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ELE

Meu quarto nunca esteve tão limpo. As máquinas foram embora, meus ferimentos começaram a melhorar, o tempo estava passando rápido. Eu não estava mais indo para a escola, e Louise continuava vindo até o meu quarto diariamente para me fazer companhia.

-Maria está começando a perceber que não estou falando com ela direito. - Lou disse em uma das noites na varanda do meu quarto. - Não sei até quando vou conseguir não falar com ela.

Naquela noite, me segurei para fazer mil perguntas sobre ela e sua saúde. Maria precisava de espaço, precisava ficar longe de mim. Eu não a merecia.

Minhas tentativas de falar com Olga foram todas falhas, ela nunca abria a porta para mim. No sábado, desci e tomei um banho de piscina demorado. Não sabia quando eu voltaria para casa outra vez. As dores da abstinência pioravam a cada hora, mas a medicação que o Dr. Krueger estava receitando ajudava bastante.

Me viro na cama, lembrando que é domingo de manhã e esse seria meu penúltimo dia em casa. Suspiro fundo. Uma batida firme na porta me faz sentar. Minha voz rouca do sono autoriza a entrada. Meu pai adentra o quarto, vestindo roupas casuais e ainda assim luxuosas.

-Está bem? - Ele pergunta.

Era a primeira vez em que o via desde a noite em que voltei drogado para casa. Por algum motivo, não é medo que me consome ao vê-lo. Acho que não posso ficar pior do que estou, pois meu rosto ainda está completamente desfigurado da surra que levei.

-Estou. - Respondo, tirando minhas pernas debaixo do edredom.

-A garota Conteras está lá embaixo. Quer falar com você. - Tento decifrar seu tom de voz, se há sarcasmo ou maldade. Mas meu pai está neutro.

Meu coração acelera. Não sei se estou pronto para ver Maria. O que eu vou contar para ela? O que eu posso contar?

-Porque está fazendo isso? - Questiono, realmente confuso.

O homem alto coloca as mãos na calça de linho, respirando fundo.

-Estou tentando fazer o certo. Deus sabe quando você vai ver ela de novo. - Ele pisca algumas vezes. - E Louise estava na sala quando ela chegou. Vou pedir que ela suba.

Dou um riso frouxo. Agora sim fazia sentido. Meu pai só não quer piorar mais a imagem para sua filha preferida. Nos encaramos, o silêncio preenchido pelos pássaros que cantam no jardim lá fora.

-Seja rápido. - Ele diz e sai do quarto.

Corro até o banheiro assim que percebo estar sozinho. A imagem do meu rosto no espelho me deixa triste, pois essa será a última coisa que ela verá antes de eu ir embora amanhã. Ainda não decidi se quero que ela saiba que eu irei amanhã. Faço um asseio rápido e visto uma camisa limpa. Poucos segundos depois, Maria bate na porta do quarto. Preciso respirar algumas vezes antes de conseguir abrir a porta.

O fato de que ela está linda me deixa triste. Eu não a mereço. Seus olhos amendoados se arregalam até suas íris escuras se perderem na parte branca de suas orbes. Ela parece estática, assustada pela imagem que vê.

-Eles descobriram. - Afirma, seus pés no solado da porta.

Dou passagem para que ela entre, fechando a porta atrás de mim. Seu corpo parece tenso, mantendo uma certa distância entre nós.

-Eles descobriram, não foi? - Ela repete, perguntando dessa vez, como se quisesse que eu respondesse que não.

Afirmo lentamente, passando uma das mãos pelo cabelo molhado.

Onde Reside o Desejo (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora