Tres pontas

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Do alto da minha posição, testemunho Marcelo ajustando cuidadosamente uma nova mochila nas costas de Red. Com uma muleta improvisada, eu auxilio Emeroson em suas primeiras atividades do dia.

Os rosnados ecoam ao meu redor, mas, sem ouvir através do Eco, mergulho na curiosidade e desvio o olhar. Concentro-me nas vibrações emanadas pelos dois, que aos poucos se codificam, revelando um intrigante diálogo não sonoro.

Marcelo, visivelmente ranzinza, desfere resmungos contínuos enquanto se expressa com irritação.
_Eu me esforcei como o diabo para conseguir essa carroça, e aí vem o 'bonito' causar sua destruição.

Ele amarra uma mochila com uma corda, emitindo mais reclamações.
_Vai carregar o peso, já que parece tão disposto!

Red nada diz porém seus olhos encontram o meu.
Por um estante e eu imediatamente me desvio deles.
Um sensação estranha me percorre mas eu a ignoro.

Distraído com Emerson, assegurando que ele esteja alimentado e pronto para partir, eu mesmo o coloco no cavalo. Enquanto me preparo para montar, sinto suas mãos poderosas em meu quadril, erguendo-me do chão e assentando-me na cela.

Ao olhar para baixo, deparo-me com dois olhos negros com tons esverdeados, nada humanos, encarando-me intensamente. Meus músculos contraem-se, uma onda de lembranças avivando a sensação de suas mãos guiando-me, fazendo-me reagir involuntariamente à sua presença intensa ontem a noite.

Ele ri suavemente e sussurra, provocante:
_Está confortável?
Concordo, enquanto ele pega a rédea, dando início à nossa jornada.

Volto meu olhar para ele, encontrando uma expressão maliciosa tomando conta dele, uma aura provocante pairando entre nós.

_Dormiu bem? - ele provoca, lançando um tom sugestivo.
Sinto minhas bochechas queimarem.
_Eu dormi, e você? - pergunto.
Ele solta uma risadinha.

_Tive uma noite incrível, embora quase não tenha dormido. Sonhei com uma prenda muito bem feita, - ele revela olhando diretamente para meus olhos com um ar sacana estampado em cada letra dita,

_A mais safada que eu já conheci.
_Marcelo! -interrompo-o, lembrando de Emerson, que nos observa de olhos arregalados, ansioso por captar cada detalhe de nossa conversa.

_Era uma bruxa, - ele diz de forma maliciosa, agora direcionando o olhar para Emerson.
_Ela soltava fogo pela pele e emitia sons que mexiam com o papai de uma maneira muito particular. - A malícia persiste em sua narrativa, provocando um ambiente carregado entre nós.

_E aí, pai? - o menino insistiu.

Marcelo soltou uma gargalhada profunda, um som grave emergindo de suas entranhas.
_Eu a mordi, e ela se derreteu ao meu redor.
_Nossa... - o menino disse impressionado.

Eu puxo as rédeas da mão dele, assumindo o controle do meu cavalo.
_A bruxa deve ter ficado bem decepcionada com essa luta rápida.

Um tom de ofensa relâmpago passa por seu rosto, e então ele ergue uma sobrancelha.
_Não chegou a ser uma luta, apenas um encontro surpresa, -ele pausa pensativo, - pela expressão de cansada dela, os dentes a deixaram bem satisfeita com o encontro, se eu desembainhasse a espada,.

Disparo o cavalo antes que ele conclua a frase. Emerson é uma criança, mas nem ele é tão inocente; em breve, saberá exatamente do que falamos. O ar fica carregado com um misto de risos e tensão enquanto avançamos pela paisagem.

Cavalgo junto a Emerson com uma graciosidade audaciosa, meu corpo se movendo em perfeita sintonia com o ritmo do galope. Sinto o vento brincar com os fios do meu cabelo, dançando ao sabor da liberdade que a jornada oferece.
_ulhuuuu!!!
Ele grita.

Nos olhos, há um brilho intenso, uma chama que se acende à medida que avançamos em direção ao desconhecido. Cada batida dos cascos é uma pulsação na trilha da aventura, e eu me deleito na incerteza do caminho. O sorriso em meu rosto reflete a paixão pela sensação de liberdade, uma conexão íntima com o instinto selvagem que a cavalaria proporciona.

Enquanto cavalgo, sou a mestra do meu próprio destino, amando a emoção de avançar rumo ao horizonte indefinido. O desconhecido é meu companheiro, e a jornada é tecida com a emocionante certeza de que cada passo me leva para além dos limites conhecidos.

Procuro Marcelo e Red ao redor e não os vejo a olhos nus.
Por isso uso meu Eco.
Rapidamente os encontrando ambos se movendo em suas formas selvagens, Red nas costas com várias mochilas.

Meu eco se expande e puxo as rédeas imediatamente sentido o que está a frente.

Na vastidão sombria da planície, estende-se um cenário macabro e melancólico. Uma paleta de cinzas e negros domina a paisagem desolada, enquanto o céu se encontra velado por nuvens pesadas, anunciando um lamento silencioso.

O chão árido está coberto por uma profusão de ossos humanos, dispostos em padrões caóticos, como se a própria terra tivesse absorvido a essência da morte. Cada crânio, fíbula e falange conta uma história de sofrimento e perda, um testemunho soturno do que já foi vida.

Entre os ossos, sombras se movem, dançando em uma coreografia macabra, enquanto uma brisa gélida murmura lamentações esquecidas. O ar está impregnado com um aroma de decadência, como se as almas desafortunadas ainda ecoassem nos ossos que agora compõem a morbidez da paisagem.

A atmosfera gótica envolve a planície como um manto sombrio, onde o silêncio é interrompido apenas pelo suspiro dos ventos, contando segredos sepultados nas profundezas daquela terra funesta. Este é um lugar onde a morte e a desolação entrelaçam-se, capturando a essência da eternidade na penumbra de uma planície repleta de ossos humanos.

Marcelo agora em pé emparelha ao lado do cavalo.
_Tudo bem minha prenda?O que seu Eco capitou ? Ameaça?
Eu nego sigo em frente com lentidão agora sem um sorriso nos lábios.

A energia dos ossos permeia o ambiente, como se meu Eco captasse a essência de suas histórias. Num último lampejo de vida, esses restos mortais parecem depositar toda a raiva acumulada ao longo do tempo.

É como se, no instante derradeiro, esses fragmentos de esqueletos se tornassem receptáculos de emoções intensas, criando uma presença palpável e sinistra na planície. Meu Eco capta o murmúrio da raiva e sofrimento, transformando a vastidão de ossos em um testemunho macabro e perturbador de vidas que encontraram um destino sombrio.

Noto que Marcelo evita meus olhos em todo o trajeto.
Sob os cascos de Ugo ossos se transformam em cinza soltando gemidos inaudíveis.

Eu observo a cidade se erguendo lentamente a nossa frente.
Eu uso uma onde de Eco para saber se tem alguma ameaça à frente e por onde ele passa somente o silêncio da morte se estende.

_E aí?'
Marcelo pergunta.
Eu nego com a cabeça nem um Morphileon a nossa frente.
Avançamos com muito menos energia que antes.
Passando por baixo de uma placa escrito.
"Bem vindo a Três pontas"

Refúgio BrutalOnde histórias criam vida. Descubra agora