Um fim

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A medida que caminhávamos, eu sentia o nervosismo crescendo em mim. Ela não fazia ideia de que eu já a amava. Maine sentia paixão, admiração, encanto até, mas amor? Ela não sentia e eu não podia deixar que essa obsessão fosse mais longe que isso.

Cruzamos uma pequena ponte que ficava perto de um parque fechado e nos sentamos em um banco branco de concreto. A noite estava fresca, o vento balançava seus cabelos e eu ficava hipnotizado olhando a dança que envolvia seu rosto. Era incrível como...como a noite...tudo em volta, era pra ela. Eu não estava sabendo lidar.

"Impressionante!" Não consegui frear e meus pensamentos ganharam voz. "É como se a lua brilhasse só pra você."

"Padre, eu achei que tivesse vindo para me colocar no meu lugar. Se eu estiver enganada, por favor me diga agora, não me dê esperanças."

Seu rosto brilhava, não mais que seus olhos, e eu precisava ser rápido mas gentil, sempre gentil.

"Eu vim para me colocar no meu lugar, Maine. Não você."

Ela parecia um anjo, um anjo triste. Ela sabia o que viria.

"Como assim? O que quer dizer com isso?" Ela mordeu os lábios.

"A partir de amanhã, eu tenho dez dias como padre da igreja de Santa Esperança mas já comecei a procurar um substituto permanente. Não pretendo deixar a igreja sem um sacerdote por mais tempo mas..." Olhei pra ela com carinho. "Se o que aconteceu hoje, acontecer novamente, eu vou embora."

"Isso...me pareceu uma ameaça, padre."

"Pra mim? Sim. Pra você? De maneira nenhuma. Eu só estou te informando que se eu errar assim de novo, é o que vai acontecer. Fui eu que permitir, eu que te beijei, eu que envergonhei meu cargo e desrespeitei quem confiou em mim para se confessar hoje. Tudo... Eu..." Desviei o olhar, constrangido. "Eu não tenho palavras pra descrever o tanto que me envergonho por hoje."

"Nós só desejamos um ao outro, padre. Oskar."

"Eu não espero que você me entenda. Também não culpo você de forma alguma."

"Então por quê?!" Ela aumentou a voz, indignada.

"Maine."

"Só me dê uma razão, qualquer uma, independente do que me disser, mesmo que seja mentira, eu vou acreditar. Porque é você."

Eu duvidava que fosse esquecer essas palavras alguma vez na vida. Isso me quebrou.

"Eu nunca minto. Você, certamente, será inesquecível pra mim. Mas eu amo ser quem sou, amo fazer o que faço e o farei até eu morrer."

Uma lágrima, uma maldita lágrima rolou em seu rosto e parou no seu queixo.

"Eu sinto muito, Maine. Não me odeie."

Talvez fosse até mais fácil se ela me odiasse mas eu não queria que um sentimento tão vil fosse sentido por ela.

"Bom, então parece que você tomou mesmo uma decisão. Temos dez dias e depois, adeus, nunca mais nos veremos, é o fim."

Você é a primeira coisa que eu vejo quando acordo, pensei sorrindo. Então, apesar dela não me ver, eu sempre a vejo.

"Não sabemos do futuro, mas sim, é muito provável não nos encontrarmos mais."

Ela acenou e abaixou a cabeça. Deixei que processasse tudo o que eu tinha dito. Alguns minutos se passaram até que ela se pronunciasse de novo.

"Beto tinha mesmo razão." Sorri internamente com a menção dele. Eu iria precisar muito dele depois que eu a deixasse, disso eu tinha certeza. "Você vai comigo de volta pra igreja?"

"Eu vou ficar na minha avó essa noite mas claro que eu vou te acompanhar."

"Podemos ir andando bem devagar?"

Não conseguir responder devido ao nó que se formou na minha garganta então apenas acenei. Se tinha uma coisa que tinhamos em comum, era a necessidade de proximidade um do outro. E disso eu a entendia muito bem.

A distância entra a igreja e o parque eram de duas ruas mas com a velocidade que íamos, chegaríamos depois do toque de recolher.

"Eu consegui um emprego."

"É sério?"

"Uhum."

"Isso é fantástico, Maine. Já falou com a madre?"

"Ainda não."

"Ela vai ficar feliz. O que você vai fazer? Não será nada incomum, certo?!"

"Não é nada ilegal, se é isso que o senhor quer dizer."

Rimos.

"Eu vou ser secretária num consultório. Uma amiga que me recomendou."

"Uma amiga?"

Ela tinha um emprego e uma amiga. Quem diria que essa noite terminaria assim?! Eu estava muito feliz. Ela ficaria bem.

"Na verdade são duas. Elas gostaram de mim logo de cara e foram muito legais comigo."

"É claro que gostaram. Mas não faça nada que deixa a madre desinformada, ela se preocupa com você."

"Eu sei. Ela é um amor. Nunca vou esquecer o que ela fez por mim, mesmo antes de saber quem eu era."

"Será que agora você tem ideia?"

"De quê?"

Me virei pra ela.

"De que você é amada."

Ela parou, esperando uma declaração. Uma que não iria ganhar.

"Muitas pessoas estão torcendo por você, te apoiando e ajudando. Quando pensamos ser um fim, é apenas um novo começo." Não sentia que podia pegar na sua mão então segurei seu pulso. "Te desejo tudo de bom, nesse tempo que ficarei aqui, sempre que precisar, eu vou te ouvir, e te aconselhar. Boa noite, Maine."

Ela olhou para o lado, se dando conta que já havíamos chegado.

Ela não disse nada, então soltei seu pulso e fui embora.

Esse era um fim pra nós mas era um começo pra ela. Maine se sairia bem, eu oraria todos os dias por isso.

De manhã bem cedo, antes de entrar no confessionário, eu tinha ligado pro supervisor perguntando sobre o novo sacerdote e ele ficou de me ligar amanhã. Se tudo desse certo, antes de dez dias eu já estaria na estrada, do jeito que eu gosto, sem lugar fixo.

Sentiria falta das irmãs, da madre e dos fiéis daqui. Sentiria falta da minha avó e do lugar alegre. Sentiria falta do tempo e da paisagem.

Mas sentiria muito, muito a falta dela.

Eu aproveitaria a semana para observa-la, como um quadro, a distância.

Padre NossoOnde histórias criam vida. Descubra agora