Sodo.
Quando consegui levantar, usando as paredes como apoio, ouvi ao longe a luta corporal e a discussão entre Tony e Drake, levei a mão até a nuca, e senti uma dor ainda maior, e pude sentir que meus cabelos estavam úmidos. Caminhei aos pouquinhos até a sacada, da forma como a tontura me permitia dar os passos, mas parecia que lá embaixo estava um silêncio total.
Senti minhas lágrimas derramarem por meu rosto, parecia que esse pesadelo não teria fim.
O que eu consegui ver foi que lá embaixo tinha uma piscina, e isso não era um bom sinal, pois além de ser uma água completamente suja e asquerosa, Theo não sabia nadar, e mesmo soubesse, naquelas condições seria algo difícil. Spencer saiu correndo após emergir na outra ponta, saindo da água, e eu tentava ver Rain ou Theo, mas não obtive êxito, e com todas as forças que eu nem sei onde surgiram, eu comecei a correr escada abaixo para procurá-los.
A dor que eu sentia era intensa, eu ia cambaleando por aquele caminho, mas isso não era nada se comparado a todo o medo que estava sentindo de algo ter acontecido ao meu filho, aquilo não era nada perto da angústia da sensação de ter meu bebê arrancado de meus braços sem que eu pudesse fazer algo para impedir.
Quando cheguei àquela piscina, me ajoelhei na beirada, em prantos, e nada na movimentação daquela água parecia ser os meus meninos, o fato de estar mais escuro do que quando chegamos não ajudava muito.
-Theo? Rainny? -gritei.
Mas não houve resposta, por cima da água havia um grande plástico que se misturou a eles quando pularam lá dentro, e alguns segundos depois pude ver Rain subindo com dificuldade, segurando Theo com um braço, e com o outro, nadando e tentando se livrar daquele plástico infernal. Quando os vi pulei na água na mesma hora para ajudá-lo, aquela água estava absurdamente gelada, e Theo não estava consciente.
O colocamos deitado no chão, o posicionei adequadamente para que pudesse fazer a massagem cardíaca, eu sabia que uma hora ou outra esses treinamentos seriam úteis, e primeiros socorros foi uma promessa que eu fiz, que aprenderia, assim que o Theo pode ir para casa quando nasceu. Apesar do meu medo, aquele momento era delicado, somente nós estávamos ali, e a situação era de emergência, então, era fundamental que eu mantasse o foco exclusivamente no que eu estava fazendo, apesar de todo o meu medo e apreensão. Logo na primeira parte das compressões, ele conseguiu cuspir a água, e abriu lentamente os olhos, e respirei aliviado.
Ele continuou tossindo, e eu o trouxe para meus braços, tentando inutilmente o aquecer, ele tremia, seus lábios estavam roxos e seu corpo todo gelado. Olhei para Rain, com o maior olhar de gratidão que eu conseguia transpassar.
-Obrigado, meu amor! -falei chorando.
Olhando agora o rosto do Theo, notei que o que parecia ser sangue na verdade era terra que estava grudada em sua pele, misturada com as lágrimas dele. Mas ele tinha hematomas, o que me deixou igualmente preocupado.
Aquele foi um dia que eu realmente gostaria de apagar da minha memória, ou melhor ainda, gostaria de apagar da história, de fazê-lo nunca ter existido, mas eu tentava me apegar ao fato de que tudo acabou bem, o pior não aconteceu, ao menos, não conosco. Drake deixou Tony muito machucado, ele precisou ficar uns bons dias no hospital. Drake estava em um surto tão nervoso, que no mesmo dia foi encaminhado a uma clínica psiquiátrica, e sabíamos que preso lá, ele não teria chances de sair, o que me trouxe um grande alívio. Spencer confessou tudo o que tinha feito, e se disse arrependido, aguardamos seu julgamento, e assim como o porteiro, teve sua sentença. E Theo, estava se recuperando com a ajuda de um tratamento psicológico. Ele ainda tinha muito medo de ficar sozinho, do escuro, e de estranhos, sem falar na água, que nem na banheira ele queria entrar mais, mas, aos poucos isso passaria, estávamos cuidando da melhor forma possível, com os melhores profissionais.
Basicamente uma semana depois de termos sobrevivido a esse episódio traumático, eu cheguei em casa e me deparei com uma carta, e quando eu achei que as coisas estavam caminhando para dar certo, que nosso pesadelo já tinha acabado, senti meu coração ser partido mais uma vez:
"Dewdrop, eu não gostaria de fazer isso desta forma, mas eu sou um covarde assumido, e por vários dias não tive coragem de olhar nos seus olhos e deixar tudo em panos limpos. Você e o Theo foram sem sombra de dúvidas o melhor presente que a vida poderia ter me dado em todos esses anos, eu não conseguiria expressar o quanto o que eu sinto por vocês é forte, e não consigo sentir mais nada além de culpa por tudo o que aconteceu com vocês nesse curto período de tempo. Vocês se envolveram em problemas que não mereciam, que eram para eu ter passado sozinho, mas acabaram indo junto de brinde, e eu jamais me perdoaria se acontecesse alguma coisa com o Theo. Pensando no bem de todos, eu estou partindo, esse relacionamento tem se mostrado inseguro para vocês desde o início, e justamente por amá-los, eu preciso me afastar. Não sei o que mais pode acontecer se continuarmos juntos, e tenho medo de saber, por isso, prefiro não arriscar mais. Cuide bem do nosso pequeno, certamente ele merece o pai amoroso e dedicado que tem, e eu realmente espero e torço para que você encontre a felicidade verdadeira de um amor leve e seguro, que não os coloque em risco constantemente. Nunca se esqueça disso: eu te amo!
Rain!"
Aquilo fez o meu mundo girar, e eu tive que sentar, incrédulo, e até poderia duvidar se não fosse a letra dele naquele papel. Ele não tinha esse direito de decidir por nós, sem me consultar primeiro, não, não tinha. Tentei ligar, mas a ligação se estendeu até cair, as minhas mensagens não foram respondidas, e eu fiquei naquele vazio, sentindo aquela dor quase insuportável, que me tirou o sono, a fome, e se não fosse pelo meu filho, eu diria que até a vontade de viver. Rain sumiu, ninguém sabia de seu paradeiro, nem mesmo os seus amigos, ao menos, se sabiam, não me disseram.
Eu não tinha mais forças para isso, eu não tinha mais reação, me sentia perdido, como um barquinho em alto mar em meio a uma tempestade severa. Me sentia de mãos atadas, sem saber para onde ir. Os únicos momentos em que eu realmente conseguia estar na realidade era com o Theo, e ainda assim, ele volta e meia perguntava do papai Rain.
Como era possível o amor machucar tanto?
Ao menos Papa disse que ele não tinha saído da banda, então, minhas esperanças brotavam ao pensar na nossa agenda de shows, eu ainda acreditava que ele estaria lá, que poderíamos conversar pessoalmente e resolver essa situação, eu não aceitava que nosso fim se daria daquela forma, pelo menos um último abraço dele eu precisava.
~x~