Capítulo5

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Acordei sentindo meu corpo inteiro dolorido, como se tivesse caído ou apanhado, mas a maior dor estava lá, latente, a perda de Nop doía muito mais, ele era meu noivo, meu melhor amigo, a pessoa mais importante para mim, quem me dava segurança e força, lembrar que ele havia partido me deixava um vazio imenso, desejava com todas as forças que Deus tivesse piedade da minha dor e me levasse para junto dele, enquanto eu me remoía pensando na morte que se recusava a me levar, senti um enjoo tomar conta de mim, acompanhado de uma forte dor de cabeça, me remexi na cama ainda de olhos fechados tentando disipar a sensação e não querendo encarar a minha realidade, então um leve cheiro refrescante invadiu minhas narinas me fazendo eu me sentir bem momentaneamente, por alguns instantes acreditei estar segura, ou quem sabe eu estava apenas delirando, mas alguém ao meu lado se remexeu também me fazendo perceber que eu não estava sozinha, automaticamente abri os olhos avistando um rosto que me parecia tão familiar e ao mesmo tempo tão desconhecido, afinal eu não conhecia aquela moça adormecida, mas sua feição era serena apesar do semblante cansado, pisquei algumas vezes antes de lembrar-me que fora ela a minha salvadora na noite anterior, por uns instante achei que houvesse alucinado sua chegada, mas aqueles olhos marcantes se abriram e me fixaram antes de esfregar os olhos e me fazer perder o ar por breves segundos, meu primeiro pensamento foi que o céus me haviam enviado um anjo com os mesmos olhos de Nop para me levar, mas dentro de mim uma sensação de estar segura me impediu de gritar ou racionalizar o fato de uma estranha estar deitada ao meu lado.

- Bom dia - sua voz rouca ressoou em um sussurro me fazendo arrepiar por alguma razão desconhecida.

- Quem é você? - questionei sem pensar, e automaticamente me recriminei por ter feito a pergunta. Droga Mon! Não se pergunta a Anjos quem eles são, mas e se eu não tivesse morrido? Ela me encarou como se estivesse tentando entender minha expressão confusa.

- Eu sou Sam....- disse sentando-se na cama - Samanan Anantrakul- seu olhar sério parecia preocupado.

- Eu...acho que me lembro - eu estava confusa, era bem verdade, mas seu nome me fez lembrar que Nop tinha uma irmã, mesmo que eu nunca a tenha visto até aquele momento, Sam se levantou, então notei que ela trajava a jaqueta de couro de Nop, suas luvas e seu boné, os cabelos estavam embaraçados sobre seus ombros.

- Preciso fazer uma ligação - ela tinha o aparelho celular nas mãos, eu não a havia visto pegá-lo, mas estava distraída demais em meus pensamentos, ela saiu do quarto.

Alguns segundos depois comecei a entender o que havia acontecido e as coisas começaram a fazer sentido, eu não havia visto Nop ontem a noite como imaginara, nem recebido a visita de um anjo, eu apenas havia visto alguém muito parecido com ele, alguém de que nós havíamos falado muito pouco durante nosso relacionamento, sua irmã Sam, quando Nop bebia e se sentia culpado por algo que ele fizera a ela, surgia trechos de uma história confusa entre eles, Nop nunca a mencionou sóbrio, mas sempre que bebia a culpa parecia tomar conta dele e frases desconexas sobre seu relacionamento com a irmã e o pai apareciam.

Sam apareceu na porta e me fitou cautelosa, por alguma razão aquilo me lembrou Nop, ele costumava agir exatamente assim quando não sabia o que fazer ou dizer, sua feição ao me olhar dava a certeza de que eles eram muito parecidos, nada se comparava aos olhos idênticos aos dele, era um traço inegável dos dois, quando ela me olhou eu pude sentir os olhos de Nop sobre mim, encarei aqueles olhos me perdendo neles por alguns segundos, estavam preocupados? Ela estava preocupada comigo ? Sem perceber lágrimas começaram a cair de meu rosto, pensar que ela estava preocupada com alguém que virá a poucas horas me fazia sentir gratidão e dor, Nop nunca mais me olharia ou se preocuparia comigo, senti uma fisgada no peito, ele havia partido, mas acabava de me enviar um anjo.

- Mon...Tudo vai ficar bem - Sam atravessou o quarto e se juntou a mim na cama, depositou sua mão sobre a minha de modo acolhedor, tinha os olhos marejados de água quando me abraçou de forma protetora - Eu cuidarei de você - ela disse em sussurro, sem nem conhecê-la direito eu soube, ela estava ali por mim, por ele, e me manteria segura, bem e lúcida.

O carrinho do supermercado andava entre as prateleiras, as pessoas me encaravam como se eu fosse louca, certamente devido ao fato de eu estar vestida de noiva, e com um sobretudo de Ian sobre os ombros, a barra do meu vestido tinha grandes manchas marrons e se arrastavam na lateral do carrinho, eu havia posto um enorme óculos de sol que claramente não disfarçava o quão mal eu estava, afinal minha maquiagem borrada e meus olhos inchados e cheios de olheira eram o que eu tentava esconder, assim eu me encontrava encolhida dentro do carrinho de supermercado depois de Sam havia me arrastado até ali para fazer algumas compras, afinal a geladeira de Nop estava vazia a dias, ela me empurrava em silêncio pelos corredores do mercado enquanto colocava alguns mantimentos dentro do carrinho.

- Gosta de Bangkok? - Sam quebrou o silêncio que se fazia presente desde o momento em que saímos de casa.

- Um pouco - eu respondi

- De onde você é ? - continuou ela, perguntas fáceis, estava claramente me distraindo, ou me conhecendo talvez.

- Phuket - respondi.

- Nunca fui - disse ela pondo mais algum produto dentro do carrinho - Dizem que é muito bonito.

- Nop também não - sorri fraco relembrando - Íamos para lá na lua de mel - disse sem pensar.

- Para Cidade? - perguntou ela

- Não, Karon, a praia - eu disse sem vontade de lembrar de nada daquilo, porque mesmo a estava respondendo? Ah sim, educação.

- Você costuma ir muito lá? - perguntou ela pondo mais alguns itens no carrinho.

- Não - eu disse, e era verdade - não desde que conheci Nop.

- E quando foi isso? - disse ela analisando uma caixa de suco.

- Faz...dois anos - eu respondi, me lembrava bem do dia.

- Dois anos...- ela sussurrou muito baixo, e depois disso o silêncio retornou entre nós.

Todas aquelas perguntas me fizeram cair a ficha de que tudo que planejei com ele, nunca mais se concretizaria, não iriamos a praia, e nem a nenhum outro lugar juntos, porque ele nunca mais voltaria, quando voltamos finalmente para casa, Sam preparou uma sopa, e apesar de não ter comido ainda, eu me sentia enjoada sem vontade, comecei a sentir uma necessidade de ar, como se meus pulmões estiverem falhando, levantei da mesa com a sensação de que ia vomitar, mas ao chegar no quarto, uma crise de choro me acometeu, Nop nunca mais estaria ali, não teríamos momentos juntos, ele era tão jovem e cheio de vida.

- Porque Nop! Porque - comecei a questionar, eu estava surtando, tirei as roupas dele do armário, os pertences caindo no chão, e quanto mais eu revirava suas coisas, seu perfume entrava nas minhas narinas me tirando o ar, como se fosse tóxico, comecei a gritar em desespero, o ar estava faltando ao meu redor, me debati de algo que me prendia - Porque ele e não eu! Porque Nop você me deixou sozinha! Porque! - berrei, então vi os olhos de Sam, e sem hesitar, ela acertou um tapa em meu rosto, pois um segundo aquilo me fez voltar  e de repente o ar voltou a me faltar, como se alguém agarrasse minha garganta me prendendo ali, eu precisava tirar aquele vestido, estava comprimindo meus pulmões, ou eu assim acreditava naquilo.

- Eu... não consigo.... respirar..... - consegui dizer, enquanto tentava abrir o zíper do vestido, então senti o alívio de respirar quando Sam abriu o zíper abrindo o vestido, como se tivesse me libertado de amarras das quais nem eu sabia que me prendiam, só que me sufocavam.

Linhas Cruzadas (Sam&Mon)Onde histórias criam vida. Descubra agora