Capítulo Dois

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12 anos antes

Olhava minha irmã pela janela do meu quarto, feliz e caminhando como se nada no mundo pudesse incomodá-la. Em seu mundinho perfeito, existiam unicórnios e fadas; nada nunca poderia tirar sua paz.

Mas ela poderia tirar a minha. Nunca entendi o motivo do apoio incondicional da minha mãe a qualquer atitude da minha irmã caçula. Estando certa ou não, ela sempre seria favorecida em relação a mim, mesmo que isso custasse a minha mãe e a mim um relacionamento harmonioso de mãe e filha.

Hoje, a briga do dia foi porque Dani queria usar minha calça jeans favorita, que, inclusive, eu já estava vestindo. Recusei-me a entregá-la, e minha querida irmã teve um acesso de raiva, correndo para contar à minha mãe que eu havia roubado a peça que ela tanto queria.

— Dê a calça para ela. — Minha mãe não se dignou a olhar para mim enquanto preparava aquele café da manhã horrível.

Recusei-me e sabia o que estava por vir, mas não me importei. Minha mãe deixou o que estava fazendo e me deu um tapa forte no rosto, fazendo minha cabeça virar para o lado direito, tamanha a violência do golpe. Permanecei olhando para ela, com lágrimas nos olhos e a expressão fechada; que ela educasse seu pequeno animalzinho.

— Essa calça é minha; papai me deu, e não vou entregá-la para a Dani só porque ela não cuidou da dela. — Falei, com ódio e o rosto vermelho pelo tapa e pela fúria. Meu pai passava vários dias longe de casa, sendo motorista de caminhão. Ele chegava a passar várias semanas em viagens, enquanto eu era obrigada a ficar sozinha com minha mãe e minha irmã. Não tinha ninguém para me proteger da dupla.

— Se você não tirar, eu vou arrancá-la de você. — Minha mãe ameaçou, e eu explodi.

— Tente, mamãe. Vou contar para o meu pai sobre as suas visitas de homens muito mais novos do que você e o uso que encontrou para a cama de vocês na ausência dele. — Disse, arqueando a sobrancelha direita, desafiando minha mãe a cumprir sua palavra.

Há dois meses, percebi que Olga ficava muito feliz falando ao telefone; sempre achei que era meu pai do outro lado, fazendo-a rir como de costume. Em uma bela segunda-feira, cheguei mais cedo da escola e ouvi barulhos estranhos vindos do andar de cima. Achei que fosse Daniela matando aula com o namorado, mas, ao me aproximar silenciosamente do corredor que levava aos quartos, entendi de onde vinham os sons.

Minha mãe beijava um homem que deveria ser, no mínimo, dez anos mais novo que ela. Os barulhos que ouvi eram gemidos vindos dos dois, enquanto se atracavam na cama onde ela dormia com meu pai. Saí do meu estado de torpor, peguei rapidamente meu celular para tirar uma foto dos dois e saí o mais rápido que pude, tentando não fazer barulho.

— Você não sabe de nada, Clara, não tem provas e é só uma princesinha gorda e mimada. — Disse Olga, achando ser um blefe da minha parte, não iria entregar meu maior trunfo contra ela, se tentasse me agredir novamente, enviaria a foto imediatamente ao meu pai.

Dei de ombros e saí da cozinha, indo para o meu quarto para aguardar o horário de ir para a aula. Minha mãe ficou em silêncio, não queria pagar para ver até onde eu iria, e sorri quando ouvi Daniela gritar no andar de baixo o quanto queria a bendita calça. Também ouvi o som de um tapa e o silêncio ensurdecedor tomando conta da casa.

Duas dissimuladas moravam sob o mesmo teto que eu, e eu não aguentaria mais abusos de ambas. Mesmo que minha mãe não tivesse cumprido sua palavra, eu não cumpriria a minha. Enviei a foto para o meu pai, relatando tudo o que vi. Sabia que ele estaria em casa naquela noite, depois de duas semanas longe.

Enviei-lhe tudo o que sabia e saí para a escola. Durante o dia, fiz questão de ignorar todas as mensagens e ligações da minha mãe, desliguei meu telefone e prestei atenção na minha professora. Durante o intervalo, minha preciosa irmã veio em minha direção para questionar o que eu havia feito.

Sombras do PassadoOnde histórias criam vida. Descubra agora