Um passeio a cidade

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Sob o céu matizado de cinza, a estrada serpenteava, revelando um cenário que alternava entre colinas verdejantes e bosques silenciosos. No volante, o peão seguia adiante, guiando o carro por caminhos intrincados que cortavam a paisagem rural. A distância entre a fazenda e a cidade próxima parecia esticar-se como um fio fino, desenhando uma conexão frágil entre o isolamento e a civilização.

Enquanto o motor ronronava, eu me envolvia nas nuances das montanhas à distância e nos campos vastos que se estendiam até onde a vista alcançava. A estrada, desafiadora em sua rusticidade, era uma dança entre curvas sinuosas e retas infinitas. No banco do passageiro, o vazio esperava, mas por ora, eu estava imersa na jornada, nas paisagens que se desdobravam diante de mim, talvez ainda não consciente da tristeza que se ocultava nas sombras do coração.

A relutância em rumar à cidade não era apenas pela busca de suprimentos; cada pessoa a mais na fazenda significava um fardo adicional nas despesas já sufocantes. Por que eu fui escolhida para esta tarefa, a essa altura, era uma incógnita que pairava sem resposta, talvez perdida na bruma da indiferença.

À medida que o carro avançava pelas ruas desoladas, a cidade revelava-se irreconhecível desde minha última visita. O silêncio imperava, quebrado apenas pelo sussurro do vento entre construções abandonadas. Casas trancadas, janelas bloqueadas como testemunhas de uma cidade que sucumbira ao tempo e à destruição. Os mercados, outrora centros pulsantes de atividade, agora eram testemunhas de assaltos passados, seus vidros quebrados como cicatrizes em um passado distante. Carros queimados e destroçados contavam uma história de caos e abandono, marcas indeléveis de uma época em que a cidade viveu tempos sombrios.

O peão ao meu lado, quase tão silencioso quanto eu, trazia consigo uma sombra de apreensão. Seus olhos permaneciam fixos na estrada, como se temesse despertar alguma ira latente em mim.

Sim ele está visivelmente com medo de mim.

Cada olhar evitado parecia um reflexo do receio de que, a qualquer momento, eu pudesse me transformar em algo incontrolável. O carro seguia adiante, e o medo silencioso entre nós criava uma atmosfera tensa, como se pairasse uma suspeita mútua que nenhum de nós se atrevia a verbalizar.

O dia passou rápido com a tarefa diferente, meio que me tirando da rotina. Confesso que tenho me isolado mais nos últimos dias, até deixei de usar meu Eco para falar com o Morphileon, meu amigo.

Essa ideia me atinge, uma culpa meio estranha. Então, dou de cara com uma loja de joias abandonada. Surpreendentemente, está lá, como se o mundo não tivesse mudado. No meio desse caos todo, as joias na loja brilham como lembranças esquecidas.

Faço um gesto para o meu companheiro enquanto entro na loja de joias , um lugar onde o tempo parece ter parado. Um sino suave ecoa delicadamente com minha passagem, interrompendo o silêncio tranquilo do local. A luz fraca do sol, filtrada pelas cortinas empoeiradas, dança sobre as vitrines, revelando tesouros esquecidos.

O chão de madeira rangente guia meus passos por entre balcões de madeira escura, exibindo delicadas peças artesanais. Candelabros e colares, agora envoltos em uma camada fina de poeira, contam histórias silenciosas de dias mais brilhantes. Nas prateleiras, anéis reluzentes e pulseiras silenciam-se diante do abandono, como guardiões de uma elegância que a cidade do interior parece ter deixado para trás.

O ar na loja é uma mistura sutil de nostalgia e quietude, como se as joias guardassem segredos sussurrados pelos tempos. Enquanto exploro esse refúgio intocado, sinto-me envolta por uma aura de tempos passados, onde cada peça parece ansiar por uma história que alguém esqueceu de contar.

Refúgio BrutalOnde histórias criam vida. Descubra agora