Passei o restinho da tarde tentando animar a Rosa. Mas, ela só queria ficar deitada no meu colo, comendo brigadeiro de panela, que eu tinha feito para ela. Na minha opinião, é muito mais eficaz um sorvete para a tristeza, assim você pode congelar o coração. Enfim, ela insistiu no brigadeiro, e eu me prontifiquei a fazer.
Não queria pressioná-la a me contar o que houve, só cuidei dela. Ela estava precisando de um colo. Todo esse semestre eu vi a Rosa como uma amiga, mas, para ser bem sincera, nós nunca fomos tão próximas. Até hoje.
Ela limpou as lágrimas e controlou os soluços do choro. Ainda deitada no meu colo, começou a falar.
— E-eu estava t-terminando de arrumar as m-minhas malas p-para a v-viagem, quando o P-Pedro ligou... — Ela começou, tentando se controlar ao máximo para eu conseguir entender o que ela estava dizendo.
— Rosa... Você não precisa me contar se não quiser. — Eu a interrompi gentilmente, enquanto fazia cafuné na sua cabeça.
— T-tudo bem, Lila. — Ela sorri, me olhando — Eu quero te contar. Eu c-confio em você.
Apenas sorri, agradecida por sua amizade e ela prosseguiu, falando rápido.
— O Pedro me ligou, dizendo que não íamos mais viajar. Não entendi o porquê, mas não contestei nada. Apenas desfiz minhas malas. Quando ele veio me ver mais tarde, ele perguntou se tinha problema ele viajar com o Carlos. Eles são amigos desde sempre, por causa do Theo, andam muito juntos, e claro que não vi problema algum.
Concordei com a cabeça apenas para mostrar que estava prestando atenção ao que ela dizia.
— Fui dormir tranquila. Na manhã seguinte, cruzei com o Carlos no Bloco de Direito. Estranhei ele ainda está na Focus, uma vez que o Theo já tinha viajado. — Ela se levantou do meu colo e falou, não com uma voz triste, mas agora, de raiva — Lila, ele mentiu pra mim. O Carlos nem sabia da mentira dele, da tal viagem. Tentou defendê-lo, mas o Pedro já tinha sido desmascarado.
Olhei para ela confusa, sem entender. Será que ele tinha traído ela com outra menina? Resolvi sanar a minha dúvida de forma sutil...
— Mas... por que ele mentiria? — Perguntei com medo da resposta ser traição.
— Eu e a mãe dele nunca nos demos muito bem. Parece que ela não me acha adequada para ele. — Ela bufou — Ele foi para a casa dos pais escondido de mim, Lila. Quase quatro anos de namoro, e ele mentiu para mim, para poder ver os pais dele!
Ufa, pelo menos não foi traição...
Rosa voltou a deitar no meu colo e terminou a narrativa.
— Liguei para ele, contando que tinha descoberto tudo. Ele chegou aqui em poucas horas, tivemos uma briga feia sobre mentiras e desconfianças. Ele me chamou de possessiva e grudenta, eu o chamei de falso e mentiroso. Dissemos coisas que não deveriam ser ditas sobre a fragilidade um do outro. Sabe, momento de raiva... Então, ele soltou uma pequenina frase que fez o nosso namoro ir por água a baixo ''Deveria ter escutado minha mãe desde o começo. Ela sempre está certa.''
— Que você não é adequada? — Falei irônica, já com raiva dessa mulher que eu nem sequer conhecia.
— Pior! Ela sempre quis que o filhinho dela ficasse com uma menina que mora perto da fazenda deles... Uma tal de Rita, uma pirralha que ainda nem é maior de idade. Ela sempre foi ''apaixonada'' pelo Theo, mas foi só o Pedro começar a namorar comigo que a criaturinha fez do início do nosso namoro um inferno!
— Então... quer dizer que... — Ainda estava raciocinando.
— Isso! Que se a mãe dele está sempre certa, ele quis me dizer que deveria ter ficado com essa pirralha e não comigo. — Lágrimas se formaram de novo nos olhos dela — Depois disso, eu não briguei, nem gritei mais com ele. — Ela dizia quase que em um sussurro — Apenas entreguei o anel de compromisso que ele tinha me dado, com 1 ano de namoro, e fui embora, deixando ele para trás, me chamando.
Eu não sabia o que dizer, mas nada precisava ser dito. Apenas a abracei forte e ficamos assim.
À noite, o Theo veio ver como a Rosa estava. Ele nem tocou no nome do irmão, o que fez eu gostar dele mais ainda. Até esse cuidado ele teve para não magoá-la. Nós, eu e o Theo, resolvemos sair um pouco do quarto e arrastá-la para o shopping, já que ela gostava tanto.
Depois me muito insistir, ela acabou cedendo. Afinal, ela tinha que se distrair um pouco. Mas, era totalmente compreensivo o seu estado, pois não fazia nem 1 dia que eles tinham terminado.
O Theo, porém, devia mesmo conhecer a Rosa, pois o passeio serviu bastante para distraí-la e acalmá-la. Fomos ao cinema, depois olhamos as vitrines das lojas e, por fim, jogamos em uns brinquedos para crianças.
Quando a Rosa se distanciou para ir comprar um lanche, o Theo desmoronou em uma cadeira. Eu o olhei, surpresa. Então, resolvi arriscar.
— Como está o Pedro?
— Péssimo! — Ele suspirou — Foi ele quem me pediu para cuidar da Rosa.
— Você acha que eles voltam? — Mordi o lábio inferior, porque deveria ter contido essa pergunta. É claro que é um assunto delicado para ele também. É da família dele que estamos falando.
— Eu espero que sim. — Ele sorriu triste — Ia ser muito estranho viver num mundo em que a Rosa e meu irmão não estivessem juntos. Aquele idiota, tinha era mais que ter ficado calado. Todo mundo sabe que a mulher tem sempre razão. — Ele conseguiu fazer uma brincadeirinha.
Empurrei ele de leve, de lado, mostrando que apreciava o seu esforço em ser positivo.
— A mamãe é um pouco complicada, mas ela gosta da Rosa. Às vezes... — Ele completou.
Abri a boca para continuar o assunto, quando avistei a Rosa vindo em nossa direção. Tratei de ficar calada e mudar o rumo da conversa, antes que ela notasse que nosso assunto principal era a sua vida amorosa.
-
Voltamos para o campus e o Theo subiu no quarto conosco. Depois de verificar e ter certeza absoluta de que íamos ficar bem, na medida do possível, ele se despediu de nós com um tchau.
Quando ele já estava saindo pela porta, lembrei que ainda estava com o bloco de notas dele. Peguei o caderninho na minha cômoda e corri para alcançá-lo.
Na pressa de ver se ele ainda estava perto, atingi suas costas com um empurrão, não consegui frear.
Muito bem, Lila. Mais uma vez machucando o menino, sua desastrada.
Por sorte, ele não caiu. Apenas foi empurrado para frente. Ele olhou para trás, confuso, tentando entender o que tinha acabado de acontecer.
Corei imediatamente e comecei a pedir desculpas.
Ele começou a rir e disse que eu estava parecendo com a meninazinha do primeiro dia de aula que o havia machucado 3 vezes seguidas.
— É porque ela ainda é a mesma desajeitada. — Respondi, tímida.
— É, ela ainda é a mesma... — Ele me encarou, como se quisesse dizer algo.
Meu coração disparou na hora, ainda não estava acostumada com esses olhos coloridos e profundos. Minhas mãos começaram a suar, e só então, quando reparei nas minhas mãos, lembrei o que tinha ido fazer, correndo atrás dele.
— Seu bloco de notas. — Eu o devolvi.
— É mesmo. Eu havia esquecido! Obrigado, Lila. Por tudo. — Entendi que ele se referia a Rosa — E... obrigado por não ter lido. — Ele levantou o caderninho, indicando sobre o que estava se referindo agora.
Nesse hora, pairou um misto de confusão em mim. Peso na consciência, vergonha por lembrar do que se tratava o conteúdo de seu bloco de notas e... algo a mais, que estava se formando dentro de mim, e eu ainda não tinha um nome definido para isso.
Apenas sorri, sem jeito, me sentindo a mais falsa das criaturas, e voltei para o quarto. Afinal, eu precisava dormir, tinha aula no dia seguinte.
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Aconteceu na faculdade
RomanceLila é uma garota que sonha com os clichês das histórias românticas que ela passou a vida toda lendo e assistindo. Ao se mudar para sua nova faculdade, para cursar Letras, ela se vê de frente com situações e pessoas que ela não sabe como lidar. Ela...