Capítulo Seis

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Encarava meu rosto pálido no espelho do banheiro da delegacia. O espelho sujo e engordurado refletia meu estado interior: cabelo despenteado, lábio arranhado e um olho roxo. Um estado lamentável comparado ao de algumas semanas antes.

Em algum momento, enquanto eu espancava minha irmã no chão da padaria, ela conseguiu se levantar e arranhar meu lábio inferior com as unhas enormes, ao mesmo tempo que arrancava uma mecha grossa do meu cabelo. O olho roxo foi consequência da minha distração com o tufo ridículo de cabelo nas mãos finas de Daniela.

Durante a comoção, várias pessoas nos seguraram para apartar a briga, e a polícia foi chamada. Pela primeira vez na vida, entrei em uma viatura como infratora, algemada e envergonhada. Assim que os oficiais souberam que eu era investigadora, imediatamente avisaram Pedro, que ficou furioso ao receber a notícia e se dirigiu à delegacia.

Respirei fundo enquanto molhava o rosto com água fria na pia, pensando nas várias maneiras que Pedro poderia me punir pela minha infração. Ele podia tolerar várias coisas, mas, para o meu azar, brigas não eram uma delas.

Desistindo de adiar o inevitável, rumei para uma das salas de interrogatório, onde um oficial me informou que Pedro me aguardava. Parei com as mãos trêmulas diante da porta sem graça, tentando acalmá-las, e entrei na sala, tão sem graça quanto a própria porta.

Pedro me observava; mais precisamente, me fuzilava com o olhar. Eu estava encrencada, sem dúvida.

— Eu trabalho na polícia há mais de vinte anos, Clara — Pedro disse calmamente, enquanto eu me sentava diante dele. — E nunca, em vinte e cinco anos, me senti tão envergonhado quanto hoje.

Ainda calmo, ele me destroçou com elegância. Pedro tinha o dom de fazer qualquer um se sentir minúsculo apenas com palavras.

Toda a carga emocional que eu vinha guardando se rompeu naquele momento, em frente ao meu superintendente. Toda mágoa, medo e, principalmente, raiva. Então, simplesmente chorei copiosamente enquanto Pedro me observava. Minha visão estava borrada pelas lágrimas e pelas emoções que fluíam junto com elas.

Eu estava exausta, física e mentalmente. Queria minha casa, mas, sem Brian lá, ela não passava de uma casa vazia.

— Sinto muito, Pedro — soluçava, tentando desfazer o nó na garganta. — Eu sei que errei feio, mas...

A frase se perdeu no meio das lágrimas, e meu corpo todo tremia, incapaz de formular uma frase coerente.

— Estou te afastando do cargo temporariamente, Clara — sentenciou, enquanto tudo dentro de mim se silenciava com aquela maldita frase. O vazio no meu peito aumentava com a sentença de Pedro, apertando ainda mais o nó na minha garganta. Tudo doía: minha cabeça, meu corpo e meu coração. Pedro só terminou de pregar o meu caixão.

— Você não vai ficar desamparada financeiramente. Conversei com o nosso departamento jurídico, e conseguimos uma licença remunerada para que você se recupere de todo esse estresse — disse Pedro com ternura.

— Estou preocupado com você, Clara. Eu não consigo imaginar pelo que você está passando, mas saiba que pode contar comigo e com o Luís. Sempre estaremos aqui. Mas agora, preciso que você se recupere e volte para nós, tudo bem? Só Deus sabe o quanto você se manteve firme nessas últimas semanas.

Pedro falava com lágrimas e compaixão nos olhos, enquanto suas mãos grandes acariciavam as minhas.

— Talvez eu possa me recuperar a tempo de resolver o caso, já que vocês estão fazendo um excelente trabalho — rebati, amargamente. — Ou, quem sabe, eu mesma faça o seu trabalho, Pedro, já que você não consegue encontrar o meu marido ou a porra da pessoa que fez isso!

Sombras do PassadoOnde histórias criam vida. Descubra agora