Sua

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No dia seguinte, o padre veio cedo pois o dia amanhecera chuvoso e a irmã Ana havia me dito que sempre que chovia muito, a igreja ficava gotejando e isso estragava as coisas, acarretando muitas percas.
Tiramos os bancos, pesados por sinal, tiramos os tapetes e colocamos baldes onde pingava. O padre arregaçou suas mangas até o cotovelo e subiu numa escada alta demais para o meu gosto e começou a consertar os buraquinhos indesejáveis no teto.
Não é preciso dizer que a visão que eu estava tendo era do paraíso, certo?!

"Padre, cuidado." Apesar de seu antebraço forte estar visível, sua calça jeans ser de coz baixa e a blusa levantava quando ele esticava os braços para o teto, meu tom era de puro medo.

"Não precisa se preocupar, Maine, já fiz coisas mais perigosas pregando para índios na Amazônia." Ele olhou pra baixo e sorriu, por um momento me tranquilizei com aquele sorriso obscenamente perfeito.
Não duvidava que ele realmente já se metera em encrencas pelo mundo mas eu realmente não queria que ele caísse de uma altura dessas.

"Não duvido mas tenha cuidado assim mesmo. E pare de olhar pra mim, olhe para cima, padre." Meu medo só o fez sorrir ainda mais. Seria excitante se eu não tivesse com medo.

Qual era a altura dessa igreja? 4, 5 metros? Por Deus, por que igrejas tinham que ser tão altas?!

Secamos tudo o que foi molhado bem a tempo de nada se perder e a ajuda do padre nas goteiras foi de grande ajuda.

Depois do almoço, voltamos a igreja e depois de tudo pronto, começaram a colocar os pesados bancos de madeira no lugar e minha coluna doía só de pensar, então me esgueirei entre a bagunça e fugi em um beco do lado oposto da igreja, a qual nunca tinha entrado, e mesmo me molhando eu continuei até encontrar um lugar gramado com escorregas, balanços e uma gangorra que parecia estar torta.

Por que isso estava tão escondido?
Não havia muitas crianças na igreja mas talvez isso as atraíssem.

Mesmo chovendo me sentei num balanço de ferro e madeira e testei sua força antes de me balançar.

"O que é que você está fazendo aí?"

Olhei pra trás e vi o padre Oskar debaixo de uma árvore que tinha na saída do beco. Ele deveria estar me achando uma louca, toda molhada e num balanço.

"Estou brincando." Ah, muito maduro.

"Maine, você vai ficar doente." Sua voz era alta para se sobrepor a chuva.

"Bobagem. Estou me divertindo aqui, não está vendo?"

Eu estava com a calça ensopada, a blusa de manga comprida era a minha segunda pele e meu cabelo estava colado envolta do meu rosto. Meu calçado estava jogado no chão e eu estava adorando a sensação de grama molhada nos meus pés.

"Estou vendo sim, agora venha até aqui, você tem que se secar."

"Não quero. Vem você."

"Maine!"

Eu vivia em um dilema, odiava que o padre ficasse bravo mas eu me deliciava quando ele brigava comigo. Talvez eu gostasse de ter sua atenção voltada pra mim, mesmo que como em forma de uma advertência.

"Vamos padre, não seja um chato." Me balancei mais alto como estímulo.

"Maine, eu tenho 30 anos, não vou ficar na chuva e muito menos me balançar como uma criança. Agora venha até aqui."

Eu estava mesmo me sentindo uma criança, não só por estar brincando mas também por ter escapado da arrumação da igreja.

"O que está fazendo aqui, aliás? Não deveria estar levantando bancos?"

Padre NossoOnde histórias criam vida. Descubra agora