Onde Reside o Desejo (Concluído)

.19.

ELA

Eu não assistia televisão o suficiente para saber como era um palácio de versalhes, ou pelo menos era onde eu imaginava ter noção de como poderia ser. Quando me olhei ao sair de casa, me achei arrumada demais, com toda a composição. O vestido, a meia calça, as luvas, o penteado que levou a tarde inteira de Abuela e me fez dormir sentada. E as jóias.

A caixinha que minha avó havia tirado do baú antigo naquele dia era isso, um conjunto de jóias de ouro branco, com uma única pérola de pingente. Era único, e meus olhos marejaram quando eu os toquei. Aquilo me chocou. Como ela poderia ter permitido que Teresa e eu passássemos necessidade tendo uma jóia dessas em casa, que com certeza pagaria alguma coisa que comêssemos. Inacreditável. Mas toda minha raiva passou quando ela me respondeu minha pergunta.

-Era da mamãe? - Perguntei para minha avó.

-Sim, não o perca. - Ela sorriu. Abuela sorriu para mim, e eu murchei da raiva.

Ela continuou falando sobre meu cabelo, mas eu estava encantada, vestida como minha mãe se vestia, falando dela tão abertamente com minha avó sem estarmos brigando.

Na mesa da família Castilho, olhávamos as damas descerem a grande escadaria dourado, um holofote bem focado no centro do salão, onde seus pais a recebiam. Estava tudo tão perfeito que eu acreditaria se me dissessem que estávamos no Palácio de Versalhes séculos atrás.

Quando Dale volta do banheiro, não olho para ele, que senta devagar e respira fundo. Percebo por minha visão periférica que seu cabelo está molhado, a água acentuando o cheiro que emana dele. Foco, Maria.

Deus, como eu pude ser tão tola? Imaginei que ele não viria, que essa personalidade toda que ele possui o limitasse a eventos assim. Geralmente eu acertava, pois Katherine estava em casa. Reparo na mãe de Louise, olhando ansiosa para a escada, esperando sua filha ser chamada. Seu colar de diamantes está brilhando até no escuro, largo o suficiente para cobrir uns três centímetros de pele. Ela era tão elegante em sua postura, as mãos delicadas e os dedos finos. Não havia uma única ruga em sua pele lisa, ou cabelo branco de preocupação e estresse entre seus fios loiros. Era a mulher mais bonita que já havia visto. E se consagrou como tal quando sorriu de uma ponta a outra do rosto.

-Georgina Louise Castilho Van Doren II. - A voz ecoou no grande salão e chegou até nós. Minha amiga apontou no topo da escada, e se Marjorie era a mulher, Louise era a garota mais bonita que eu poderia ver em toda a minha medíocre vida.

A pele branca dela é a primeira coisa que vejo, destacada pela luz. Seu vestido também é branco, como o das outras garotas, mas Lou foi criativa o suficiente para ter escolhido um tom de creme específico. Ela levou o tema a rigor, está completamente vestida como dama de honra francesa. Melhor, parece uma princesa. Seu vestido é claramente feito todo à mão, percebo enquanto ela desce a escada graciosamente. A renda delicada como plano de fundo do vestido, as pregas firmes nos cantos certos. Sem contar os bordados em fios brilhantes na extremidade do vestido. Louise usa um lindo colar de várias pérolas, que destacam seu colo nu, já que seu vestido vai de um ombro ao outro. Está perfeito. Frank está a espera dela, no fim da escada, suas mãos quase se encostando. Está sorrindo como jamais achei possível ver. Ele pega a filha e a leva para o meio do salão, todos aplaudem.

-Ele está tão feliz. - Escapa de meus lábios, mas apenas Dale parece ter escutado. Quando olho para ele, o vejo admirado pela irmã, sem tirar os olhos dela.

-É algum desejo obscuro e freudiano que meu pai tem em ver Louise num vestido branco, você sabe. - Seu comentário me faz rir, mesmo que tenha sido bem maldoso.

É a vez deles dançarem sozinhos, quando a abertura de A Flauta Mágica, de Mozart, começa a tocar. Só agora percebi ter uma orquestra inteira no lado esquerdo do salão. Eles dançam bem, Frank continua sorrindo.