Capítulo 8

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"Duas estradas se bifurcaram no meio da minha vida

Ouvi um sábio dizer

Pegue a estrada menos usada.

E isso fez toda a diferença cada noite e cada dia."

- Larry Norman

Naquela manhã eu havia acordado decidida a seguir em frente, a pedir perdão a Nop, queria passar a ele todo meu amor, e foi por isso que eu estava ali em frente ao templo onde o monge Amint me aguardava, havia ligado cedo a ele pedindo para vê-lo, e prontamente ele me atendeu, antes de sair do carro encarei Mon, ela estava bem aquela manhã, até mesmo mais sorridente que nos últimos dias e levemente mais saudável também, pois voltará a comer, ainda que pouco, ela até mesmo havia comido bem no café.

- Não vou demorar - disse dando-lhe um sorriso brando e saindo do carro

- Está bem - ela assentiu. Antes de eu ir me virei para ela novamente

- Er.. - eu parei ao lado da porta de Mon - Você não quer sair..tomar um pouco de ar, ver o jardim? - ela sorriu novamente, talvez um pouco de sol lhe fizesse bem.

Ela assentiu e abriu a porta do carro como uma menina travessa, sorri ao vê-la melhor, Mon caminhou na direção dos jardins do templo, dei as costas ao carro e adentrei ao templo, estar ali me fazia lembrar de meu pai, observei as pinturas nas paredes e a decoração do lugar, o cheiro de incenso e perfume com flores adentrou minhas narinas, quando cheguei até a imagem de Buda juntei as mãos e me inclinei em uma mesura e depois a observei pensativa, seria possível me livrar da culpa? Diante daquela imensa imagem eu achava que não, mais implorava internamente a ele que me desse essa remição, senti alguém se aproximar.

- Samanan! Querida, que bom vê-la - o Monge Amint disse sorrindo, então se curvou me cumprimentando, fiz o mesmo - Como está, minha menina? - Questionou ele me puxando para um caloroso abraço, afinal ele me vira nascer.

- Não está sendo fácil - disse a ele em um suspiro.

- Eu sei, me alegra muito que tenha vindo falar comigo. Estava pensando em você - disse ele sentando-se em um dos bancos, eu o acompanhei - Porque não foi a cerimônia fúnebre de seu irmão? - disse ele direto e certeiro assim que estávamos acomodados.

- Eu..- hesitei, pega de surpresa pelas palavras diretas dele, mas sabia porque não havia ido, e essa pergunta não era mais uma dúvida - Honestamente...eu não pude...

- Sam, deve aceitar todas as etapas do luto, assim como fez com seu pai - disse ele carinhosamente.

- É diferente..... - disse sentindo as lágrimas alcançarem meus olhos - Não voltei a ver Nop porque não quis, foi culpa minha... O tratei muito mal nos últimos anos de sua vida.... Como eu supero isso ? - questionei o monge que me olhava com carinho fraterno.

- Tens tentado orar por ele? - o monge perguntou, eu nunca fora de orar, mas até isso eu havia apelado, as coisas pareciam não estar dando certo para mim.

- Ontem eu lhe escrevi uma carta ... - limpei o canto dos olhos.

- Isso é bom, tens que tentar tudo, até que encontre algo que funcione - disse ele sabiamente.

Após conversarmos mais um pouco, recitamos um mantra por Nop, e isso me fez bem, me fez perceber que eu precisava me despedir dele, ou tentar, mesmo que aquilo fosse doloroso, ele era meu único irmão, e perdê-lo fora horrível, mas não dizer adeus a ele era uma dor muito pior, e por alguma razão eu sabia que precisava de Mon para fazer isso, receava por aquele momento, e se eu pedisse que me acompanhasse até o cemitério, será que ela aceitaria?

Ao sair do templo pensativa avistei Mon deitada sobre a grama, tinha o braço sobre os olhos e um sorriso leve nos lábios, parecia apreciar o jardim que ali tinha, caminhei até ela e uma brisa leve soprava um cheiro de rosas sobre meu rosto, renovando minha alma, ao me aproximar dela a encarei parando bem em frente ao seu sol, ela abriu os olhos e se levantou, apoiando o corpo sobre os cotovelos e abrindo um sorriso.

- Já está livre de todos os seus pecados? - brincou ela.

- Sempre - disse sorrindo, Mon sabia moldar meu humor como ninguém, só de vê-la bem e de bom humor me fazia sentir melhor - Vamos? - perguntei e ela assentiu.

Meia hora mais tarde estacionei o carro e comprei algumas flores, Mon ficou apreensiva no banco do carona mas não disse nada, andei mais uns metros e entramos no cemitério, Mon se remexeu assim que estacionei o carro.

- O que estamos fazendo aqui nesse lugar tão horrível? - me perguntou entre apavorada e horrorizada por eu ter estacionado ali - Eu não sei se quero estar aqui - suas mãos tremiam.

- Temos que fazer isso ...- Olhei em súplica, Mon já tinha lágrimas nos olhos.

- Eu não tenho que fazer nada! - disse com a voz alterada

- Tem razão, você não precisa fazer nada que não queira - disse respirando fundo e voltando a olhá-la - Mas eu preciso fazer isso, Mon, e eu não posso fazer sozinha. Então. Poderia me ajudar por favor?

- Não entendo o que quer fazer aqui - ela passou a mão sobre os cabelos em um gesto claro de desespero.

- Eu preciso me despedir do meu irmão, Mon - disse de modo rude.

- Seu irmão?! - ela devolveu as palavras um pouco histéricas - Ele era meu noivo, Sam! - disse cuspindo as palavras para mim - Meu melhor amigo, minha família....

Eu estremeci, as palavras de Mon me atingiram feito pedradas, ela tinha razão, mas precisávamos nos despedir dele, para dar paz a ele e a nós mesmas, e mesmo que isso não fosse algo que ambas quiséssemos fazer, juntas seria menos penoso. A abracei forte e carinhosamente por um longo tempo, quando ela se acalmou do seu choro copioso e dolorido eu a encarei nos olhos.

- Nem ele ... e nem nós vamos ter paz se não fizermos isso, por favor Mon...Preciso de você - disse a ela, Mom baixou os olhos e suspirou depois assentiu, finalmente se rendendo, saímos do carro em silêncio, parei ao seu lado e estendi a mão para ela, e de mão dadas seguimos até o túmulo dele.

Se despedir de alguém que se ama é algo necessário e doloroso, às vezes é amargo, e tudo que você precisa é entender que as coisas seguem caminhos turbulentos, na minha vida jamais imaginei que ficaria completamente sozinha, e me vendo agora poderia dizer que sim, eu estava sozinha, minha mãe morrera muito cedo, meu pai havia partido a alguns anos atrás e agora meu único irmão também havia me deixado, irônico pensar que ele me deixara, quando eu o deixei primeiro, mas a ordem dos fatos não altera os resultados, não era mais fácil para mim estar no mundo sem a minha família, mas os caminhos que trilhamos são misteriosos e cheios de surpresas, algumas boas outras ruins, e isso não é o fim do mundo, só precisamos aprender a entender o que de nós a vida quer, e às vezes ela só quer lhe mostrar um caminho mais tranquilo e livre das amarras do mundo superficial, e lhe ensinar e dizer que pode recomeçar sem ter medo, pois as vezes o fim é só o começo de algo muito maior que nem imaginamos.

Linhas Cruzadas (Sam&Mon)Onde histórias criam vida. Descubra agora