Capítulo Quinze - Almeida (parte dois)

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Curitiba, Paraná

19 anos atrás

Na manhã seguinte, Suelen acordou Brian bem cedo para levá-lo à sua amiga. O orfanato não ficava muito longe de sua casa, mas estava suficientemente distante da casa dos pais de Brian. Enquanto o menino tomava café da manhã, Suelen explicou como seria a vida na nova casa e falou sobre as visitas que faria a ele.

— Eles vão te tratar bem lá, menino Brian. Vai ser um lugar novo, limpo, e sem os seus pais. Se algo estiver errado ou alguém te tratar mal, peça para falarem comigo. Eu não tenho muito, mas vou dar um jeito se precisar. Vou tentar te visitar a cada duas semanas, para que seu pai não desconfie de onde você está. E sempre lembre-se de que, se precisar de mim, estarei lá no instante que chamar.

O caminho até o orfanato foi silencioso. A amiga de Suelen já aguardava na porta. Como o local precisava ser discreto, tinha a aparência de uma casa comum. A fachada simples do sobrado, em tons de cinza e branco, e o portão fechado evitavam a curiosidade de olhares externos.

— Que bom te ver, Renata. Sou muito grata pela sua ajuda, você é a melhor pessoa a quem eu poderia recorrer para cuidar do pequeno Brian.

Suelen sorriu para a amiga. Renata sabia desde muito jovem que seguiria a profissão de assistente social. Ela mesma crescera em um orfanato sombrio e jurou que, quando crescesse, faria melhor, transformando os orfanatos em lugares mais seguros para crianças que, como ela, passaram pelo inferno.

Renata sorriu para Brian, que se escondia timidamente atrás de Suelen. O menino estava visivelmente mais magro que o normal, sua pele pálida e as cicatrizes visíveis a assustaram, mas ela manteve o sorriso para não amedrontá-lo. Sabia que teria que ajudá-lo da melhor forma possível.

— Oi, Brian. Meu nome é Renata, e vamos cuidar de você a partir de agora. Quer entrar para conhecer o seu novo quarto?

Brian fez um leve aceno, ainda segurando firme a mão de Suelen. Renata ofereceu sua mão, que ele aceitou timidamente, sempre olhando para Suelen em busca de segurança. Suelen, por sua vez, acompanhou os dois, segurando a outra mão do menino.

Renata apresentou a casa para Suelen e Brian, passando por cada cômodo, o que tranquilizou Suelen ao conhecer melhor o ambiente. Brian dividiria o quarto com dois meninos mais novos, em um espaço bem amplo. As camas individuais eram bem cuidadas, com lençóis limpos, e as escrivaninhas organizadas para as tarefas escolares.

Ainda segurando a mão de Suelen, Brian observava tudo com curiosidade. Não perguntou sobre as outras crianças nem sobre as roupas, já que não havia trazido nada durante a fuga e temia não ter o que vestir. O medo de que seu pai o encontrasse e o levasse de volta para o inferno daquela casa ainda tomava conta de seu corpo.

Renata e Suelen o deixaram na ilha da cozinha com um sanduíche e um copo de suco. Brian não estava acostumado com tanta comida; seus pais o deixavam sem se alimentar por horas, até dias, e só ofereciam pequenas porções quando ele estava prestes a desmaiar. Assim, o menino aprendeu a sobreviver com pouco, apesar do luxo da sua antiga "casa".

Para Brian, a riqueza, o luxo e o status não compravam um bom caráter e tampouco pais melhores. Aos dez anos, ele já aprendera que ter muito só lhe trouxe dor, destruição e tristeza, deixando-o solitário e quebrado, mas, finalmente, esperançoso de encontrar um lugar melhor e um verdadeiro lar.

Curitiba, Paraná.

13 anos atrás.

Brian observava a fila interminável de adolescentes prestes a realizar a primeira crisma. O garoto, agora com dezesseis anos, achava particularmente desnecessárias aquelas formalidades, mas faria de tudo para agradar seus pais adotivos, que tanto amava. Agora, Brian Becker sorria levemente ao pensar que amava alguém, que tinha um lar e estava ansioso para voltar para casa, mas queria deixar registrado em sua mente o orgulho dos seus pais, que o assistiam dos bancos da enorme igreja.

Seu padrinho de crisma, o tio Rafael, irmão de Otto, estava orgulhosíssimo por Brian tê-lo escolhido para a função. O garoto era silencioso e quase não demonstrava suas emoções; então, se Brian o havia escolhido, era por afeto.

Brian estava impaciente ao lado do padrinho. O menino não tinha muito controle quando se tratava de esperar e queria ir logo para casa, para a batalha de Crash Kart, jogo que Otto fez questão de ensinar-lhe, tornando-o tão bom quanto ele mesmo. Agora os dois sempre competiam pelo primeiro lugar nas disputas, junto com os amigos de Brian, que brigavam pelos últimos lugares.

Esses amigos estavam mais à frente na fila, tão ansiosos quanto o garoto para a batalha de videogame.

Brian foi retirado de seus devaneios sobre o jogo quando sentiu uma mão em suas costas, acompanhada de um xingamento baixinho atrás dele. Tentando segurar o sorriso por ouvir uma palavra tão suja proferida dentro da igreja, virou-se para encarar a garota.

A menina, vários centímetros mais baixa que ele, olhava-o com o rosto ruborizado. A ruiva usava um vestido branco, que ressaltava ainda mais seus cabelos cor de fogo e o rosto sardento. Brian ficou impressionado com os olhos esverdeados e o rosto angelical.

— Desculpe, minha irmã me empurrou — reclamou ela com voz suave, encarando os olhos do menino como se o conhecesse há anos. Brian assentiu e se virou para frente, sendo guiado pelo padrinho a caminhar junto com a fila.

O garoto ainda conseguia ouvir a menina pedir repetidas vezes para alguém atrás dela parar com o que quer que fosse. Irritado por ver que seus pedidos não eram atendidos, ele sugeriu que ela trocasse de lugar com ele, avisando ao padrinho sobre a troca.

Ao encarar outra ruiva, essa um pouco mais alta e de rosto mais estreito, Brian fez a expressão mais fechada possível, deixando claro que não toleraria empurrões ou qualquer gracinha que a menina pudesse fazer.

— Foi uma atitude muito legal, Brian. Eu mesmo queria separar essas duas; aparentemente essa garota não sabe ouvir um "não" — comentou Rafael, tão irritado quanto Brian pela falta de educação da irmã mais velha.

A crisma ocorreu sem mais interrupções, e a "anjo", como Brian decidiu apelidar a garota de vestido branco, agradeceu baixinho depois que terminou a sua parte na cerimônia.

Brian pensou na garota por muitos anos depois disso, imaginando que, se um anjo decidisse descer à Terra, se pareceria exatamente com aquela menina. E qual seria o melhor lugar para a aparição de um anjo senão em uma igreja?

Texto revisado. 

Olá, pessoal!

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Obrigada por ler até aqui ♥

Espero que gostem de mais uma parte do passado do Brian! 

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