onze - ardentemente

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Capítulo 11 de estranhamente.

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Antes de desejarmos ardentemente uma coisa, devemos examinar primeiro qual a felicidade daquele que a possui. Foi isso que François La Rochefoucauld me ensinou quando tudo isso pareceu fazer algum sentido. Lembrei disso quando cheguei ao restaurante universitário e toda minha animação em rever Camila congelou em meu âmago.

Dakota, se não me engano o nome, estava muito feliz com Camila em seu colo, as duas rindo porque, até onde lembrei novamente, elas eram esposas uma da outra. Bom, isso foi parte do gelo, o que me amordaçou foi vê-las trocando carinhos que não sei se um dia vou ser capaz de fazer, essa foi a inveja que me espancou a consciência.

Eu desejava Camila tão profundamente e ardentemente que simplesmente esqueci daquele nada pequeno detalhe, e Rochefoucauld deve ter rido de mim cara, ou ao menor riria se ainda estivéssemos no século XVII.

Mas que importa? Estava ali suas palavras sobre como quem a tem é feliz e eu não sabia o que fazer depois de ter essa informação. Não tinha como frear meus sentimentos, nem tê-los eticamente. E eu me importo com a ética tanto quanto com as leis. Elas foram feitas por algum motivo.

Agora eu estava lá com uma fome morta presa no estômago em um lugar que eu não podia enterrá-la. Minha existência estava cheia demais de Camila e Camila não me tinha em lugar algum. Ela tinha Dakota, e Dakota tinha todo o meu ódio desleixado e desmedido.

Mas François, se o amor é como fogo: para que dure é preciso alimentá-lo, por que eu não conseguia apagar essa lareira que continha a única fonte de calor que me aquecia? Entra é claro, as questões que seguramente eu não queria enfrentar: eu queria? Eu não queria? E acho que isso em si não importa, tal como essa coisa de amor que, para ser franca, eu não conheço e estou apenas julgando senti-lo diante de tudo o que já li, pensando na veracidade do próprio Rochefoucauld quando diz que o verdadeiro amor é como os fantasmas. Todos falam nele, mas ainda ninguém o viu, diante de palavras que não são minhas, mas que pareciam preencher o questionário de obsessão melhor do que qualquer pensamento meu seria capaz de fazer.

Não querendo ver nem sentir nada, me desconectei do mundo. Como em muitas vezes, saí até do que estava diante de mim. Uma hora tinha um prato de comida que não conseguiria tocar, no outro eu estava sentada sozinha no clarão do nada enquanto dores ainda mais complicadas me estraçalhavam e espalhavam meus pedaços para os lobos famintos que existiam dentro de mim.

— Lauren – ouvi a voz de Camila me chamar e inevitavelmente olhei. Um monstro em meu peito rugiu ardentemente e não consegui me manter nela quando tudo parecia tão errado e partido.

Eu não a tocaria mais nem com meu olhar. Seria muito atrevimento.

Eu me mantive em mim até o final, presa novamente dentro da confusão de matéria orgânica que me compunha. Era o que me restava. O drama era tudo o que eu tinha. Devo soar extremamente chata, mas isso era mesmo tudo.

Não digo nada. Nem mesmo existi naquele ambiente pelo resto do almoço, quando me flagrei seguindo minhas amigas para o lado de fora. Iria com Veronica atrás de algumas coisas para a faculdade, por isso esperei. Fiquei me perguntando sobre o horário que Peter chegaria para me buscar. Seria horrível, mas bom melhorar um pouco mais, ainda que tudo parecesse estagnado. Horrível.

— Lauren – ouvi sua voz doce me afogar, porém foi tão suave que o acariciar interno que provocou me deu vontade de chorar – você está bem?

Não. E eu não sei o que tanto me morde e me rasga, mas sei que Camila estava entrando ali e me tocando. Atrás dessa sua entrada, Dakota espiava e sorria. Isso me matou pelo menos duas vezes, nada pude fazer além de sentir, mas tive uma esperança ardente de que ela não estivesse perto só um pouquinho para que eu pudesse desfrutar da atenção de Camila.

— Onde está sua esposa? – perguntei.

— Ela não é minha esposa de verdade – contou – só minha colega de curso. Falamos assim de brincadeira...

Oh...

Então... Oh! O que é tudo isso?

A vertigem riu e se balançou em minhas costelas. Minhas coxas tremeram. Meu coração rodopiou e rugiu se expandindo tanto que faltou espaço e me sufocou.

— Sinto coisas estranhas – deixei que as palavras fugissem de meu interior.

— Que coisas estranhas? – perguntou. 

Escapei de meu controle e peguei sua mão tão quente para levar ao meu peito onde o meu coração fervia e nada fazia sentido. Eu nunca me senti assim. Era tão louco que doía mais que eu pudesse compreender, mas eu já não compreendia muita coisa se for para ser sincera.

— Aqui, mas eu não entendo – fui mesmo sincera assim como Camila fez uma expressão engraçada seguida de uma mais suave que não sei se eram boas ou ruins.

— Não é nada grave – murmurou, seus olhos nos meus, que caíram e rodopiaram dentro dos delas a puxando para dentro de meus músculos vibrantes. 

— Não? - duvidei mesmo, mas Camila garantiu:

— Não – e sorriu – eu sou quase médica, lembra?

OH!

É verdade.

— Obrigada, Camz.

— Você é tão doce...

O quê?

— Sou?

— Sim – mostrou que não fora uma frase aleatória, mas...

— Como sabe disso?

Que louco!

— O que? Como assim? – perguntou como se minha pergunta não fosse normal.

Não era? É que...

—Você nunca me colocou na boca – a lembrei e Camila ficou bem vermelha. Parecia um morango e eu gosto muito de morangos.

— Eu não quis dizer nesse sentido – gaguejou – eu apenas estava dizendo que você é uma pessoa bem amável às vezes, boa como chocolate.

Oh! Não faz muito sentido, mas entendi.

— Você gosta? - perguntei

— Gosto muito – ela disse baixinho.

Bom, ainda seguindo Rochefoucauld, quando praticar qualquer falta, procure remediá-la e não desculpá-la. Eu havia cometido algumas aquela manhã e Camila merecia um agrado por isso. Foi por isso que a deixei, mentalizando um pedido até chegar na vendedora, mas usando Dinah para pedir por mim porque sou um fracasso.

Camila olhava para baixo quando cheguei, então para que visse o que tinha antes que eu morresse, mostrei para ela o chocolate que fez com que me olhasse com os olhos bonitos bem grandes.

— Eu vou com Vero na xerox – avisei e fiz com que pegasse o doce antes de sair porque simplesmente eu não aguentaria falar mais sobre sentimentos. Sinceramente foi tudo. Veronica me guiou e me ajudou como se soubesse desde sempre que eu não conseguiria. Ela era mesmo uma boa pessoa, e meu dia valeu a pena até que Peter me encontrou.

Suspirei ao entrar no carro.

- Posso dormir hoje? - sei que fui ingênua ao perguntar, nem estranhei sua risada.

- Seja boazinha e faça o que mandarem - ele disse, e foi tudo.

Fechei meus sentimentos e me concentrei em Camila. Eu a desejei ainda mais ardentemente ali que em qualquer outro lugar. Desejei ardentemente tudo enquanto tudo em mim ardia e me desgastava. Esse desejo ardente que me queimava e me consumia me deixava sã e sentindo algo que julguei mesmo ser amor.

Se Dakota não fosse dela, nem ela fosse de Dakota, então isso seria entre nós duas. Ardentemente assim mesmo.

LIVRO 2 - intensamenteOnde histórias criam vida. Descubra agora