22. X9 na favela

703 21 1
                                    

🐆 | Maria Fernanda.
12h36, terça-feira.

Até que enfim uma manhã tranquila aqui no trabalho, consegui sentar pra almoçar com calma e junto da Ana, que hoje tinha pego o mesmo plantão que eu.

Ana Alice: Ein, quando voltam tuas aulas mesmo? — Me lembrou chega fiquei animada, faltava tão pouquinho pra terminar.

Mafê: Agora no finalzinho de Agosto já.

Ana Alice: As minhas começam em Setembro só. — Ela choramingou.

Mafê: Mas falta pouquinho, já já a gente termina.

Ana Alice: Se Deus quiser né, porque me falta vontade de ir pra aula.

Mafê: Quanto mais aula pegar, mais cedo a gente termina, doida.

Ana Alice: Fala por você que dá conta, meu amor eu peguei DP du-as ve-zes!

Mafê: Chacota, Ana Alice. — Dei risada. — Tu se ferra porque falta mais que tudo.

Ana Alice: Me dá preguiça. — Ela fez careta.

Foi graças à faculdade que a gente conseguiu uma vaguinha de emprego aqui na UPA, na época do nosso primeiro estágio a Vivian, chefe das enfermeiras daqui gostou de nós duas e nos efetivou. Isso foi bem no início do curso mesmo, quase quatro anos atrás.

E agora falta pouco para eu me formar e conquistar meu tão esperado diploma, não via a hora de ter o gostinho de estar formada.

Mafê: Já se resolveu com o Kauê? — Olhei bem curiosa pra mensagem que ele havia acabado de mandar.

Ana Alice: Ele foi lá em casa ontem. — Começou a falar e eu olhei pra cara dela já sabendo do resto. — Aí Mafê, nem vem.

Mafê: Não abri minha boca ainda.

Ana Alice: Mas eu te conheço. — Revirou os olhos. — Ele se desculpou e tá tudo certo, não tem pra que ficar de cara fechada pra sempre pra ele.

Mafê: Tá, né. — Dei de ombros e ela mudou o assunto comentando uma fofoca do morro. — Como tu não me falou isso safada?

Ana Alice: Mas isso foi ontem. — Ela desbloqueou o celular e abriu a galeria me mostrando uns prints. — Lembra dela né? — Mostrou a foto de uma menina que estudou com a gente mais nova.

Mafê: Lembro, da igreja né?

Ana Alice: Da igreja sou eu amor. — Ela riu passando pro lado e eu olhei boquiaberta pra foto. — Essa foto tá rodando todos os grupos do whatsapp. — A Cassiane, menina que estudou com a gente aparecia em uma rodinha com mais quatro homens, tava mamando um cara e com uma fantasia de coelhinha uó.

Mafê: Que porra é essa? — Soltei uma risada alta. A Ana Alice bloqueou a tela e me olhou morrendo de rir.

Ana Alice: Da igreja né? — Falou ainda rindo.

Mafê: Garota, deixa a família dela saber disso!

Ana Alice: Fernanda! — Ela segurou meu braço alterada. Quando se tratava de fofoca a Alice virava o cão. — A mãe dela desceu a porrada nela na frente de geral, você tá em que mundo que não ficou sabendo disso? A treta toda aconteceu na tua rua, garota. — Abri a boca mais chocada ainda. A Cassiane morava na mesma rua que eu, porém duas casas acima.

Mafê: Que horas foi isso?

Ana Alice: Ontem a noite, umas sete. Você não tinha chegado do trabalho não?

Mafê: Ontem eu fui jantar com o L8. — Falei baixo e ela me encarou indignada. — Tu não me deixa falar, ué.

Ana Alice: Já tá nessa de ficar saindo com ele, é?

Mafê: E com o sobrinho. — Pontuei.

Ana Alice: Ele tem sobrinho?

Mafê: Disse que tem, mas o menino tinha um carinho muito grande por ele, o chamou de pai e tudo.

Ana Alice: Choc. — Colocou a mão na boca. Não sabia se ela tava chocada com a parada da Cassiane ou com a outra revelação. — Já vi que não posso ficar um dia sem ver tua cara que eu já perco um monte de fofoca.

Mafê: Não sei que monte. — Ri, levantando pra lavar meu pote. Outros funcionários haviam chegado na cozinha e nós duas saímos para liberar espaço.

💋 | Braga.
19h21, terça-feira.

Braga: O que tu quer? — Encarei a Carolina parada na salinha da boca.

Carolina: Viu o Leonan? Não falou comigo o dia inteiro.

Braga: Tá fora do morro. — Menti com a minha melhor cara pra ela, que me olhou de volta mas logo saiu da boca.

Xadrez: Pra que mentir pra garota? — Empurrou meu joelho com o braço.

Braga: Ah, garota chata. Leozinho pode nem cagar que ela quer saber onde tá.

Xadrez: Namoro dos outros e tu se metendo.

Braga: Me meto mesmo, Leozinho é meu irmão. — Nem liguei pra isso, Elias só negou com a cabeça e voltou a separar a coca em saquinhos.

Xadrez: Tem nada pra fazer não, pô? — Me olhou de lado.

Braga: Nadinha. — Revirei os olhos, escutando na mesma hora o L8 me chamando no radinho.

L8: Cola aqui na casinha. — Peguei minha pistola e coloquei na cintura indo pra minha moto lá fora. Cheguei em papo de dois minutos na casa de tortura.

Braga: Qual foi? — Olhei o moleque amarrado na cadeira. Estavam ao lado dele L8, Leozinho, Espinha e o Kauê.

Leozinho: Esse merdinha tá de x9 na favela.

Espinha: Só quero que ele abra o bico pra falar a mando de quem que ele tá aqui. — O Espinha puxou a cabeça do cara pelo cabelo.

L8: Tá calado depois da coça, né menor? — Olhei ele por completo, não parecia ter mais de vinte anos.

- Já disse que eu não vou falar nada. — Mesmo cheio de sangue no rosto e machucados pelo corpo, o infeliz abriu um sorriso fraco. — Como tá a família, Espinha? — Olhou pra ele e todos nós encaramos o Espinha. — Tua irmã ainda continua gostosa? — Sua pergunta pareceu mexer bastante com o Espinha.

Espinha: Melhor tu calar a sua boca, seu pau no cu! — Ele deu só um chute na cara do maluco, o que foi o suficiente pra deixar ele desacordado.

L8: Quem é esse menor? — Perguntou pro Espinha.

Espinha: Não sei caralho, nunca vi esse merda na minha frente.

Kauê: E que papo é esse de irmã? Pensei que tu era filho único.

Espinha: Namoral, isso não é da conta de vocês.

Braga: Mas desde o ponto que ele toca nesse assunto é porque sabe que é um dos seus pontos fracos. — Falei olhando entre o moleque e o Espinha. — Já que tu tem essa irmã, deveria protegê-la, pela forma que ele falou ela pode sim tá na mira seja lá quem for o chefe dele.

Leozinho: Braga tem razão.

Espinha: Esse bagulho eu resolvo depois. — Ele esfregou o rosto, estava aparentemente inquieto. — Tua missão é descobrir quem é esse mandado. — Apontou pro Kauê, que confirmou. — Tu e L8, preciso de vocês em Lucas pra cuidar de uma parada pra mim. — Apontou pra mim e pro Araújo.

Leozinho: E eu?

Espinha: Brinca aí com esse filha da puta, mas deixa vivo que o dele vai ser cobrado mais tarde.

Um novo (re)começoOnde histórias criam vida. Descubra agora