso somado a sua mania de só me chamar pelo nome do meio, me fez sorrir de novo, o que atraiu a atenção da outra pessoa no quarto — E marque um touchdown para mim!
E não importava quantas vezes eu explicasse, Ângela teimava em achar que lacrosse era um estilo francês de futebol americano. Isso quando ela não perguntava quantas cestas eu geralmente marcava em uma partida.
Desliguei a chamada, revirando os olhos para o sorriso bobo que me encarava.
— Que foi? — bufei, devolvendo o celular.
— Nada. — Genevivie respondeu.Ela apanhou o aparelho e o jogou sobre a cômoda, deslizando pelo quarto com os lençóis de sua cama enrolados no corpo.
Corpo esse que estava suado, tocado e marcado por mim em plena manhã, mais precisamente, às seis e meia. Me atrasaria para o último treino em casa antes da partida contra a Flour Clover, mas valia a pena.
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FAKE GAME | ⚢
Fiksi Remaja¬ Viola Sovereigh vem de uma família abastada em uma cidade pacata de Ontário. Capitã do time de lacrose, a garota se vê pressionada em um meio social de aparências a ter um par para uma importante festa, e a primeira pessoa que vem a sua cabeça é s...