Capítulo escrito por Laís Dias
POV Estrela
Os dias passaram sonolentos e vagarosos.
Para mim, o sol demorava a se pôr e a se erguer, divertindo-se à custa de minha mente perturbada. O sol daqui, mesmo que atordoante, não era quente o bastante. Não quente o bastante para que eu pudesse me sentir em casa, sob aquele sol entorpecedor que aquecia a todos nas cavernas, que alimentava os melões-cantapulo de Jeb, que dava aos humanos força para capinar a terra dura no calor que antecedia as adoráveis monções.
Eu queria tanto, tanto, estar em casa... Ouvir a voz de Ian, ver a cor dos seus olhos. Ouvir a risada de Jamie, ver a cara de pôquer de Jeb, os leques nos olhos de Jared, o sorriso de êxtase da vida entregue de volta a Melanie, o doce olhar de Sunny, os passes invencíveis de Kyle no futebol e o seu olhar constantemente desconectado, a rápida e melancólica recuperação de Lilly, a trança mesclada de Trudy, os olhos sonolentos de Lucina, a fascinação dos seus filhinhos, o pão incrustado de sementes, a água sulfurosa e amarga. Eu sentia saudade da minha família. Mas... Ela não era a minha família. E eu sabia que jamais seria.
O Buscador vinha todos os dias me ver na Instalação de Cura. Sempre com perguntas novas, informações que ele queria que eu confirmasse.
— Achamos que eles atacam principalmente cidades pequenas que rodeiam Picacho Peak. Acha que é verdade? Ouvimos casos de roubos de medicamentos nos Centros de Cura. Corta Dor, Curar, Fechar... Sabe se eles fazem isso?
E eu sempre dava a mesma resposta vaga.
— Não sei, Logan. Eu não me lembro.
Isso sempre o fazia dar um suspiro de aborrecimento, revirar os olhos e murmurar: "Ah, mas que novidade."
Eu apenas sorria debilmente, olhando através da janela para que ele não pudesse ver meu olhar, minhas lágrimas que pingavam dor.
Pior do que tudo isso – do que suas insistentes formas de tentar me fazer lembrar algo, me acusando de estar brincando com a cara dele —, era o tédio mortal do lugar.
Eu ficava o dia inteiro deitada, olhando para o teto, sem permissão de sair para fazer nada além de ficar quieta. Minha Curandeira me ajudava no que fosse preciso para manter meu corpo limpo e alimentado, o resto era perigoso demais para que eu me arriscasse.
Então, eu passava horas a fio à deriva, perdida dentro de mim mesma, esperando a hora em que eu pudesse voltar à realidade. Submersa em pensamentos de outra vida que me tomavam mais do que se eles tivessem acabado de acontecer. Eu parecia constantemente fora de foco, do real, do presente. Pensar nunca era bom para mim; todos os meus pensamentos eram voltados para um só ponto. Um ponto que não podia mais existir para mim.
Eu estava prestes a me jogar no poço do esquecimento. Foi quando, ironicamente, Logan me salvou.
Foi num dia normal de suas visitas diárias. Ele me recheando de questões irritantes.
— Tudo bem. Vamos com algo básico hoje – ele disse, como sempre colocando sua cadeira de mogno na frente de minha cama. – Esse corpo e a alma dentro dele moravam em algum lugar. Você tem que saber pelo menos exatamente o que é, que tipo de lugar era esse.
— Não sei onde é. Mas o que é... Era algum tipo de abrigo dentro de... Seattle.
— Seattle?
— Sim.
— Estrela, por favor — ele ergueu uma sobrancelha castanha ceticamente. – Eles não estavam indo em direção a Seattle quando os capturamos. E eu também duvido que eles se esconderiam numa cidade tão grande e populosa. Não tem nem onde se fazer um esconderijo decente lá! O pouco espaço não vigiado que resta de Seattle é pequeno demais para os humanos que estimamos que se escondem com os que fugiram. Acho que você está confundindo lembranças.
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A Hospedeira - Coração Deserto
FanfictionPeg e os humanos levavam uma vida tranquila agora. Tudo o que queriam podia ser conseguido numa incursão. Mas também algo que não queriam. Um dia, o que parecia inevitável acontece. Algo dá errado. Os humanos acreditam que Peregrina está morta. Mas...