Track. Era o barulho dos estilhaços do espelho se partindo quando os corpos de Nicholas e Nora caíram no chão.
Pisquei uma, duas, três vezes e encarei Ahri adormecida na minha frente, voltando para o que era real. Enquanto cuidava de seus ferimentos e limpava seu corpo, muitas das vezes minha mente viajava de volta para o campo de batalha, onde aquela cena se repetia como um pesadelo infinito.
A culpa me assolava e eu sabia que meus ombros permaneciam curvados por horas, como se meu próprio corpo não pudesse lidar com aquele peso. Completamente entregue a exaustão, Ahri suspirava em um sono profundo que poderia durar dias.
Sufocada pela tenda e as vozes da minha mente, levantei com o corpo pesado e arrastei meus pés para fora dali. Ao fechar as lonas atrás de mim e notar que amanhecia, me permiti observar a neve derreter ao nosso redor, revelando o fim do inverno e o início da primavera.
Os feridos eram carregados para carroças e fogueiras queimavam os corpos de guerreiros que lutaram corajosos pelo seu povo. Suas espadas, eram guardadas e levadas para os transportes que carregariam suas histórias de volta para casa.
As tendas eram desarmadas às pressas e os sobreviventes trabalhavam em conjunto para acelerar o que podiam. Uma fila de feéricos pegavam suas sopas de um caldeirão e se sentavam para uma refeição sofrida.
Tentando me concentrar nas atividades que ocorriam no acampamento, avistei Amelia entrar em uma tenda ao lado de uma curandeira. Sem pensar duas vezes, era para lá que meus pés seguiam.
A energia e o peso da morte me recebeu muito antes de entrar na cabana. E no momento que meus olhos caíram sobre os dois corpos frios no meio daquele espaço, pude jurar que vomitaria toda minha angústia no carpete que cobria o chão.
Nenhuma das duas havia notado minha presença enquanto discutiam sobre o estado dos corpos gelados e sem vida. A curandeira experiente, baixa e de pele morena, passava as mãos brilhantes sobre Nicholas e Nora.
Minha visão escureceu e senti minha língua pesar na boca, como se eu não tivesse forças para informa-las da minha chegada.
Naquele momento, eu me sentia pequena e indefesa, sem suportar a dor e a solidão que era encarar meu irmão jazido em cobertas que não eram quentes o suficiente para trazer o calor da sua vida de volta.
E então Nora, minha melhor amiga e confidente, que ainda carregava a aliança de sua parceria no dedo anelar, o mesmo que vislumbrou naquela noite de solstício. O brilho da rainha desaparecera e seu sorriso caloroso também abandou seus lábios delicados.
A falta de cor e a palidez nítida em suas peles acabava comigo, contestando sem pudor o que eu insistia em negar para mim mesma.
Meu coração se encolhe toda vez que olho em seus rostos e não enxergo a alegria e o conforto de uma família amável. Eles haviam se sacrificado por nós mesmo quando tinham uma vida próspera pela frente.
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DEMÔNIO DE AZAHARA
Fantasy+18 | Ahri Darfin está presa em um mundo onde suas mãos estão permanentemente manchadas com sangue inocente e seus olhos perdidos a humanidade. Possuída por um príncipe-demônio de outro mundo, ela é forçada a embarcar em uma jornada dolorosa em busc...