Capítulo TRINTA E UM de estranhamente.
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É próprio da natureza humana, lamentavelmente, sentir necessidade de culpar os outros dos nossos desastres e das nossas desventuras, diz Luigi Pirandello, mas eu já não tinha a quem culpar. Meus pais? Eles já estavam distantes em algum lugar que minha mente desejava fervorosamente que nunca chegasse a mim. Peter estava morto, então eu nunca mais precisaria voltar para meu inferno. O resto só atribuo a mim, e dessa vez posso me culpar sem raiva. Não faz sentido a menos que você não tenha culpa de nada, mas ainda seja humano o bastante para sentir culpa por ser quem é. É parte da vida.
E Camila estava ali. Chorava. Parecia mais magra e pálida. Sua mão encontrou a minha e o meu indicador a tocou não só na mão, mas em meu espírito. Eu o senti ali, naquele momento. Notei que Camila não estava bem, mas não consegui dizer mais nada. Apesar da dor de mãos me contendo ter me deixado, tudo em mim ainda doía demais para suportar. Minhas palavras, ou ausência de palavras, poderiam - precisariam - esperar. Eu estava segura o bastante para me entregar.
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— Ela está aqui – ouvi a voz impossível de não reconhecer que era de Camila soar abafada, uma luz tão forte contra minhas pálpebras que não consegui enxergar muito bem – está aqui comigo... espere! Ei, Lern, estou falando com Ally. Ela estava te procurando.
- É claro que estava... - suspirei e busquei sua mão novamente porque naquele momento parecia irreal que estivesse mesmo ali, que eu tivesse acabado com tudo, acabado com ele... Sentir a mão de Camila me fez sentir mais viva, como se tudo pelo qual lutei voltasse em altas doses de carinho dentro de meu corpo, com minha alma que cantava docemente nos ouvidos de minha consciência de que eu havia encontrado meu repouso, meu lugar próspero e pleno de amor que lamentavelmente não tive por toda a vida. Sentir o calor de Camila me dizia que eu existia novamente.
— Ally, ela está aqui e você precisa vir, é urgente – ouvi Camila novamente dizer rápido – Bem. Venha. Preciso ir.
Camila desligou o telefone e se voltou para mim, tão linda apesar do ar aflito que eu quis dizer que estava tudo bem, que eu estava feliz e estaríamos bem a partir de então, que nada mais iria nos machucar. Que eu matara Peter, mas que eu ainda era uma boa pessoa. Que eu sentira muita saudade. Que eu a amava mil vezes mais a cada segundo que pensara nela e ela era tudo o que tinha valido a pena pensar para não enlouquecer de solidão e no meio de meus pensamentos assassinos tão sombrios. Que logo tudo passaria. Quis dizer muito, mas nada escorregou entre meus lábios porque eu tinha atingido um nível de silêncio por todo aquele tempo que eu não tinha muita esperança de ter voz o suficiente, mas que sabia que precisaria encontrá-la logo.
— Agora estamos juntas – me disse como se eu não tivesse percebido, mas não me movi contra sua obviedade – pode conversar comigo ou não sobre o que aconteceu se quiser, mas saiba que vai precisar falar sobre isso em breve com estranhos.
Oh... Claro.
Pensei por menos de um minuto até concluir o quão segura Camila era para me ouvir dizer coisas tão complicadas para seus ouvidos. Sempre tive ciência de que falar sobre matar alguém é menos difícil que ouvir alguém que você ama dizer isso. Sobretudo quando se tem a alma íntegra. Não que eu entenda de alma, mas a de Camila com certeza era mais limpa que meu desespero. Eu estava muito em paz, talvez ela entendesse isso e não se assustasse tanto.
Eu ensaiei contar para ela, mas entrou seu professor médico.
— Que bom que está acordada – sorriu – seus exames de sangue e toxicológico acabaram de ficar prontos.
Oh...
Apertei a mão de Camila porque não tinha uma sensação muito boa sobre isso, me deixando sobre controle o fato de que ela não me soltou para olhar os exames naquele aparelho eletrônico, minha apreensão atingindo o ápice quando ela ficou pálida e balbuciou:
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LIVRO 2 - intensamente
FanfictionLEIA PRIMEIRO ESTRANHAMENTE!!! Essa é a versão da Lauren dessa fanfic. Conteúdo EXTREMAMENTE sensível, cuidado.