Capítulo 23 - Um céu de papel

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Quando finalmente o Carlos saiu, tomei um susto com o horário. Com toda a confusão do dia, perdi a noção do tempo. Já eram 20 para às 19 horas.

Resolvi ir tomar um banho e me arrumar com calma, afinal essas comemorações dentro da faculdade nunca começam no horário mesmo, sempre atrasam.

Vesti uma saia longa, com uma blusa básica. Cabelos soltos com uma headband fininha, estilo hippie.

Desci correndo as escadas. Tanto a Érica como o Jadson já haviam me mandado mensagens perguntando onde eu estava.

Chegando no Bloco de Letras, corri para o Centro Acadêmico, local onde estava acontecendo a festinha de comemoração do final do semestre. Uma vez lá, notei que não havia tantas pessoas como eu esperava. A sala estava lotada, mas parece que os veteranos já enjoaram desses festas. Havia mais novatos. Rodei a sala brevemente, procurando com os olhos algum conhecido. Vi a Érica ao longe. Ela também parecia está procurando alguém. Quando ela me viu, correu na minha direção, meio eufórica.

— Amiga, o que eu faço? O Theo tá aqui! — Ela sussurra pra mim, em desespero.

Nessa hora, o Theo apareceu. Sorriu para nós e veio em nossa direção.

A Érica arregalou os olhos, assustada, de tal forma que me deu vontade de rir.

Mas... poxa, como ele estava bonito hoje. Finalmente ele colocou um jeans, porém conservava um estilo mais formal, com uma blusa branca social.

Ele nos deu um ''oi'' rápido, contudo a conversa não prosseguiu.

O Guto estava na organização do evento. Parece que ele fazia parte da chapa que toma conta do C.A. Desde o dia na boate, ele não falou mais comigo. Nem mesmo para pedir desculpas por ter tentado me agarrar. Se afastou de todos ao meu redor. Não sei se por vergonha do que houve. Gosto de pensar que sim.

Notei que ele percebeu que eu o estava observando e virou o rosto. Covarde. Após um tempo, um colega de chapa dele foi para frente da sala, e anunciou que agora iríamos ver e relembrar todos os fatos desse semestre. Uma retrospectiva, segundo ele.

Então, começou a passar um vídeo com uma música ao fundo. Havia várias fotos engraçadas, fotos de pessoas dormindo e fotos de algumas calouradas que não participei. Me reconheci em algumas: no meu trote, no intervalo, com o pessoal, no dia em que o Theo estava tocando para a gente, e uma com a turma do programa especial de Linguística.

Eu estava rindo bastante das imagens bizarras e constrangedoras do pessoal. O Theo e a Érica, ao meu lado, também riam bastante. Escutávamos alguns assobios, brincadeiras e vaias a cada foto. Até que o inesperado aconteceu.

A minha foto com o Nathan! O Jadson bateu essa foto de nós dois dormindo juntos, depois de passarmos a noite assistindo Star Wars. Não acredito que ele tornou isso público.

Ouvi a Érica rindo e brincando algo sobre ''só amigos? sei

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Ouvi a Érica rindo e brincando algo sobre ''só amigos? sei...''

Olhei para o Theo e ele tinha um semblante meio triste. Ele nem sequer olhou para mim. Apenas continuou vendo o vídeo, mas notei que estava com a mandíbula trincada. Quando este terminou, as pessoas aplaudiram e começaram a fazer discursos. O Theo, sem dizer uma palavra, abriu caminho entre os alunos e saiu da sala. Sem pensar muito, corri atrás dele.

A noite lá fora estava fria e silenciosa. Avistei o Theo na pracinha que sempre ficávamos no intervalo. Ele estava sentado, com a cabeça baixa, apoiada nas mãos.

Suspirei e caminhei até lá, a passos lentos. Não queria assustá-lo. Ele rapidamente olhou para frente para ver quem era. Constatado que era somente eu, ele se afastou um pouco, me dando espaço para sentar também.

— Theo... eu... aquela foto está totalmente fora de contexto. — Não sei bem porque estava me explicando para ele.

— V-vocês não estão juntos? — Ele pareceu surpreso — Vocês são tão próximos! É claro que já havia pensado nessa possibilidade...

— Eu e o Nathan somos como irmãos. Nos conhecemos desde crianças. Seria muito estranho eu ter algo com ele, no mínimo se enquadraria como um incesto. — Eu ri.

Ele deu um lindo sorriso, coberto pela luz prateada da lua.

Por algum motivo, olhei para cima e ele fez o mesmo. Ficamos apreciando o céu, quase sem estrelas e a lua gigantesca.

— É como um papel em branco. Quer dizer, o céu. Queria tanto usar a lua como tinta e preenchê-lo com versos estrelares. Principalmente quando ele está tão limpo assim...

Eu sorri com sua comparação. Gostava do seu lado poeta. Eu deveria contar sobre o seu bloco de notas, mas não sabia por onde começar.

Olhei para ele, pensando em como iniciar o assunto. Eu, porém, perdi a coragem e voltei a olhar o céu. Então, foi a vez dele de me observar. Fingi não perceber o seu olhar, olhando para o infinito.

Vagarosamente ele foi se aproximando de mim.

— Lila...

Eu olhei para ele, que já estava bem próximo.

— Eu não quero mais fugir do que sinto.

Ele acaricia os meus cabelos com a mão direita, enquanto a outra segura uma de minhas mãos.

— Você é merecedora de todos os meus versos.

A mão que estava acariciando o meu cabelo, penetrou ao redor do meu pescoço, indo parar na minha nuca. Ele a segurou firmemente, enquanto ia me puxando para mais próximo de si.

Minha nossa, como ele estava cheiroso! E que olhos!

Meu coração parecia querer sair do meu peito, enquanto os nossos lábios se tornavam cada vez mais próximos. Encostamos nossas testas e ficamos nos encarando, ele desceu os seus olhos até a minha boca...

De repente, ouvimos um barulho de algo caindo ao nosso lado. Olhei assustada e me deparei com um Carlos atordoado. Notei que ele havia derrubado o seu violão.

O ruivo estava boquiaberto, olhando para mim e para o seu melhor amigo.

— Carlos, eu posso explicar... — Theo se levanta e vai em direção a ele.

— Por que você não me contou? Eu sou seu amigo. — Carlos fala, quase gritando, magoado.

Eu assistia a cena dos dois, como se não fizesse parte daquilo.

Eles não se importavam que eu estivesse ali, e com toda a razão.

A amizade vale mil vezes mais do que uma paixão.

Resolvi continuar onde estava e ouvir a conversa até o final, pois eu também fazia parte daquela trama.

Aconteceu na faculdadeOnde histórias criam vida. Descubra agora