DULCE
— Está tudo bem? — pergunta Ken.
Estou imobilizada.
Meu coração está disparado.
— Estou. Desculpa.
Estou ótima. Tento sorrir.
— Quer sair daqui? — pergunta ele, hesitante. — Quer dizer, o lançamento está quase acabando...Será que quero? Eu queria um minuto atrás.
Agora, mesmo com a energia do beijo ainda quente em meus lábios, quero é sair correndo. Não consigo pensar direito — meu cérebro só está produzindo um ruído inútil, um piiiiiiiiii alto e longo que vai de uma orelha para outra.
Alguém chama meu nome. Reconheço a voz, mas não ligo os pontos até me virar e ver Justin.
Ele está parado à porta, entre o jardim e o bar, com o colarinho da camisa aberto e a velha bolsa carteiro de couro pendurada no ombro. É dolorosamente familiar, mas as coisas também estão diferentes: seu cabelo está mais comprido do que quando estávamos juntos e ele está usando sapatos sociais novos.
Sinto que o conjurei só de pensar nele — de que outra maneira ele poderia estar aqui? O olhar de Justin vai para Ken por um instante e depois volta para mim.
Ele atravessa a extensão de grama que nos separa. Estou imobilizada, os ombros tensos, encolhida no banco, com Ken ao meu lado.— Você está linda.
Por incrível que pareça, isso é a primeira coisa que ele diz.
— Justin...
É tudo que consigo dizer.
Olho de novo para Ken, e, sem dúvida, meu rosto é a imagem da tristeza.
— Já sei — afirma Ken, tranquilo. — Namorado?
— Ex — respondo. — Ex! Eu nunca... Eu...
Ken abre um sorriso fácil e sexy para mim e depois lança outro tão amável quanto o primeiro para Justin.
— Oi — diz, estendendo a mão para cumprimentá-lo. — Sou o Ken.
Justin mal olha para ele. Só aperta a mão de Ken por cerca de meio segundo antes de voltar a atenção para mim.
— Posso falar com você?
Olho para os dois. Não acredito que estava pensando em ir para a cama com o norueguês.
Não posso fazer isso.
— Desculpa. Eu queria muito...
— Ei, não se preocupe — diz Ken, levantando-se. — Você tem meu número caso queira conversar enquanto eu ainda estiver em Londres. — Ele balança o livreto, que ainda está em suas mãos.
— Foi um prazer — diz, extremamente educado, para Justin.
— É — responde Justin, seco.Quando Ken se afasta, o piiiiiiiiii diminui.
Sinto que estou aos poucos acordando, saindo de um transe. Fico de pé, os joelhos trêmulos, e encaro Justin.— Que. Merda. Você está fazendo aqui?
Justin não reage ao veneno em minha voz. Em vez disso, põe a mão em minhas costas e começa a me levar para o portão lateral.
Eu o sigo mecanicamente, sem pensar, depois me desvencilho com violência quando percebo o que está acontecendo.— Ei, calma. — Ele olha para mim quando paramos no portão.
O ar noturno está quente, quase sufocante.
— Você está bem?
Desculpe ter surpreendido você.
— E estragado a minha noite.
Justin sorri.
— Fala sério, Dulce. Você estava precisando que alguém viesse te salvar.
Você nunca transaria com um cara daqueles.Abro a boca para responder, mas volto a fechá-la. Ia dizer que ele não me conhece mais, só que, por algum motivo, não consigo falar.
— O que você está fazendo aqui? — pergunto.
— Só vim beber alguma coisa.
Venho sempre aqui.Cara, isso é ridículo.
Não dá para acreditar.O cruzeiro pode ter sido uma coincidência — bem estranha, mas até plausível —, mas isto?
— Você não acha estranho?
Ele está confuso. Inclina a cabeça, como se pensasse oi?. Meu estômago se revira. Eu adorava essa inclinada de cabeça.
— É a segunda vez que a gente se encontra em seis meses.
Na última vez foi em um cruzeiro.
Preciso de uma explicação que não seja "Justin aparece quando você pensa coisas ruins a respeito dele", mas, neste momento, meu cérebro semiparalisado só consegue acreditar nisso.
Estou um pouco assustada.
Ele sorri, indulgente.
— Dulce.
Por favor. O que você está sugerindo?
Que peguei aquele cruzeiro para ver você?
Que apareci aqui hoje só para ver você?
Se quisesse fazer isso, por que não ligaria simplesmente? Ou apareceria no seu escritório?Ah. Acho... Acho que faz sentido.
Fico vermelha.
Sinto uma vergonha repentina.
Ele aperta meu ombro.— Mas é ótimo ver você.
E, sim, é uma coincidência muito louca.
Talvez seja o destino.
Eu não estava entendendo por que de repente quis tomar uma cerveja, justo hoje.
Ele faz uma cara de mistério exagerada, e eu não posso deixar de sorrir. Tinha me esquecido de como ele fica fofo quando faz palhaçadas.Não. Nada de sorrisos. Nada de fofo.
Penso no que Maite e Christian diriam e reúno minhas forças.— Sobre o que você queria falar comigo?
— Estou feliz por ter te encontrado — diz ele. — Eu queria... Andei pensando em ligar. Mas é difícil saber por onde começar.
— É fácil.
É só apertar o ícone do telefone e depois meu nome nos seus contatos.
Minha voz treme um pouco, e eu torço para que ele não perceba.
Ele ri.
— Tinha me esquecido de como você fica engraçada quando está irritada.
Não, quis dizer que não queria falar sobre isso por telefone.
— Falar o quê?
Vou adivinhar: terminou com a mulher pela qual
você me trocou? Eu o surpreendi.Sinto certa empolgação quando vejo seu sorriso
confiante e perfeito sumir, e então sou tomada por uma nova onda: de ansiedade.
Não quero deixá-lo irritado.
Respiro fundo.— Eu não quero te ver, Justin. Isso não muda nada. Você ainda me deixou para ficar com ela, você ainda... Você ainda...
— Nunca te traí — diz ele, na mesma hora.
Começamos a andar, não sei bem para onde.
Ele me interrompe de novo, põe as mãos nos meus ombros e me vira para que eu olhe para o rosto dele.
— Eu nunca faria isso, Dulce.
Você sabe que sou louco por você.
— Era.
— O quê?
— Você era louco por mim.
Foi isso que quis dizer.
Já estou arrependida de ter perdido a chance de lhe dizer que nunca mais quero vê-lo por um motivo que não tem nada a ver com Patricia. Apesar de eu não saber o motivo de verdade. Tem a ver com... todas as outras coisas, sejam lá quais forem.
Fico confusa de repente. A presença de Justin sempre faz isso comigo — me deixa toda confusa até eu não conseguir mais pensar direito.
Acho que isso fazia parte do romance, mas agora não é nada bom.
— Não me diga o que eu quis ou não dizer. — Ele desvia o olhar por um instante.
— Olhe, estou aqui agora.
Será que não dá para a gente tomar um drinque e conversar sobre isso? Vamos lá.
A gente pode ir naquela champanheria da esquina que serve as bebidas em latas de tinta. Ou ao último andar do Shard.
Lembra que levei você lá uma vez?
O que você acha?Eu o encaro.
Seus grandes olhos castanhos, sempre tão vivos, sempre brilhando com a animação maluca que me empolgava em todas as ocasiões. O queixo perfeito.
O sorriso confiante. Esforço-me para não pensar na lembrança horrível que surgiu quando beijei Ken, mas ela parece estar no meu corpo, pior do nunca, agora que Justin está aqui. Ela se arrasta pela minha pele.
— Por que não me ligou?
— Eu já falei — responde ele, impaciente agora. — Eu não sabia como dizer isso para você.
— E por que está aqui?
— Dulce — diz ele, grosseiro. — Entre e venha beber alguma coisa comigo.
Eu me encolho e respiro fundo outra vez.
— Se quiser falar comigo, ligue antes e marque um horário.
Agora não.
— Então quando? — pergunta ele, franzindo a testa, as mãos ainda pesadas em meus ombros.
— É só... Eu preciso de tempo. — Minha cabeça parece enevoada. — Não quero falar com você agora.
— Precisa de tempo? Tipo umas duas horas?
— Tipo uns meses — respondo, sem pensar.
Acabo mordendo o lábio, porque agora lhe dei um prazo.
— Quero ver você agora.
De repente as mãos que estão nos meus ombros se moveram para meu cabelo, para meu braço.A lembrança surge como uma visão.
Dou um passo para trás, me desvencilhando.— Experimente ansiar por algo, Justin.
É a única coisa que vai conseguir, e tenho a sensação de que vai ser bom para você.E, com isso, eu me viro antes que possa mudar de ideia e cambaleio de volta para o bar.
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PÓS-IT | Vondy - Adaptação
Lãng mạnDepois de três meses do fim do seu relacionamento, Dulce finalmente sai do apartamento do ex-namorado. Agora ela precisa encontrar o quanto antes um lugar barato onde morar. Contrariando os amigos, ela topa um acordo bastante inusitado. Enrolado com...